
País fictício, esta denominação Brasil. CRÉDITOS: freepik
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21-03-2025 às 09h19
Rufino Fialho Filho*
Rufino Fialho Filho*
- O Brasil não existe. Hoje, a denominada população brasileira é estrangeira em sua própria terra, não fala a mesma língua dos dirigentes do Estado, não tem autonomia e nem soberania.
A população denominada brasileira, que vive no hemisfério Sul, em sua maioria absoluta é uma população miserável, insignificante, inexpressiva e paupérrima.
Miserável pela tirania do regime de controle das riquezas nas mãos de poucos. Insignificante pois posto e mantido sob o domínio dos titulares da mídia que gestam e sustentam os que poderão significar alguma coisa. Inexpressiva diante do poder do Estado, que tudo pode, que imobiliza a população com os controles dos shows e das eleições. Inexpressiva em seu sentido lato, é nada, quase nada. Paupérrima, jamais conseguirá sair da pobreza dependente de esmolas e favores políticos. Os brasileiros não são os brasileiros. Não são mais do que uma ficção. É um povo criado para a ficção e limitado à ficção.
Miserável em sua condição de vida; insignificante pelos controles que lhe são impostos pelos dominadores; inexpressiva porque lhe são retirados todos os meios de expressão e massacrados com uma língua, palavras e ideias prontas para destruir, amordaçar e desqualificar o homem que queira resistir, pensar, dizer o que pensa e fazer sua independência. Paupérrima porque toda a riqueza que ele produz jamais será dele, jamais a ela este homem-nem-cidadão jamais jamais terá acesso. Os brasileiros não são os brasileiros.
- O Brasil é uma ficção. É uma ficção para o seu povo. O seu povo também uma ficção. Ficção contábil? Não. Não é ficção para investimento. Não é ainda um paraíso fiscal. É um paraíso monetário. Um paraíso que abastece e engorda os paraísos fiscais e as matrizes. Não se pode denominar sua existência como aquilo que não é. O Brasil não existe para o seu povo, para a população e não existe nem mesmo dentro de traçados geográficos e de limites territoriais. A ficção, criada, inicialmente, para negociação de espaços de navegação, se sustenta agora como espaço de trânsito financeiro e de populações em regime de migração.
Localizado, oficialmente, segundo as regras de poder da época, há 500 anos e, em regime de investimentos fixos(?), há pouco mais de 100 anos, a base territorial de grupos investidores estrangeiros, transformou-se, com o sistema de comunicação mais ágil, em um lugar virtual, um lugar que existe e que também não existe, um lugar de ficção.
Como um lugar que existe é base de transações, desconhecendo-se população, fronteiras e limites territoriais. Como um lugar que não existe dele se desconhece a personalidade, a personalidade jurídica, a personalidade cultural, a não ser para efeito de manobras e a ampliação de lucros e redução de prejuízos (os lucros sempre dali sairão e os prejuízos ali sempre ficarão).
Não se pode denominar sua existência como aquilo que não é. O Brasil não existe para o seu povo, para a população e não existe nem mesmo dentro de traçados geográficos e de limites territoriais. A ficção, criada, inicialmente, para negociação de espaços de navegação, se sustenta agora como espaço de trânsito financeiro e de populações em regime de migração.
País fictício, esta denominação Brasil ( que funciona como governo virtual) tem sido utilizada contra os interesses dos habitantes do espaço geográfico.
- A população, o estado e o governo. A construção deste domínio é formulada, sistematizada e mantida em permanente desenvolvimento já há 500 anos. Os novos contornos do domínio, nas últimas décadas, caracterizaram-se pela transferência das riquezas e dos grandes patrimônios para o controle direto de centros externos – com a redução das principais intermediações e que, em décadas passadas, se impunham pela presença de um nacionalismo recorrente e pelo constrangimento da humilhante condição definida pelos dominadores para os dominados.
Ele adquiriu novos contornos nos últimos anos, com a transferência das riquezas nacionais (no desfazimento do Estado e da Nação, não mais úteis ao patronato “nacional”) e a manutenção dos grandes patrimônios sob controle direto de centros externos. A redução do processo anterior de intermediários, de prepostos e a redução da própria da própria intermediação expôs a vassalagem a uma desqualificada atuação onde a lei não existe (porque o Estado também não existe senão como recurso de cenário) e onde a corrupção é a regra – fora disto não há ganho.
