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Os ensinamentos do pai são como sementes que viram árvores e dão frutos

Os ensinamentos do pai são como sementes que viram árvores e dão frutos

Um homem abria uma cova no jardim para plantar uma muda de árvore tendo dos lados dois filhos, dando a eles o bom exemplo de trato com a Mãe Natureza.

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24-01-2023

09h:50

Rolando T. Neves*

Era manhã de sábado. Em geral, as manhãs são mágicas. As de sábado, então, mais ainda.

O casal descia a Rua Mar de Espanha, no Bairro Santo Antônio, em Belo Horizonte, de mãos dadas, pelo meio do asfalto.

Durante os dias considerados úteis (como se sábado e domingo fossem dias inúteis) a rua é movimentada de gente, carros e motocicletas. Mas, aos sábados, fica um paradeiro só, dá até para andar pelo meio do asfalto.

Mar de Espanha, este nome é bastante sugestivo para uma rua, lembra algo romântico. O nome remetia sempre à Europa, toda vez em que o pronunciava. E num átimo ele via-se com a mochila nas costas, subindo serras, descendo encostas, no Caminho de Santiago de Compostela, na Espanha, e na Serra da Mantiqueira, no Caminho da Fé.

A Rua Mar de Espanha faz uma curva lá embaixo e do lado direito da calçada oferece a opção de uma pequena escada, adentrando um beco entre dois prédios.

O do lado esquerdo tem jardim bem cuidado, de gramado verdinho. Vale a pena quedar ali para apreciá-lo. Passar por ali dá certa dose de prazer porque pode-se notar o esmero de quem certamente aprecia as belezas a nós reservadas pela Mãe Natureza.

Em determinado ponto do jardim um homem de tez clara, cabelos pretos, de cerca de 1,80 m de altura, curvava-se sobre um buraco aberto no gramado em declive, de onde retirava terra.

Ele vestia camisa branca e calça escura. Usava sandália havaiana. Certamente, apreciava a manhã de sábado, dia de folga dele, e podia dedicar algum tempo à família porque nos dias úteis, trabalha o dia inteiro fora.

Com ele havia duas crianças. Meninos, aparentemente, filhos dele; e uma muda de árvore, talvez um ipê amarelo ou roxo envolta em um saco plástico preto. Os meninos pareciam eufóricos, excitados mesmo vendo o pai abrir o buraco na grama para plantar uma árvore.

O casal apenas passava por ali com o intuito de fazer uma caminhada de rotina.

As escadas ao final são um convite para quem gosta de exercitar os músculos das pernas.

Ela e ele observaram a cena atentamente.

E enquanto desciam 126 degraus que dão acesso à rua de baixo, comentavam a respeito dela e o que se deu ao se dirigir ao pai com os filhos do lado, dizendo em voz alta:

- “Agora falta só escrever o livro”.

O homem assentiu com a cabeça e em voz alta, sem olhar quem havia feito a observação, continuou sobre o buraco, preparando-o para plantar a muda de ipê ou, senão, de sibipiruna.

Um dos meninos perguntou:

- O que ele disse, pai?

O pai respondeu:

- Ele disse “só falta escrever um livro”.

E explicou ao filho: “Porque, na vida, o homem deve plantar uma árvore, gerar um filho e escrever um livro para poder se sentir realizado”.

Os meninos estavam acocorados ao lado dele, compenetrados. Um deles devia ter sete anos de idade e o outro menos.

O casal desceu as escadas comentando o quão importante foi a cena fortuita, em que o pai ensinava, na prática, aos dois filhos, como deviam plantar uma árvore. E o gesto dele despertou no casal a observação feita em voz alta, e então os meninos puderam receber a teoria – “plantar uma árvore, gerar um filho e escrever um livro” podem tornar um homem realizado.

Nos dois cresceu a certeza de que aqueles meninos, jamais se esquecerão do sábado mágico, quando o pai os chamou para irem ao jardim a fim de plantar muda de uma árvore.

Eles crescerão com o exemplo prático e a filosofia do tripé que pode tornar o homem realizado, livre do sentimento de ter passado em vão pelo planeta Terra.

O casal foi em frente andando de mãos dadas.

Faz dez anos que o pai plantou a árvore em companhia dos dois filhos. O de mais idade deve estar com 17 anos. Eles devem acompanhar o crescimento da árvore a cada dia.

Volta e meia, marido e esposa passam por ali para acompanhar o crescimento dela.

Dez anos atrás, eles não sabiam de que era aquela muda. As flores amarelas denunciaram a espécie: Ipê.

Passado todo esse tempo, uma curiosidade martelou a memória do casal: e quanto as sementes plantadas na mente em formação dos filhos, será que geraram frutos?

*Escritor.

Imagem da Galeria Dez anos depois a muda se revelou um ipê amarelo, mas o importante foram as sementes na mente dos meninos
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