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A palavra é segurança: energética, alimentar…

A palavra é segurança: energética, alimentar…

Neste momento, estamos passando por mais uma crise hídrica no Brasil, que já afeta o abastecimento de água, a navegação e a produção agropecuária, baixando o estoque de energia hidráulica

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03-09-2024 às 09h:41

Enio Fonseca* e Fernando Luiz Zancan**

Durante a crise da Covid-19, vimos as cadeias de suprimentos de produtos serem fragilizadas, causando aumento de custos e trazendo a insegurança na sociedade. Mais recentemente, durante a “guerra da Ucrânia”, assistimos a Europa ficar de joelhos em busca de energia para passar o inverno e movimentar sua atividade econômica. Também em consequência desse conflito, o Brasil ficou apreensivo com a falta de fertilizantes nitrogenados, o aumento no seu preço e o efeito na insegurança alimentar e energética.

Depois desses eventos, a palavra segurança ficou no radar de todos nós, retirados da zona de conforto. Nesse momento estamos passando por mais uma crise hídrica no Brasil, que já afeta o abastecimento de água, a navegação e a produção agropecuária, baixando o estoque de energia hidráulica em nossos reservatórios e trazendo insegurança hídrica e energética. Ou seja, estamos falando de segurança alimentar, energética, hídrica e climática, quatro fatores que afetam a todos os que vivem nesse planeta.

Nesses tempos difíceis, a estratégia de não colocar todos os ovos em uma única cesta deve ser uma máxima. A busca da diversidade precisa ser o foco principal. Na questão alimentar devemos aumentar a produção de fertilizantes. Para isso é necessário concluir no Congresso a aprovação do programa incentivos  à produção desses insumos (Profet), viabilizar a Política Nacional de Fertilizantes e criar um programa de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

Em relação à questão energética, onde atingimos quase 90% de energia a carbono zero (renováveis e nuclear), precisamos dar prioridade para uma reserva de energia segura, um “backup” que nos proteja da falta de chuvas, da ausência de ventos ou dos dias sem sol. No campo renovável, o Brasil já é um exemplo para o mundo, sendo cerca de três vezes mais limpo que a comunidade europeia, principal indutor das políticas climáticas. Precisamos agora olhar para a manutenção de um parque térmico, despachável 24 horas por dia e 7 dias por semana.

Com as mudanças climáticas cada vez maiores e mais frequentes, estamos vivendo aquilo que o historiador britânico, Eric Hobsbawn, definiu como a “era dos extremos”. Hobsbawn se refere à disputa ideológica, que também parece ter invadido a discussão ambiental, mas fiquemos na área climática. Cada vez mais é comum períodos intensos de seca e de inundação. De forma geral, ano após ano, o planeta está aquecendo. Com mais calor e evaporação das águas, teremos maior formação de nuvens, diminuindo a eficiência da geração solar, mudando o padrão de ventos e a quantidade de combustível para as usinas hidráulicas. Por isso a geração de energia firme e despachável será necessária como garantia para a segurança energética de todos nós.

A importância dessa reserva ficou bem evidente em episódios recentes. Em 2021, foi preciso despachar todas as térmicas – desde as de menor custo, como as de carvão mineral até aquelas de alto custo, que são a óleo combustível – para garantir a segurança do sistema. Neste ano, em plena região Nordeste, terra das renováveis (eólica e solar), o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS)  já despachou a usina térmica a carvão de Pecém, no Ceará. Na região Sul, as térmicas de carvão mais baratas já estão despachadas.

A ONS ainda pediu que todas as térmicas ficassem aptas a despachar, pois estamos em uma das maiores secas de 44 anos.  Nesta semana, a Aneel já avisou que haverá despacho das térmicas. Aliás esse sistema de informação da ANEEL deveria ser revisto, pois passa uma falsa ideia para a sociedade de que as térmicas são caras. E isso não é verdade. Quem tem aumentado o custo ao consumidor são as fontes renováveis variáveis subsidiadas via “Conta de Desenvolvimento Energético” que são pagos pelo consumidor (7.54 % da conta, hoje).

Na segurança hídrica, como teremos eventos extremos mais frequentes, será necessário ampliar a capacidade de reservar água. Isso garantirá o abastecimento humano e animal, a produção de energia hidrelétrica e a irrigação fundamental para o agronegócio. Infelizmente, vemos “especialistas de clima” falar que, em 2040, seremos 100 % renováveis na geração de energia elétrica, enquanto algumas ong’s insistem em apresentar planos climáticos no mesmo sentido. Onde esse pessoal vive? Nem na Europa, indutora das políticas climáticas, isso é consenso.

 A verdade é que o Brasil é privilegiado por ter todas as matrizes energéticas disponíveis, mas, ao mesmo tempo, não está em condições de desperdiçar nenhuma delas. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Brasil precisará, até 2050, multiplicar por 3,3 o consumo de energia elétrica para chegar a patamares de países desenvolvidos. Precisamos estruturar um Programa de Manejo de Carbono (“Carbon Management Energy Shot”), usando todas as tecnologias disponíveis. Estamos falando de captura e armazenamento de carbono (CCUS), de remoção do CO2 do ar, captura direta de CO2 do ar (DAC), uso de biomassa com CCUS (BECCS) e também consórcio Fóssil x Biomassa (FBECCS). Grandes potências, como os Estados Unidos e a China, estão investindo pesado nesses projetos. Precisamos de pragmatismo e seriedade intelectual nessas discussões. A solução para a segurança alimentar, energética, climática não é acabar com os fósseis, mas sim com suas emissões e isso é uma transição ecológica e tecnológica que levará décadas. E o Brasil, em nome da palavra segurança energética, precisa da diversidade de todas as fontes!

*Enio Fonseca CEO da Pack of Wolves Assessoria Socioambiental; foi superintendente do Ibama, Conselheiro do Copam, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Membro da Alagro

**Fernando Luiz Zancan–Presidente da ABCS–Associação Brasileira do Carbono Sustentável

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