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Sequestro Internacional de Criança e Adolescente

Sequestro Internacional de Criança e Adolescente

É importante saber o que fazer neste caso. Acontece de, individualmente, os pais acharem que porque só os pais podem levar o filho ou filha sem aprovação do outro para o exterior

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28-08-2024 às 11h:01

Bárbara Thais

O Código Civil brasileiro afirma que compete aos pais o exercício do poder familiar (Artigo 1634), ou seja, os pais são responsáveis pelo sustento dos filhos até completarem a maioridade civil (18 anos, segundo o Código Civil de 2002) ou, se for o caso, até que concluam o ensino superior. O pátrio poder, bem conhecido como poder familiar implica em direitos e deveres quanto à pessoa e bens do filho menor. É exercido em igualdade de condições por ambos os pais, independentemente de terem ou não a guarda. A Constituição Federal dispõe que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher (Artigo 226, §5º).

Mesmo com a guarda compartilhada ou com a guarda exclusiva é necessário ambos os genitores concordarem com a mudança do país de residência do filho, ou seja, é necessário a autorização dos genitores, pois se ambos exercem o poder parental, então os dois deverão decidir sobre o lugar de residência habitual, exceto se o Poder Judiciário competente (o da residência habitual) determinar que quem detém a guarda possa tomar essa decisão unilateralmente.

A subtração (sequestro) internacional de crianças é o ato cometido por um genitor (pai ou mãe) de transferir ilicitamente um filho menor de idade de seu país de residência habitual para outro país, sem o consentimento do outro genitor. Ou, é o ato de um genitor de reter o filho menor em um país que não seja o de residência habitual, sem o consentimento do outro genitor - por exemplo, após um período de férias, mesmo que o outro genitor tenha autorizado a viagem.

A autorização de viagem, por parte dos genitores, permite apenas o trânsito temporário, mas não permite a mudança da residência da criança. Ainda que a mãe possua o direito de guarda e o pai o direito de visitas, geralmente, ela não pode decidir unilateralmente sobre o local de residência da criança. Ambos os genitores exercem o poder familiar, será preciso obter, do genitor que tenha apenas o direito de visitas, autorização para a mudança do local de residência da criança.

Considera-se genitor subtrator quem leva a criança de seu país de residência habitual para outro país (ou o mantém retido em outro país) sem autorização do outro genitor (genitor abandonado). Entende-se por residência habitual o país onde a criança reside, com intenção de lá permanecer, portanto, geralmente, é o local de onde a criança foi retirada e para o qual deverá ser restituída. É na “residência habitual” que a criança possui seus vínculos mais robustos e importantes, não somente com seus genitores, mas com o ambiente escolar, linguístico, cultural, social, família.

A subtração internacional geralmente ocorre quando há crise ou ruptura no relacionamento conjugal, abusos e maus tratos – físicos ou psicológicos. É comum em casais de nacionalidades diferentes, que residem no país de origem de um deles ou em um terceiro país. O genitor que planeja retirar a criança do país de residência habitual é geralmente aquele que não nasceu no país, portanto, não possui raízes, família, emprego estável, dificuldade com o idioma, desconhece a legislação local e seus próprios direitos. Ainda, a causa frequente de subtração de criança e adolescente é a da retenção ilícita, ou seja, a criança sai do Brasil autorizada pelo outro genitor para passar um curto período no exterior, mas não retorna.

Até os anos de 1980, atos de retenção ou subtração parental internacional de crianças permaneciam praticamente impunes. Não existia mecanismos ágeis para que o genitor abandonado acionasse o governo de outro país com vistas à restituição da criança subtraída. Antes de o processo chegar à conclusão, os filhos menores atingiam a maioridade e o pedido de restituição perdia a validade. Diante disso, vários países estabeleceram uma cooperação internacional para executar pedidos de restituição de crianças. Em 1980 surge a Convenção da Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, sendo um marco, pois considera a subtração um ilícito internacional. A Convenção de Haia estabelece um mecanismo de obrigações recíprocas entre os Estados-Partes nos casos de retirada da criança ou adolescente menor de 16 anos de sua residência habitual.

