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Kennedy, Trump e a morte de atiradores

Kennedy, Trump e a morte de atiradores

Fundamental saber não é nem quem atirou. É como se fez o planejamento estratégico, se escolheu o local, ocorreu a aquisição da arma e como se fez a circulação carregando-a, e o modo como o atirador ingressou na área

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19-07-2024 às 09h:47

Rogério Reis Devisate*

O assassinato de John Kennedy continua despertando comoção e dúvidas. A teoria da bala mágica, então, provoca surpresa, contrariedade, descontentamento e a sensação de que somos tolos.

Cerca de 200 documentos ainda permanecem secretos e inacessíveis.

Duas comissões do Congresso investigaram os fatos. A Comissão Warren, criada em 1963, chegou ao extremo de alterar a descrição da entrada da bala que matou Kennedy, supostamente para reforçar a teoria da bala única (a “bala mágica”) que teria (1º) penetrado as suas costas, (2º) saído pelo pescoço, (3º) virado à direita e, depois, à esquerda, para ferir na axila o governador do Texas,

Connally, que estava no banco da frente, (4º) depois descendo para despedaçar uma sua costela e (5º) sair pelo lado direito do tórax, (6º) ainda descendo para atingir o seu pulso direito, fraturando o osso rádio e (7º) voltando para atingir a sua coxa esquerda. Não bastasse, a bala foi encontrada (!) quase em perfeito estado, numa maca, no hospital Parkland, para onde Kennedy foi levado. Concluiu-se que foram feitos 3 disparos: o primeiro errou o alvo, o segundo foi acima descrito e o terceiro e fatal, que atingiu a cabeça.

Em 1975, a Comissão Rockfeller manteve a conclusão e indicou que não havia provas do envolvimento da CIA. Além disso, em 1979, documento do Comitê sobre assassinatos, da Câmara dos Deputados dos EUA, confirmou as conclusões anteriores e introduziu novo elemento: a grande possibilidade de haver um segundo atirador.

É curioso que o Lee Oswald, o suposto assassino, tenha sido exposto e exibido enquanto era conduzido, dentro do departamento de polícia de Dallas, onde foi assassinado perante as câmeras de TV por Jack Ruby.

Assim, Lee Oswald ficou apontado como o único envolvido e, por ter morrido naquelas circunstâncias, obviamente não foi condenado pela justiça ou a seu respeito se formou processo com acusação e defesa. Tudo era circunstancial e apressado e ganhou um ponto final, rapidamente. Virou o assassino, para a história.

O fato de o assassinato de Kennedy ainda gerar debates está exatamente na falta de segurança nas suas conclusões. Consta que cerca de 61% dos americanos ainda acreditam que ele foi vítima de conspiração. Ficamos como tolos diante desse contexto. Aliás, para o filósofo francês Jules

Michelet, falecido em 1.874, o tolo é uma criação nascida nas “escolas do vazio e da presunção”, nas quais “a vaidade pretensiosa se infla de palavras e se alimenta de vento”.

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Passado tanto tempo, a precoce morte do atirador parece encerrar tudo sobre novo fato grave e que poderia ter matado outro ocupante da presidência dos EUA, o ex-presidente e atual candidato à nova eleição, Donald Trump.

Novamente um único atirador age e consegue atirar na cabeça do alvo. Por sorte, a bala passou a milímetros do crânio e atingiu-lhe a orelha direita, sem aparentes maiores danos. Não foi uma bala de borracha ou coisa pequena, pois foi tiro de fuzil AR-15 – a mesma arma que frequenta as páginas policiais, aqui, quando se fala em chacinas, atentados e ações do tráfico. O AR-15 dispara projéteis mortais em alta velocidade, o que causa grande estrago no alvo. Trump sobreviveu ao ataque, mas os vários disparos fizeram duas outras vítimas, uma ferida e outra fatal. O atirador foi logo localizado e abatido.

A morte dos atiradores, nos dois casos, guarda apenas essa semelhança. Passados cerca de 61 anos entre os dois eventos, tão distintos entre si, temos que a morte dos atiradores encerra precocemente qualquer maior consideração sobre os contextos.

Eventual depoimento, com informação sobre os fatos, morreu junto. A partir daí, morreram, também, a possibilidade de se descobrir se foram mesmo ações individuais e isoladas ou se a atitude dos atiradores foi parte de tramas maiores e bem urdidas.

Conspirações e ciladas podem ser organizadas porões escuros, como mais comumente desejam os nossos pensamentos. Sempre pensamos que os sujeitos maus têm a idealizada cara da maldade. Entretanto, os conluios podem ser tramados nas ensolaradas coberturas ou ajardinadas mansões.

Infelizmente ficaremos sem essas respostas e, novamente, concluiremos que o voo solo de alguém chegou ao extremo de matar Kennedy, então presidente em exercício, assim como atingir ex-presidente e hoje candidato em campanha.

Se é mesmo assim, então a insegurança é maior e mais comum do que possa parecer. Basta uma iniciativa individual, apenas uma pessoa decidindo agir – e tudo pode mudar.

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A grande preocupação disso - e que parece não ter sido considerada – é exatamente essa mensagem, exemplar, a qualquer um e em qualquer lugar que acredite que possa entrar para os livros de história como a pessoa capaz de mudar o rumo dos fatos, algo como fez quem matou o Arquiduque Francisco Ferdinando – iniciando a 1ª Guerra Mundial – e outros, como Abraham Lincoln, John Kennedy, Martin Luther King Jr. e Mahatma Gandhi.

Isso importa mais quando a atualidade está fomentando o exibicionismo narcisista, fácil, fútil e gratuito. A quase certeza de que entrar-se-á para a história com apenas um único gesto pode agradar a alguns. A virtude parece ceder ante a tentação da projeção dessa personalidade revestida de coragem para fazer algo que pareça importante, para mentes desocupadas ou ocupadas demais em fazer algo para preencher os vazios das suas existências.

Além disso, também fica a mensagem de que, se a ações isoladas foram capazes de produzir esses resultados, o que poderiam fazer pequenos grupos que se organizem com semelhantes propósitos?

É crível que os serviços secretos devam estar em polvorosa, no mundo. É razoável considerar que protocolos e convenções estejam sendo questionados, diante da constatação de que não parece ter sido tão difícil que alguém, sozinho e com apenas 20 anos, tenha conseguido burlar todo o aparato utilizado.

O que é fundamental saber não é nem quem atirou. É como se fez o planejamento estratégico, se escolheu o local, ocorreu a aquisição da arma e como se fez a circulação carregando-a, como também o modo com que se ingressou no prédio e se posicionou no telhado sem que helicópteros ou drones o identificassem. Aliás, supomos até haver indagações outras que ora não nos ocorrem. A morte do atirador encerra muitas dessas perguntas. Coincidências, como tal, não existem.

Se tais eventos ocorreram no passado e agora, certamente outros poderão ocorrer no futuro.

Quanto a nós? Continuamos como tolos acreditando em tudo.

*Advogado/RJ. Membro da Academia Brasileira de Letras Agrárias, da União Brasileira de Escritores e da Academia Fluminense de Letras. Presidente da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da UBAU. Membro da Comissão de Direito Agrário da OAB/RJ.  Defensor Público/RJ junto ao STF, STJ e TJ/RJ. Autor de vários artigos jurídicos e dos livros Grilagem das Terras e da Soberania, Diamantes no Sertão Garimpeiro e Grilos e Gafanhotos: Grilagem e Poder. Co-coordenador da obra Regularização Fundiária Experiências Regionais, publicada pelo Senado Federal.

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