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O poder de fogo de um vapor movido a lenha

O poder de fogo de um vapor movido a lenha

O vapor Benjamim Guimarães permanece sobre “fogueiras”, fora do leito do Rio São Francisco. O prefeito de Pirapora, Alex César não é encontrado para explicar a quantas vão a reforma do vapor

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30-04-2024 às 08h:45

Alberto Sena*

Falar com o prefeito de Pirapora (MG), Alex César (PTB) é difícil. Ele parece estar protegido por todos que lhe servem na Prefeitura Municipal, quando se trata de um repórter precisar saber dele a quantas estão indo as providências para terminar a reforma do vapor Benjamim Guimarães.

O vapor se tornou como aquele calinho no calcanhar que dói para ao ponto de virar um problemão. Daqueles que doem mais quando há anúncio de chuva no pedaço.

O prefeito não está na prefeitura, não se pode dar o número do celular dele, as perguntas devem ser enviadas por escrito e outras desculpas mais. Foi o que aconteceu com a reportagem do Diário de Minas, que publica, hoje, o quanto o então prefeito de Pirapora, há 32 anos, Wanderley Ávila, atualmente conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) fez – e também na condição de deputado estadual – pelo vapor e o Rio São Francisco.

E olhe que há 32 anos, não existiam toda essa parafernália de meios de comunicação. Quando muito, o mais rápido era o telefone fixo e em muitas das vezes era preciso perder preciosos minutos esperando uma ligação interurbana e para conversar era aos gritos.

Ao que tudo indica, a reeleição do prefeito Alex César depende do vapor Benjamim Guimarães, que está fora do leito do Rio São Francisco e sobre “fogueiras”, desde 2021. O eleitorado piraporense critica o político por isso, acha que ele, como se diz, “está enrolando”, cada dia com uma desculpa para explicar a procrastinação da reforma do vapor, que, para a Marinha brasileira, é um símbolo.

AÇOES E HISTÓRIA DO VAPOR

O vapor Benjamim Guimarães foi tombado no ano de 1985, na administração do então prefeito Wanderley Ávila (PSDB), hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Ele quem tomou a iniciativa de, junto ao IEPHA/Secretaria de Estado da Cultura de MG, conseguir o tombamento do emblemático vapor, pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico – Decreto 24840/85.

Nesse mesmo ano, o vapor foi reformado e voltou a navegar, oficialmente, em 24 de outubro de 1986, quando o prefeito Ávila recebeu o ministro dos Transportes, José Reinaldo Tavares e o deputado Armando Costa na cidade.

Em 29 de janeiro de 1997, a embarcação foi incorporada ao Patrimônio Histórico do Município de Pirapora, por meio de termo de transferência firmado entre a Franave e a Prefeitura de Pirapora.

Numa conversa comigo, e para o Diário de Minas, o conselheiro Ávila, em vias de se aposentar, pôde simbolicamente mergulhar nas águas do Rio São Francisco para deparar como o vapor Benjamim Guimarães, fora do leito do rio, sobre “fogueiras”, como se diz na linguagem barranqueira, desde o ano de 2021.

Foi, então, que o conselheiro Ávila se recordou do discurso que fizera, exatamente no dia 22 de abril de 1992, da tribuna da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na condição de deputado estadual, para enaltecer o jornalista Onofre Miranda, que havia publicado no “Estado de Minas” apelo para “salvar o Benjamim Guimarães, último vapor da Franave, ancorado no Porto de Pirapora, esperando o final do processo de privatização, que, em seu primeiro leilão, fracassou totalmente pela falta de lances”.

O deputado Ávila denunciou da tribuna “a degradação a que chegou o “Velho Chico” faz com que a exploração da navegação não seja atraente para a iniciativa privada, que não se interessou por assumir um patrimônio valioso, construído ao longo de décadas com o trabalho de dedicados funcionários da Franave e investimentos públicos do Governo Federal e do Governo de Minas”.

Pelo que se pôde depreender da nossa conversa, a luta pela recuperação do Rio São Francisco é mesmo antiga “é dura e longa”, como disse ele, na condição de deputado. “A incúria de sucessivas administrações não será apagada por milagre, é preciso um trabalho permanente de plantio das matas ciliares, um combate sem trégua à poluição, a criação de uma consciência de preservação, que faça de cada brasileiro um militante em defesa da natureza, para que o São Francisco seja, de novo, uma estrada de água, grande e econômica, transportando as nossas riquezas e a nossa gente”.