O próprio sistema tributário garantia dos recursos do “Estado nacional” se sustenta num selvagem processo de extorsão – a corrupção impõe-se como única possibilidade inteligente de se trabalhar entre aqueles que não tem outros recursos senão produzir e viver nos limites geográficos do território sob tutela e vassalagem.
- Um país sem território não é um país, não existe – O mapa do Brasil é pura ilusão. É puro desenho, as fronteiras ali demarcadas são desenhos sem sentido. Não se engane, talvez as fronteiras entre municípios e entre estados façam mais sentido e sejam mais autênticas do que as denominadas fronteiras nacionais.
Um país, um estado soberano, se define a partir de fenômenos concretos como a existência de uma língua comum, de um território, de um povo, de um governo, leis próprias, um exército e de uma história, entre outros. Destes, o mais importante talvez seja o território, pois são muitos os estados cuja população fala mais de uma língua, possui percentuais significativos de imigrantes (uma das características dos tempos modernos é a alta taxa de migração de populações inteiras) e que sequer possuem exércitos. O território com fronteiras estabelecidas dá a cara física do país e do Estado. O que acontece com o território do povo brasileiro?
Segundo o geógrafo Milton Santos, em artigo publicado na FSP, de 08.08.99, o “Brasil” não pode considerar mais detentor de seu território ou mesmo ter no território a descrição de sua base física.
“Não é simples metáfora dizer que está havendo uma entrega acelerada do território, já que o modelo econômico consagrado recusa ao país as ferramentas da sua regulação, pondo-as em mãos outras (geralmente estrangeiras), cujos projetos e objetivos podem ser inteiramente estranhos ou adversos ao interesse nacional. É desse modo que áreas inteiras permanecem nominalmente no território, fazendo parte do mapa do país, mas são retiradas do controle soberano da nação”.
Na década de 60, a linguagem política introduziu conceitos estratégicos para a consolidação do poder militar dominante. Entre estes, o mais cruel e destruidor foi o de segurança nacional, em que transformava os cidadãos em inimigos da nação, suspeitos e sujeitos à prisão e condenação por lei própria: a lei de segurança nacional, uma lei contra os cidadãos.
Outro conceito alterava a concepção de território e de fronteiras. Um território é definido apor suas fronteiras. Fronteiras são marcos geográficos, estabelecem limites territoriais. Pois bem, em junho de 1965, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Vasco Leitão da Cunha, introduziu como marco do pensamento diplomático brasileiro, um novo conceito de fronteiras.
“…o chanceler da ditadura defendeu o conceito de fronteiras ideológicas que, no seu modo de ver, devia substituir o de fronteiras físicas e geográficas. Vemos, assim, depois da substituição do conceito de soberania e de independência pelo de interdependência, a substituição do conceito de fronteiras geográficas pelo de ideológicas, completando a abdicação absoluta da personalidade nacional”.
- Os controles externos do governo (executivo). A produção da miséria, necessária, intrínseca e inerente ao processo de controles, gera sofisticados sistemas de domínio que impedem à população dominada sequer de pensar. Principalmente, de pensar. Pensar torna-se algo de alta periculosidade para os dominadores e de maior preciosidade para a inimaginável organização dos dominados.
A destruição do pensar envolve uma rede de equipamentos públicos relacionados com a educação, saúde, habitação, transporte e lazer.
A destruição do pensar é fundamental para a produção e manutenção da miséria. As malhas desta rede jogam com a certeza de que o miserável não come, não dorme, não pensa, não mora, não anda, não sonha – enfim, vive apenas o suficiente para não produzir despesas que não se incorporem a valores (produtos). Jamais se preocuparão com qualquer tentativa de reação ou de postura afirmativa dos miseráveis, isto é, dos brasileiros.
Não há esta possibilidade. A sofisticação chega ao ponto de determinar como frustração de vida a derrota de um time de futebol num campeonato. As relação afetivas mal alcançam o estágio da própria reprodução, tornam-se acidentais e irrelevantes. Vive-se para não viver, é a síntese e a verdade da vida miserável a que está condenada esta população do hemisfério sul até agora denominada de brasileira.
