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O escritor Itamar de Oliveira extrai ouro e pedras preciosas da política mineira

O escritor Itamar de Oliveira extrai ouro e pedras preciosas da política mineira

Aqui, mais um capítulo em que se aprenderá porque a política é uma arte em que mineiro é mestre e conhecerá homens que deram dignidade à mais importante atividade humana

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18-02-2023

09h:00

 Rufino Fialho Filho* 

- Ronan, você, como eu, é cristão. Você não tem o direito à omissão. A Secretaria de Trabalho é o lugar de acolhimento aos que lutam para ter casa, pão, trabalho e dignidade. Tudo é possível através do trabalho. Fui o primeiro secretário do Trabalho de Minas, no passado. Você e a Secretaria serão muito melhores no futuro, acredite. Você terá contato com muita gente. Os pedidos pessoais que não prejudicarem o bem comum você procure atender. Os pedidos de interesse público você lute para atender”.

Fala do professor Edgard da Mata Machado para convencer Ronan Tito a aceitar o cargo de secretário do Trabalho do governo Tancredo Neves

OCTÁVIO ELÍSIO ALVES DE BRITO

Dr. Hélio, seu Secretário Octávio Elísio foi sempre alto e elegante.

 O professor Octávio Elísio sabia ser altaneiro com os pequenos e atencioso com todo mundo.

 Foi duas vezes seu colaborador. No primeiro governo, foi o líder do I Congresso Mineiro de Educação, inspirado pelo Dr. Tancredo Neves. No seu segundo governo, foi secretário de Ciência e Tecnologia e o órgão ganhou novos horizontes, ao colocar na agenda a proteção do meio ambiente.

 Seu governo, Dr. Hélio, parece que foi mesmo preparado para esperar os desafios do século XXI.

Com Tancredo e com Hélio Garcia

O professor Octávio Elísio Alves de Brito, formado em Engenharia de Minas e Metalurgia na Escola de Minas de Ouro Preto, construiu uma trajetória de vida muito identificada com o setor de minas e metalurgia. Fez especialização em Engenharia Econômica na PUC-MG e em Política e Economia Mineral na Escola de Minas de Paris e na Escola de Minas do Colorado (EUA).

Logo depois de formado, começou a carreira profissional no Instituto de Tecnologia Industrial de Minas Gerais, atuando em pesquisas de recursos minerais para a agricultura na Companhia Agrícola de Minas Gerais (CAMIG).

Foi professor de Tratamento Mecânico de Minerais na Escola de Minas de Ouro Preto e professor de Economia Mineral do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais.

No Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais (INDI), presidiu a Metamig. Participou da elaboração do Plano de Industrialização de Minas Gerais. Foi convidado a assumir o cargo de secretário-adjunto de Ciência e Tecnologia de Minas Gerais pelo titular da pasta, professor José Israel Vargas, criador da Secretaria, no governo Aureliano Chaves.

Em 1982, com a eleição de Tancredo Neves para o governo de Minas, Octávio Elísio fez parte da equipe de transição da futura administração. Não era uma tarefa simples.

Tancredo, o primeiro governador eleito pelo voto direto, chegava ao Palácio da Liberdade em clima de intensa vibração cívica e popular. A fé e a esperança no governo eleito pelo povo eram enormes. No PMDB de Minas, o clima era de euforia. E de muita expectativa de poder.

Tancredo Neves colocou na equipe de transição um time de dez integrantes de reconhecida credibilidade em diversas áreas. Octávio Elísio era o relator das questões relacionadas com mineração, metalurgia, ciência, tecnologia, recursos hídricos e meio ambiente.

Era uma aposta previsível para ocupar, no futuro, o cargo de secretário de Ciência e Tecnologia no Governo Tancredo Neves/Hélio Garcia.

Tancredo fez questão de sinalizar que o vice-governador Hélio Garcia seria uma das peças principais do projeto político que teria desdobramentos futuros no plano nacional.

Dario Faria Tavares e Jafet Abraão também faziam parte da equipe de transição.

O núcleo duro do futuro governo estava delineado. Ronaldo Costa Couto, secretário do Planejamento e Luiz Rogério Mitraud, secretário da Fazenda.

Após a vitória nas urnas, em 15 de novembro, os holofotes passaram a iluminar a Comissão de Transição, que trabalhou até o dia 9 de março no Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais. A Comissão era a principal fonte de informação e de especulação política da imprensa.

Na véspera do anúncio oficial da nova equipe, Tancredo Neves, no apartamento do edifício Niemayer, na Praça da Liberdade, recebeu os “futuros” secretários.

O primeiro a ser recebido foi o médico Dario Faria Tavares, o mais cotado para a Secretaria da Saúde. O convite foi feito e um Dario alegre e sorridente saiu e fez sinal para o deputado Ronan Tito, o segundo a ser recebido pelo Governador.