Ao rememorar tudo isso, o hoje conselheiro do Tribunal de Contas deve pensar, no íntimo, que cumpriu com a sua parte, na época, como deputado, ao fazer pronunciamentos como o que acabamos de ouvir da parte dele. Se o rio infelizmente está nessas condições – fadado à extinção – e o vapor Benjamim Guimarães sobre “fogueiras” essa rememoração é o que se pode fazer neste momento.

E, diga-se de passagem, este texto é um lenitivo de alto poder de construção persuasão, porque isso vai deixar o prefeito atual de Pirapora pressionado a resolver duma vez – ou não – por todas a situação do vapor. Ainda mais, sabendo que a embarcação histórica é emblemática para a nossa Marinha brasileira e por uma razão ou outra encontra-se sobre “fogueiras”, apesar das cobranças da população e dos ambientalistas, que o querem a navegar no que ainda restam das águas do Rio São Francisco.

Mas naquela ocasião, quando deputado, Wanderley Ávila sabia ser “preciso tempo, mas é preciso começar. Alguns já estão fazendo o que podem. Onofre Miranda é um deles. Faz de sua coluna uma trincheira ecológica e uma tribuna sempre a conclamar seus leitores a uma participação efetiva e organizada em defesa dos nossos rios e dos nossos peixes”.

Que o leitor não se esqueça, o discurso do então deputado foi pronunciado em 1992, há 32 anos, portanto. E, então, tem a oportunidade de perguntar, na condição de leitor: o que aconteceu com o rio e com o vapor, de lá para cá? Em vez de receberem bons tratos, para se recuperarem, ficaram mais degradados ainda, cada um dentro de suas características, de rio e de embarcação.

Trinta e dois anos atrás, o nobre deputado se dizia “informado de que os baianos já reivindicam para seu Estado a propriedade do Benjamim Guimarães. Nada será tão injusto com Pirapora e com Minas Gerais. O vapor faz parte do nosso patrimônio cultural, é testemunha tão viva e tão presente da história do rio, que não se pode medir o seu valor em números de ações da Franave ou nas moedas podres que têm sido usadas nos leilões do programa de desestatização do Governo Federal”.

O vapor ficou, mas se encontra em situação que até revolta a população de Pirapora, acostumada até mesmo ao banzo que o apito da embarcação provoca principalmente nos moradores mais antigos, que dele desfrutaram ao longo de um rio navegável, na estrada de água até a Bahia.

“Quero fazer, desta tribuna, um apelo ao Governo Federal, detentor de mais de 90% das ações da Franave, para que providencie a doação do Benjamim Guimarães à Prefeitura Municipal de Pirapora. Ele será recuperado e terá destinação condizente com a sua história e com a sua importância. Nós, barranqueiros do São Francisco, que sabemos dar-lhe valor além do preço que possa alcançar em leilão. Ele faz parte das nossas vidas, já crescemos vendo-o, altaneiro, levar e trazer milhares de brasileiros, que fizeram o percurso da unidade nacional que representa o “Velho Chico”.

Lembrando sempre ao leitor que 32 anos se passaram, do dia desse pronunciamento feito pelo deputado Wanderley Ávila, até os dias de hoje. Não carece de dizer mais palavras sobre o que se deu de lá para cá porque seria menosprezar a memória dos nossos leitores. Eles sabem, o meio ambiente como um todo só foi sendo degradado até chegarmos ao ponto de sofrermos as consequências das mudanças climáticas provocadas por nós mesmos, desde os que tiveram participação menor até – e principalmente – os gananciosos empresários gigolôs dos recursos naturais, aqui e em todo o planeta.

E para mostrar quão boas eram as intenções do então prefeito Wanderley Ávila, a expectativa dele à época, repito, 32 anos atrás, em relação ao vapor, era a de que “será o monumento vivo, preservado, útil, eficiente, da luta dos que ainda acreditam que é possível salvar o rio e que nunca desesperam da construção de uma sociedade mais justa num ambiente ecologicamente equilibrado, que é um bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida do povo, como quer a nossa Lei Maior”.

*Editor Geral do DM

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  3 comentários

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Comentário

Matéria paga. Falta a construção de fatos. Melhor fazer uma biografia do nome citado…

Grande a deputado, Conselheiro Wanderley de Ávila, representante amigo de nossa querida cidade Pirapora, Deus o abençoe!

Não sou Piraporense,muito menos mineira, nas idas e vindas a Pirapora conheci o vapor Benjamim Guimarães, fizemos pequenas viagens que ficaram guardadas em nossas lembranças e corações. Lastimável o descaso do prefeito !Parabéns ao autor do texto !

 

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