Os pedidos de cooperação jurídica internacional serão tramitados por intermédio de Autoridades Centrais. As principais funções das Autoridades Centrais são: localizar uma criança transferida ou retida ilicitamente; evitar novos danos à criança, ou prejuízos às partes interessadas, tomando ou fazendo tomar medidas preventivas; assegurar a entrega voluntária da criança ou facilitar uma solução amigável entre os genitores; proceder à troca de informações relativas à situação psicossocial da criança; assegurar no plano administrativo, quando necessário e oportuno, o retorno seguro da criança, dentre outros.

Todo aquele que possui o direito de guarda ou direito de visita poderá requerer a restituição da criança ao seu local de residência habitual (Artigo 5º da Convenção). O titular poderá ser pessoa, organismo ou instituição, devendo provar que, de acordo com o Direito (legislação, acordo entre as partes ou decisão judicial) do Estado de residência habitual da criança, detinha (e exercia efetivamente) no momento da subtração os cuidados com a pessoa da criança ou o direito de decidir sobre seu local de residência.

No entanto, a autoridade judicial ou administrativa do Estado requerido não é obrigada a ordenar o retorno da criança se a pessoa, instituição ou organismo que se oponha a seu retorno provar que a pessoa, instituição ou organismo que tinha a seu cuidado a pessoa da criança não exercia efetivamente o direito de guarda na época da transferência ou da retenção, ou que havia consentido ou concordado posteriormente com esta transferência ou retenção; ou que existe um risco grave de a criança, no seu retorno, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, ficar numa situação intolerável. A autoridade judicial ou administrativa pode também recusar-se a ordenar o retorno da criança se verificar que ele se opõe a ele e que a criança atingiu já idade e grau de maturidade tais que seja apropriado levar em consideração as suas opiniões sobre o assunto (Artigo 13 da Convenção).

Além disso, quando uma criança tiver sido ilicitamente transferida ou retida e tenha decorrido um período de menos de 1 ano entre a data da transferência ou da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa do Estado Contratante onde a criança se encontrar, a autoridade respectiva deverá ordenar o retorno imediato da criança. A autoridade judicial ou administrativa, mesmo após expirado o período de um ano deverá ordenar o retorno da criança, salvo quando for provado que a criança já se encontra integrada no seu novo meio.

O genitor abandonado (no Brasil) deverá levar o caso à Autoridade Central Administrativa Federal brasileira (ACAF), que verificará se o pedido cumpre os requisitos estipulados na Convenção. A documentação varia de acordo com o caso concreto. Após examinar a documentação, a ACAF encaminhará o pedido de restituição da criança à Autoridade Central do país em que se encontrar retida ilicitamente. Nada obsta a localização da criança no exterior contar com o apoio da Interpol. Assim que a criança for localizada, a Autoridade Central estrangeira buscará solucionar a questão de forma amigável. Havendo resistência à restituição amigável da criança, a Autoridade Central estrangeira tomará as medidas administrativas ou judiciais visando ao retorno.

No entanto, caso a subtração da criança ou adolescente ocorra de um país que é signatário da Convenção para um não membro da Convenção, então, a Convenção não se aplica, ou seja, as Autoridades Centrais não terão atuação. Nesse caso, se a subtração tiver ocorrido a partir do Brasil, o genitor abandonado poderá procurar o Judiciário brasileiro ou do país para onde a criança foi levada. Assim, se iniciar o caso no Judiciário brasileiro, e receber ganho de causa, a sentença deverá ser homologada no país estrangeiro. Após homologada a decisão brasileira no estrangeiro, o subtrator terá de restituir a criança e perderá a guarda.

Referência: GOVBR. Restituída criança ou adolescente vítima de subtração internacional ilícitaDisponível em: https://www.gov.br/pt-br/servicos/ter-restituida-crianca-ou-adolescente-vitima-de-subtracao-internacional-ilicita.

*Bárbara Thaís é Professora e Coordenadora das pós-graduações em Direito Internacional Humanitário e Geopolítica do Mundo Contemporâneo na PUC Minas. Mestre em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-graduação em Relações Internacionais (PUC Minas). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Segurança Internacional e Defesa pela Escola Superior de Guerra. Pós-graduada em Direito Internacional. Pós-graduada em Relações Internacionais do Oriente Médio: sociedade(s), cultura(s) e política (PUC Minas). Bacharel em Direito pela PUC Minas e Doutoranda em Direito  pela UFMG.

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