Todos os indícios apontavam, com certeza, a escolha de Ronan Tito para a Secretaria da Agricultura, reivindicada pelo Triângulo Mineiro. O próprio Ronan se preparava e se imaginava no papel messiânico de apóstolo de uma semeadura e de uma grande colheita na agricultura.

A conversa com Tancredo não atendeu às expectativas de Ronan Tito. O governador já estava em campo disposto a mover rios e montanhas rumo à redemocratização. Precisava das chamadas correntes “autêntica” e “progressista” do partido para a área social.

Na Agricultura, Tancredo havia decidido emplacar o mais destacado ruralista de Uberaba, identificado com a União Democrática Ruralista (UDR), o fazendeiro e pecuarista Arnaldo Rosa Prata.

Era demais para o líder de Uberlândia que caminhava junto com os políticos da chamada “esquerda católica”, que não era revolucionário, mas tinha pavor dos rotulados como reacionários. A Secretaria oferecida a ele era da área social.

O impulsivo Ronan Tito não disse sim e nem não ao Governador e pediu tempo para pensar. Saiu apreensivo e cabisbaixo, pensando em abandonar a até então bem sucedida caminhada política.

Octávio Elísio foi recebido em seguida.

- Professor, disse Tancredo, preciso agradecer o seu empenho e o seu trabalho na Comissão de Transição. Gostaria de continuar tendo a sua colaboração no meu governo. Quero o professor como meu secretário de Educação.

Com Octávio Elísio a emenda era bem melhor que o soneto: o professor era o franco favorito para a Secretaria de Ciência e Tecnologia.

Assim como Uberaba e Uberlândia, Araguari e o Pontal do Triângulo precisavam ser contemplados na equipe de Tancredo Neves. O estrategista não poderia nunca pensar em unir os mineiros contra a onda separatista que movimentava o Triângulo Mineiro.

Uma intensa articulação política se fez para colocar o deputado Milton Lima, de Araguari, na Secretaria da Educação. O governador, com maestria, foi sensível ao pleito das lideranças locais e regionais. Tancredo Neves colocou o deputado Milton Lima na Secretaria de Ciência e Tecnologia.

Octávio Elísio, ciente e consciente de que estava diante de novos e empolgantes desafios, aquiesceu e agradeceu a confiança do Governador Tancredo Neves.

O futuro governador disse mais ao futuro secretário da Educação:

– Sei que a tarefa é enorme. Farei o que puder para ajudá-lo. O senhor terá completa autonomia para formar a equipe de trabalho. Peço apenas a gentileza de aceitar, na presidência da CARPE, o nosso correligionário, engenheiro Aloísio Vasconcelos.

A CARPE era a autarquia politicamente vinculada ao governador e administrativamente à Secretaria de Educação, encarregada da construção, ampliação e recuperação de prédios escolares.

Octávio Elísio, também sorridente e feliz, saiu do encontro com o governador e, juntamente com Dario Tavares, foi ao encontro de Ronan Tito para buscar um caminho de paz para o que Tancredo havia pensado como tripé social de um governo comprometido com a redemocratização do país.

O grupo se reuniu no gabinete do deputado estadual Luiz Alberto Rodrigues, na Assembleia Legislativa. Ronan Tito continuava atônito, inconsolável e firme na disposição de abandonar o barco.

Surgiu no grupo a ótima ideia de conversar com o “guru” da esquerda católica, o professor Edgar da Mata-Machado, uma figura de referência no grupo liderado pelos deputados Edgar Amorim e Cássio Gonçalves.

Na casa do combatente contra todas as ditaduras, Ronan Tito, mais uma vez, se colocava na defensiva, continuando a entender que havia sido preterido e não aceitaria nenhum prêmio de consolação.

Edgar, com aquela mansidão característica dos que atravessam os maiores tormentos, foi incisivo:

- Ronan, você, como eu, é cristão. Você não tem o direito à omissão. A Secretaria de Trabalho é o lugar de acolhimento aos que lutam para ter casa, pão, trabalho e dignidade. Tudo é possível através do trabalho. Fui o primeiro secretário do Trabalho de Minas, no passado. Você e a Secretaria serão muito melhores no futuro, acredite. Você terá contato com muita gente. Os pedidos pessoais que não prejudicarem o bem comum você procure atender. Os pedidos de interesse público você lute para atender.

Ronan Tito saiu iluminado e transfigurado da residência do professor Edgar da Mata Machado. O tripé social do Governo Tancredo Neves estava fortemente consolidado.

O grupo, durante o tempo em que Tancredo governou, atuou de forma convergente e sincronizada. Octávio Elísio comandou um processo de mudança na educação dando voz e vez aos profissionais na busca de novos caminhos para o ensino público, por meio do I Congresso Mineiro da Educação. Dario Tavares liderou a vanguarda sanitarista que preparou o caminho para a criação e a consolidação do Sistema Único de Saúde. Ronan Tito imprimiu, na Secretaria do Trabalho, um compromisso prioritário com os movimentos sociais, num período de enormes dificuldades, provocadas por uma crise recessiva de grandes proporções.

