“Vou contar tudo para Deus”, disse aquele menino sírio, vítima de um bombardeio
Penso fazer a mesma coisa que o menino já deve ter feito, se eu tiver a felicidade de me encontrar com Deus depois de terminar este Caminho de Santiago de Compostela da vida.
17-03-2023
12h:28
Bento Batista*
“Vou contar tudo para Deus”, disse um menino sírio pouco antes de morrer, vítima de um bombardeio.
Isto se deu em junho de 2014. Na Síria, evidentemente.
Estou pensando fazer o mesmo que esse menino, não identificado à época, já deve ter feito, se eu tiver a felicidade de me encontrar com Deus depois de terminar este Caminho de Santiago de Compostela da minha vida.
Depois do que o garoto deve ter contado a Deus, eu vou só reforçar, porque ele, na sua pureza de uma criança dos três anos de idade, deve ter ido ao âmago da questão humana e desumana.
Vou dizer para Ele tudo de bom e de ruim que vi neste mundo.
Quem já leu Ulisses, de Homero, escrito há mais de cinco mil anos; ou Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas, publicado na França em 1844, pode bem fazer uma comparação do “estatus quo”, atual e o “modus vivendi” de então.
Só mudaram as vestimentas e as armas. A crueldade é a mesma. As pessoas não andam armadas de bestas, espadas ou lanças. Nem exibem revólveres em coldres no cinturão, mas se armam por outros meios, principalmente os espíritos e tudo é emanado de acordo com a cartilha da religião criada pelo “deus dinheiro”.
O ter em vez de priorizar o ser.
Vou fazer uma reportagem completa para Deus sobre o que acontece aqui nesta Terra criada por Ele, e ao criar viu que tudo era bom.
Se ficou ruim, a culpa não é dele.
Como repórter, farei uma extensa reportagem. Ou, então, escreverei um livro contando tim tim por tim tim, tudo que os meus olhos viram e a alma sentiu ao longo de minha vida.
Acredito, Deus ficará horrorizado com tudo que vou contar a Ele.
Vou contar o quanto a Humanidade que Ele fez nascer neste planeta maravilhoso, pôde se corromper sob todos os aspectos.
Vou pedir a quem for lá no espaço sideral para sacar uma fotografia da alma da Terra, aproveitando a estada lá em Marte, ou mesmo na Lua, a fim de mostrar a Deus a cor dela, escura de tanta maldade humana, de tanto sangue derramado desde sempre. E era azul!
Vou pedir desculpas a Ele, mas vou comentar sobre tamanha benevolência Dele, paciência e tudo mais em relação a Humanidade, que, por infinitas vezes, deu demonstrações de que não merece viver neste planeta, e ainda assim, Deus não dá um jeito nesse quadro tenebroso.
Vou dizer, olha, Deus, a matriz de todos os pecados daquela gente é o egoísmo, o Senhor sabe disso. Lá na Terra tem uma pá de gente achando que lá é o início e o fim da vida. São chamados de “negacionistas”.
Essa gente chegou ao descalabro de usar o seu Santo Nome em vão – eu vou dizer isso a Ele e alertar sobre a malvadeza dessa gente. Acho que têm parte com o capiroto, vou dizer isto também.
É gente cabeça dura. Materialista, acredita tanto em si mesma que se considera “deus”. Alimentam-se de ódio, rancor, mágoa, ganância, disputa, fraudes... – “a lista é grande, oh, Deus”, direi.
Podem até dizer que amam ao próximo, mas é só de boca. São falsos; isso dói!
Como a gente não sabe do dia de amanhã, estou prometendo dizer a Deus tudo isto quando chegar a minha hora, que pode ser qualquer hora, em tempo.
Vou falar com Deus o quanto de gente há sem coração na caixa torácica e sem massa cinzenta na caixa craniana.
Gente que pensa com o umbigo. Conquanto estiver bem, o sofrimento visto nos arredores, causados por eles mesmos, não importa.
Vou dizer a Deus que surgiu certa feita uma tal de internet e dentro dela um tal de Facebook que revelam diariamente o quão doente está expressiva parcela da comunidade internauta.
Se Ele me perguntar, eu vou dizer o quanto os valores verdadeiros que põem em pé o homem e a mulher, com dignidade, rolaram por terra como se uma nova ordem estivesse em vigor e com rigor demoníaco.
Confesso que tenho muito mais coisas a contar a Deus, se pela graça Dele, eu puder encontrá-lo em outro plano de vida.
Mas por enquanto, aqui está o suficiente para o momento, sobre o que rola na Terra, além do que o menino sírio já deve ter contado a Deus. A diferença é que a criança é pura e eu não, sou pecador e me confesso, mas prezo os valores verdadeiros.
Prezo a educação paterna e a educação formal, respeito os professores, pratico a civilidade no dia a dia concomitantemente ao amor e respeito aos humanos semelhantes a mim.
Erro algumas vezes, mas o meu crédito de acertos é maior. E digo isso sem um pingo de vaidade. Procuro fazer a minha parte, conscientemente.
Não sou agressivo, não sou prepotente nem arrogante. Não me interessa armar-me espiritual nem materialmente, porque desde cedo aprendi que “violência gera violência”. E quem se arma tem 100% de chance de matar ou morrer.
Eu acho preferível morrer a matar.
Procuro sempre ser solução e não problema.
Se tudo isso Deus considerar e por misericórdia Dele abrir uma vaguinha, por menor que seja, simplesinha, no Céu, vou contar tudo a ele.
Até lá, devo acrescentar algumas coisas mais.
Porque há muito mais, mas o espaço não é tão grande assim
*Jornalista e escritor.