
Docente vocacionado é o que recebeu um chamamento, foi convocado CRÉDITOS: Divulgação
Está em processo de formação constante o professor. Seres humanos são eternamente inconclusos e aprendizes, sempre tentando aplicar a teoria à prática para realizar a leitura dos problemas
15-01-2025 às 09h27
Daniela Rodrigues Machado Vilela*
Falar de educação é sempre relegado a segundo plano. É desafiador estimular as pessoas a pensarem que educar com qualidade seria o que há de mais importante a ser realizado por um povo, um país. Haja vista que, somente a partir de ferramentas educacionais de qualidade se faz crível estimular pensamento crítico e condutas éticas aplicadas de modo substancialmente transformador.
Falar da relação entre ensino e aprendizado, invariavelmente, remete a Paulo Freire e a sua obra: “Pedagogia da Autonomia”. Neste livro, discutem-se os “saberes necessários à prática educativa”. Dentre os modos de realizar uma educação transformadora é fulcral a dimensão dual de ensinar / aprender, pois ninguém só ensina, tampouco alguém só aprende. Todos têm o que aprender e o que ensinar. Conhecimento não se resume a conteúdos livrescos, pois sabedoria é ensinada pelos grandes mestres que nem sempre tem formação curricular, mas que têm experiências de vida a compartilhar.
O professor está em processo de formação constante. Seres humanos são eternamente inconclusos e aprendizes, sempre tentando aplicar a teoria à prática para realizar a leitura dos problemas do mundo e, assim, transformar, aperfeiçoar a sua realidade.
Um docente vocacionado é o que recebeu um chamamento, foi convocado, convidado a lecionar por ter um dom, a missão de ensinar e aprender. A palavra vocação tem como sua origem o verbo latino “vocare”, que significa chamado.
Ensinar não é apenas um ornamento intelectual, mas sim, um mecanismo para interpretação e atuação crítica na realidade do mundo.
Formar alguém como profissional e pessoa não se limita a ensinar um conteúdo abstrato, livresco e estanque. Deve o mestre desafiar o outro a refletir com ele, a pensarem juntos.
Ninguém detêm a verdade ou conhece a realidade de modo definitivo. Tudo está em construção e desconstrução, aberto para análises. As perguntas são o que mais importa. Quem tem certezas demais é diminuto. As respostas são circunstanciais e provisórias.
Todos, professores, alunos, cidadãos, sem exceção, devem ter responsabilidade ética enquanto agentes do mundo.
Do professor, espera-se um preparo técnico e científico para a aula, que saiba do que fala, que tenha estudado, se preparado, que lide na sala de aula com o improviso, pois os questionamentos desafiam nossos supostos portos seguros. Também, se espera uma coerência argumentativa e humildade, pois possuímos todos, apenas parte do conhecimento. Tudo é inacabado, imperfeito e provisório.
O professor com vocação nasceu para a docência. Se cada um extravasa o que tem dentro de si, este transborda amor pelo saber, estuda para aprender mais, se dedica.
Como diz Paulo Freire, quem forma, se reforma. Ensinar não é transferência de conhecimento, quem aprende ensina e vice-versa. Nada, nem ninguém, está acabado. A grande tarefa do educador é despertar para a reflexão, não se conformar com respostas prontas, criar as próprias, embasá-las. Pesquisar para conhecer e, assim, discordar com elegância ou concordar com propriedade. Enfim, aprender a ouvir e saber elaborar as respostas.
Para ensinar é indispensável pesquisar, analisar os argumentos, ter criticidade.
Respeitar o senso comum, as vivências e saberes existentes. Aproveitar as experiências alheias, se comprometer com um projeto ético, buscar a novidade, discutir a realidade concreta, seus desafios e problemas.
Cada um deve manejar os próprios argumentos e expor aos demais para um debate respeitoso de ideias. Construir a curiosidade e respeitar a identidade cultural do outro.
Ensinar e aprender para operar mudanças na própria vida, seu entorno, quiçá, um dia, no mundo. Buscar refletir na própria fala sua prática cotidiana. Se indignar diante da hipocrisia, inclusive da própria. Lembrar, porém, que somos todos imperfeitos, em busca da melhoria individual, coletiva, do bairro, do município, do Estado, do mundo.
A característica de sermos humanos, coloca-nos todos dignos de compaixão diante de nossas imperfeições. Sabedores da própria finitude, provisoriedade e precariedade.
Somos eternas crianças, aprendizes, pequenos, insignificantes diante da grandeza do universo. É preciso reconhecer nossa fragilidade, humanidade e falibilidade.
O mundo não está dado, deve ser conquistado. Cabe a todos intervir, modificar, transformar. A grandeza e beleza reside em pensar que pela educação a gente possa tornar o viver mais humano, justo e decente, de outro lado, menos egoísta e desigual.
O que se necessita é enxergar cedo ou tarde, as dores do mundo, as próprias e as alheias. Compreender a responsabilidade que é viver e a sua singularidade. Apreender a realidade, sem se prender. Mover-se com o objetivo de transformar a vida de todos para melhor, independentemente de raça, credo ou preferências.
Docentes e discentes devem se inquietar diante das agruras do mundo e produzir pontes para melhor conduzir as questões propondo caminhos. Problematizar o futuro e sonhar. Lutar contra as injustiças, não temer a novidade. Observar o mundo com o olhar de que este é um espaço espetacular de possibilidades, pois o amanhã desafia-nos a todos.
Espera-se que a educação humanize. É preciso ter convicção de um mundo melhor. Lutar, atuar e transformar. Ser amoroso consigo e com os demais. Reinventar e compreender seu papel, ser presença viva.
Enfim, construir e reconstruir consciência crítica. Não estar entregue ao que está posto, esboçar as próprias respostas. Querer bem ao ser humano de modo amplo. Ter afetividade nas intervenções que faz, pois estamos só de passagem e somos eternos aprendizes.
*Doutora, Mestra e Especialista em Direito pela UFMG. Atualmente, realiza estudos Pós-doutorais pela também UFMG, com financiamento público da Fapemig. Professora convidada no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Colunista do Diário de Minas