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A reação global foi de surpresa e indignação. Políticos, juristas e ativistas de direitos humanos preocupados CRÉDITOS: Divulgação
A decisão também reflete uma aproximação estratégica com o presidente reeleito dos Estados Unidos, Donald Trump, em uma agenda conjunta para desregulamentar as plataformas digitais
11-01-2025 às 08h48
Mariana Grilli Belinotte*
No dia 7 de janeiro de 2025, Mark Zuckerberg anunciou mudanças significativas nas políticas de uso dos aplicativos da Meta, proprietária do Facebook, Instagram e WhatsApp. Entre as alterações, destaca-se o fim das equipes de moderação responsáveis por remover conteúdos ofensivos. Em seu lugar, a empresa adotará as chamadas “Notas da Comunidade”, inspiradas no modelo do Twitter (atual X). Além disso, Zuckerberg decidiu encerrar as parcerias com empresas de fact-checking — organizações geralmente associadas a veículos de mídia tradicionais, cujo papel é verificar e contextualizar informações falsas ou enganosas.Segundo Zuckerberg, essas mudanças têm como objetivo corrigir os “excessos” cometidos por moderadores, que, em sua visão, limitavam a liberdade de expressão e censuravam os usuários.
A decisão também reflete uma aproximação estratégica com o presidente reeleito dos Estados Unidos, Donald Trump, em uma agenda conjunta para desregulamentar as plataformas digitais. Na prática, trata-se de uma resposta direta às recentes iniciativas de regulação de países como Brasil, Austrália, Canadá, Reino Unido e organismos como a União Europeia, que buscam impor limites ao “faroeste” digital.A reação global foi de surpresa e indignação. Políticos, juristas e ativistas de direitos humanos demonstram preocupação com o que virá a seguir. Caso o Facebook e o Instagram sigam o mesmo caminho do Twitter, o impacto pode ser mais profundo: a Meta, com bilhões de contas ativas, possui um alcance muito maior do que o Twitter, potencializando o risco de disseminação de discursos de ódio, desinformação e polarização extrema.
A radicalização online pode escalar para casos de ciberbullying, violência política e até terrorismo no mundo real, além de alimentar teorias da conspiração e campanhas de desinformação sobre vacinas, minorias, políticas públicas, resultados eleitorais e etc.O exemplo do Twitter, sob a liderança de Elon Musk, já aponta para cenários preocupantes. Embora muitos usuários e anunciantes tenham abandonado a plataforma, o núcleo mais radicalizado encontrou um espaço para propagar opiniões extremas. Hoje, é quase impossível evitar conteúdos misóginos, racistas e xenofóbicos no Twitter, independentemente das contas que você escolhe seguir.
O resultado é um ambiente hostil, com publicações de baixa qualidade e a naturalização do ódio e da intolerância como linguagem socialmente aceita.A preocupação, portanto, é legítima, e os potenciais danos não podem ser subestimados. No entanto, há algo de revelador na postura de Zuckerberg. Ao abandonar a neutralidade que vinha até então mantendo (argumentando que a plataforma não era “política”) e adotar uma posição explícita na disputa política e ideológica de nossa era, ele também expôs sua empresa ao escrutínio e à retaliação global.
Ao declarar explicitamente que está disposto a atacar diretamente as leis e valores de outros países, Zuckerberg abre mão de uma de suas principais defesas, a da neutralidade, e dá espaço para que essas nações reforcem suas regulamentações e até limitem as atividades da Meta.Ou seja, ao passar a uma posição aberta, de ataque, Zuckerberg noz faz um favor e também se deixa mais vulnerável, criando uma oportunidade para que a cooperação global no tema aumente. Além disso, fomenta o urgente debate sobre o papel dessas empresas.
Afinal, o que esperamos delas? Uma liberdade de expressão irrestrita, mesmo que às custas da convivência civilizada? Ou a construção de um ambiente digital que promova valores compatíveis com as constituições e compromissos democráticos de cada Estado?
*Mariana Grilli Belinotte é doutoranda em Ciências Militares (ECEME), pesquisadora do Grupo Raul Soares e Amiga da Marinha (SOAMAR-BH).