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Ainda antissemitismo: uma saga no sertão

Ainda antissemitismo: uma saga no sertão

Em linguagem tosca, árabes e judeus são farinha do mesmo saco. No entanto, nem árabes nem judeus representam, com pureza, a raça semítica, lendariamente considerada descendente de Sem

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22-07-2024 às 09h:27

Manoel Hygino dos Santos*

Vive-se uma hora de grandes embates para (ou entre) os semitas ou judeus, principalmente depois da criação do estado de Israel. O antissemitismo percorre todo o mundo. Os semitas, uma grande família etnográfica e linguística que compreende vários povos espalhados por numerosas regiões, em especial árabes, hebreus, sírios, etc. são raças potentes que chegaram acidentalmente a exercer a hegemonia da humanidade, como informa Teófilo Braga.

Em resumo, a Arábia é o berço dos semitas, que ali teriam sucedido, pelo menos ao Sul, a uma população camítica, de que há ainda traços. Os livros mostram que são de pele branca, pelo menos trigueira, cabelos negros, face elíptica. O nariz judaico, se exagerado, lembra a forma cursiva do número 6.

Em linguagem tosca, árabes e judeus são farinha do mesmo saco. No entanto, nem árabes nem judeus representam, com pureza, a raça semítica, lendariamente considerada descendente de Sem. E Sem foi o primogênito de Noé, na ordem mencionada pela Bíblia. Os outros irmãos são Cam e Jafé. Pela ordem de entrada em cena, o primeiro teve primazias e dele provieram os hebreus, que conquistaram a Palestina, comandados por Josué. Pela interpretação comum, Noé afirmou: “Que Deus estenda os domínios de Jafé e que habite nas tendas de Sem”, explicando a conquistada Palestina pelos romanos e pela conversão dos gentios”. De toda maneira, jamais houve paz total na região que habitaram, o que se vem estendendo ao longo dos séculos.

Quem tiver interesse pelo assunto verá que a primeira nação a atacar o povo judeu após o êxodo do Egito foi Amalek, um antigo povo bíblico de Canaan, há muito desaparecido. “Vocês devem se lembrar do que Amalek fez com vocês”, disse Netanyahu em outubro, ao anunciar a retaliação de Israel ao ataque do Hamas, em 7 daquele mês, uma ação arrasadora.

Amalek cresceu na família de Esaú e assumiu um ódio enorme aos judeus. Seus descendentes se tornaram a nação de Amalek, ao sul da Terra de Israel, no deserto de Negev. Não ficou por isso. Após a travessia do Mar Vermelho, com os judeus em recuperação em Refifim, Analek lançou surpreendente ataque sobre eles. O líder dos judeus, Moisés, ordenou que seu discípulo Yehoshua revidasse, o que se fez. Moisés prometeu acabar totalmente com a lembrança de Amalek na face da terra numa guerra perene.

Judeus em Minas

Depois de 38 anos à frente de um jornal de Montes Claros, Oswaldo Antunes decidiu fechá-lo, encerrando a carreira na imprensa e quedando como advogado. Mas não o faria sem escrever o livro de despedida, contando sua vida e da família, desde os tempos da Vila Brazília, então com Z, antes Gerais de São Felipe das Contendas, de recontadas emboscadas que roubaram vidas e entraram para o campo das lendas. O lugar passou a Vila das Contendas, antes de pegar o Brazília com Z, como está até hoje, já cidade, Brazília de Minas.

Aí eu descobri que Oswaldo Antunes procedia de muito longe e começara a interessar-se pela genealogia: tivera um primo bispo católico, Dom Lúcio Antunes de Souza, grande orador sacro na diocese de Botucatu no Estado de São Paulo. Mas havia muito ainda a desvendar. Porque usava o Antunes no nome, com o qual ingressara nos quadros de redação de “O Diário”, de Belo Horizonte, que se dizia e deveria ser “o maior jornal católico da América Latina”, como proclamado.

Os Antunes procedem de Portugal e eram de procedência judia, como narra o historiador Gustavo Barroso. Trata-se de sobrenome patronímico, derivado de Antônio, isto é, filho de Antonio, registrando-se a forma Antoniz em documento do ano 991. Tudo porque judeu não era visto com bons olhos, forçado a adotar o novo nome desde 1497, ao aceitar a religião cristã.

O próprio Oswaldo esclarece que o sobrenome foi assimilado desde 951 com a Inquisição em Portugal. Os de raça judaica o faziam, temerosos de serem inquiridos e queimados na fogueira ou, então, de envio a distantes colônias. Assim, vieram para cá com Mem de Sá os primeiros Antunes, instalando-se na Bahia, depois se espalhando no Norte de Minas, inclusive Brasília e Pedra Azul e mais. Outros parentes se refugiaram na Holanda, protegendo-se sob o calvinismo, chegando aqui com Maurício de Nassau e se fixando entre Espírito Santo e Rio de Janeiro.

Conflito sem fim

Deste modo, o jornalista e advogado descobriu muita coisa. Entre elas, que os Antunes da Bahia descendem dos cristãos-novos Heitor Antunes e sua mulher Roiz, isto é, Ana Rodriguez, ambos de origem judaica e casados em torno do ano 1600. No caso de Heitor, era cristão – novo puro, com sinagoga, (que o povo humilde da região chamava de esgona) em Maroim, agora Brumado, onde se localizavam o seu engenho e outras propriedades.

Como procediam da região de Souza, perto do Porto, lá em Portugal, tiveram depois Souza agregado ao nome. A aquisição de terras para plantio de cana e muitos escravos, após a fixação na Bahia, revela que Heitor formou ótimos valores.

Conforme documentos, Heitor possuía e guardava brasão indicativo da nobreza macabéia. Mantendo o costume endogâmico de matrimônio em família, os homens Antunes se casavam com os seus parentes Rodriguez e Alves.

As mulheres não adotavam os sobrenomes dos maridos e as nascidas desses casamentos mantinham o Antunes de Sousa, após se unirem com os primos Alves ou Rodrigues.

As crianças não conheciam esses detalhes e menos se importavam com eles. Aos avôs não haviam conhecido e dos ancestrais remotos nunca ouviram falar. Qual a importância no mundo sertanejo, com toda sua insignificância e inocência, imaginar-se descendentes dos heroicos Macabeus das Sagradas Escrituras?

Os brasileiros-judeus do interior novamente estão em evidência, assim como os das cidades, das metrópoles: São alvo todos os semelhantes no mundo, nesta hora de conflito, planetário em última análise. O homem é um ser beligerante, como nos velhos tempos, muito antes do jornalista Oswaldo Antunes, um homem de paz e de justiça.

*Da Academia Mineira de Letras e da ANE – Associação Nacional de Escritores.

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