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O velho surgiu de repente e com o seu jeito característico alimentava os passarinhos

O velho surgiu de repente e com o seu jeito característico alimentava os passarinhos

A cena transcorreu na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, um dos lugares mais agradáveis da capital, onde acontecimentos vários e históricos se deram.

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21-01-2023

18h:11

Rolando T. Neves*

Foi assim, do nada. Ele apareceu assobiando baixinho como se chamasse alguém ou um passarinho. Chegou mansamente, ficou olhando para o alto da árvore como se procurasse alguma coisa.

Era um velho. Os cabelos brancos despontavam por debaixo do chapéu tipo panamá. Ele vestia camisa branca com uma blusa marrom por cima.

O dia estava frio. Aquele friozinho de maio, decorrente de uma massa polar que levou chuva e enchente em pelo menos dez cidades de Santa Catarina.

Em Belo Horizonte, não. Isto é, choveu, mas não foi chuva forte ao ponto de causar estragos. Mas naquele momento em que o velho surgiu assobiando, logo de manhã cedinho, o céu estava nublado.

Na Praça da Liberdade, poucas pessoas andavam. Uns corriam. Duas mulheres surgiam. Uma delas empurrava carrinho de bebê. A mais nova tomou a criança nos braços para mostrar a ela o passarinho a catar migalhas na grama do jardim.

O velho aproximou-se de um dos galhos da árvore. Tirou da sacola plástica um pouco do que trazia. Era algo parecido com farelos de milho ou de pão. Não deu para identificar ao certo o que era.

Ele fez um movimento horizontal com a mão direita sobre o galho. Devia estar espalhando os farelos para os passarinhos.

Do jeito como ele chegou, assobiando, manso, deu a impressão de ter costume de fazer aquilo todo dia de manhã cedinho. Devia ser o passatempo dele. Se um dia deixar de fazer isto, sentirá falta. Os passarinhos, também.

Embora quase em câmera lenta, a cena foi rápida, mas leve o suficiente, tomada por aura de bondade e poesia ao mesmo tempo.

O velho continuou assobiando baixinho, olhou para o alto da árvore e se retirou da mesma forma como chegou, lépido.

Logo apareceu uma rolinha marrom. Os pezinhos vermelhos, semelhantes aos dos pombos, o passarinho começou a catar os farelos que o velho havia deixado cair ao espargi-lo ao longo do galho com a mão direita.

A rolinha catava os farelos apressadamente. Talvez ela temesse a concorrência das outras rolinhas próximas.

Ao redor da praça carros iam e carros vinham como acontece todo dia. Entretanto, o ronco dos motores nem chegava a incomodar. Aquele lugar parecia estar dentro de uma redoma, imune a tudo, até a explosão nuclear.

Era só o início de uma manhã. Ali, a vida desabrochava em abundância como as flores azuis do jardim.

*Escritor.

Imagem da Galeria A Praça da Liberdade é palco de grandes acontecimentos e habitada por passarinhos
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