O tripé foi rompido quando Tancredo passou o comando político de Minas ao vice-governador Hélio Garcia. O PMDB de Ronaldo Perim e do Vale do Rio Doce precisava de espaço no governo.

Hélio Garcia conduziu o amigo Dario Tavares, companheiro de todas as lutas na UDN, no PP e no PMDB, para o Tribunal de Contas. Em seu lugar entrou o médico, deputado e ex-prefeito de Governador Valadares, Raimundo Rezende.

Ronan Tito gostava e desgostava com frequência de Hélio Garcia. Quando o governador disse publicamente que podia colocar o secretariado de férias, sem comprometer o funcionamento de administração pública, Ronan Tito entendeu que chegara a hora de sair do governo. O chefe da Casa Civil, Carlos Cotta, tentou evitar a crise dizendo ao Secretário do Trabalho que o Governador se retratava e mandava pedir desculpas.

Ronan Tito, sempre impetuoso, foi categórico:

– A declaração do Hélio foi pública. Só fico se o pedido de desculpa também for público.

Hélio Garcia emudeceu e Ronan Tito permaneceu amuado.

Tancredo Neves entrou na parada e serenou os ânimos:

– Ronan, por favor, fique até a votação no Colégio Eleitoral.

Ronan se desincompatibilizou e deixou o cargo de Secretário do Trabalho para votar em Tancredo Neves.

Votou, comemorou a vitória de Tancredo e foi substituído por Ademir Lucas na Secretaria do Trabalho.

Octávio Elísio continuou Secretário e o Governador lhe sugeriu concorrer à Constituinte. Em seguida, foi eleito deputado federal e Ronan Tito, senador. Mais tarde, ambos se destacaram na Assembleia Nacional Constituinte.

Octávio Elísio voltou a ser secretário de Estado no segundo mandato do Hélio Garcia como governador. Era um tempo novo. Hélio Garcia constituiu uma equipe de governo homogênea. Sem interferências dos partidos e dos caciques políticos.

Hélio esperou com paciência terminar o governo e o mandato de Newton Cardoso. Criou uma nova legenda partidária, o Partido das Reformas Sociais (PRS), e conquistou de novo o comando político de Minas.

O professor Octávio Elísio Alves de Brito foi convidado, finalmente, a assumir a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, como parecia estar escrito pelo destino, no começo da viagem.

Olhando pelo retrovisor, o professor Octávio Elísio reconhece que Hélio Garcia foi um notável administrador e um político que aprendeu e aprimorou as lições recebidas de Magalhães Pinto e Tancredo Neves. Ele foi o traço de união entre os dois eternos rivais do antigo PSD e da extinta UDN. Foi o grande articulador de apoios civis e militares e empresariais ao projeto de redemocratização liderado por Tancredo Neves.

Octávio Elísio conhecia bem o estilo Hélio Garcia de delegar responsabilidades e de cobrar resultados.

Lembra que jamais deixou de ser recebido pelo governador quando precisava de orientação política. Recorda que Hélio Garcia não era apenas educado. Era atencioso e fraterno durante os despachos. Ouvia atentamente os argumentos e os fundamentos de todos as propostas e frequentemente tinha excelentes sugestões, ponderações e críticas para cada assunto em pauta.

O ex-secretário de Educação e de Ciência e Tecnologia credita ao governador Hélio Garcia a realização de obras públicas que mudaram a face de Belo Horizonte e de Minas Gerais.

Como prefeito e como governador, foi ousado ao democratizar e descentralizar decisões.

Foi assim na Prefeitura, ao criar as regiões administrativas de Belo Horizonte. Não agia de forma diferente como governador.

No campo da ciência e da tecnologia, ele tinha consciência da importância de Minas como caixa d’água do Brasil. Hélio apoiou a criação e a consolidação de uma política de recursos hídricos em Minas.

Octávio Elísio lembra que nossos comitês de bacias hidrográficas representam um notável avanço em matéria de descentralização e democratização de decisões, pois sabemos que as bacias hidrográficas ultrapassam as fronteiras e divisões entre municípios, regiões e países.

“Hélio Garcia partiu faz pouco tempo. Não sou daqueles que adoram fazer apologia dos que nos prestigiam. Certamente o Governador foi um pragmático realista na política. Mas para pensar a água e os caminhos dos rios em busca do mar, acho que Hélio Garcia foi um homem bom e preocupado em melhorar a vida do povo de Minas Gerais”.

*Jornalista e escritor.

Imagem da Galeria Octávio Elísio Alves de Brito foi um grande homem em todos os aspectos sociais e políticos
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