- A produção da miséria e o controle do pensar. Riqueza, luxo e ostentação tornaram-se a face mais sensível da pobreza, da miséria e da degradação do homem no Brasil. É o seu contraponto. É a sua contradição. É a sua razão. A pobreza só existe porque existe a miséria. A degradação só existe porque existe o luxo e a ostentação. Não é a sua outra face e nem mesmo o outro lado da mesma moeda. É rosto de uma só face e é moeda de um só lado.
A riqueza que se perpetua no mundo é a riqueza extraída da pobreza, que explora a pobreza e que se sustenta na pobreza. O luxo é a miséria em sua curta sobrevivência e fausto; a ostentação é o nível superior e mais encantador, mistificador, da degradação humana.
- Luxo e miséria. O governo brasileiro como governo de fato e de direito não existe. Não se governa para o povo, para a população existente. Governo que governa para o capital e para os donos do capital é governo do capital, como capital tem dono, quem gerencia não governa, não preside, não comanda. É gerente. É subalterno. Não passa de delegado das ações comandadas. Não existem eleições no Brasil. O brasileiro foi privado da escolha democrática (?) de seus dirigentes e todo o processo eleitoral é uma farsa em que todos os seus personagens, também denominados erradamente de agentes políticos, desempenham um papel, cujas falas devem saber de cor ou do contrário jamais serão políticos, jamais terão convivência com o poder (?).
- A fraude produtiva. A destruição do governo no Brasil esteve ligada e se tornou constante em ciclos de cuja periodicidade se liga às atividades econômicas predominantes, como a extração de madeira, que deixará de predominar, logo nos primeiros anos, para ser uma constante até hoje, mas que será substituída por outras atividades, como o açúcar, a mineração, o café etc. que se agregarão ao processo econômico violento de destruição das riquezas naturais sem nenhum pudor ou preocupação com a continuidade destes nichos. A riqueza não pertence a quem produz a riqueza.
- Controle e destruição do governo. A destruição do governo ocorre permanentemente. O jogo de aparência que faz a população acreditar numa ocorrência (existência, registro) de governo é extremamente profissional e se esmera pelo zelo de fazer acreditar na existência de uma pátria brasileira, de uma nação brasileira e de que são nobres os sentimentos de brasilidade. Ao mesmo tempo que, no outro lado da balança, constroem também de forma permanente a crença na imaturidade e no arcaísmo destes sentimentos e destas noções sempre apontadas como ultrapassadas e não dentro dos atuais conceitos de modernidade.
- Sentimentos nacionais e ilusões nacionais. O processo eleitoral no Brasil é digno de uma comédia se não fosse tão trágico seu desenrolar para toda a população, que, em muitos momentos, se ilude com a possibilidade de construir sua própria saída para as crises, para suas angústias e para o seu destino de povo, permanentemente, transferidor de recursos, de trabalho, de vida e de saúde para outros povos mais ricos, os dominadores do Brasil.
- A farsa eleitoral. A comédia, a farsa e o ilusionismo atinge a quase perfeição, com os homens aqui também denominados como homens públicos (cognominados, designados, acolimados, apelidados, conhecidos, citados) transformados em atores, bufões, incapazes de quaisquer manifestação de personalidade ou independência.
Não há espaço para a vocação pública, não há espaço para o verdadeiro ator público, para a representação política autêntica – examinado o espaço público básico, em seu nível de pequena célula, o município de dimensões reduzidas, talvez aí se encontrasse a possibilidade de regeneração de células que reabilitasse este espaço e a regeneração da matéria prima da política, a próprio cidadão e o conceito de cidadão e de ação política aristotélico, isto para uma reestruturação perdida a vinte e seis mil anos, no solo grego. Considerando também democracia como instrumento e como meio de se construir a discussão pública e não mais do que isso.
“Democracia importada é como o milho importado, apodrece rápido.”
- A traição dos políticos. Eleitos pelos pobres governa para os ricos. Estas situações tornaram-se comuns no Brasil, desde o fim do período militar, encerrado no final da década de 80, do Século XX. O contrário – nomeado pelos ricos e governando para os pobres – é fato raro em todo o mundo. O rico não elege, nomeia e, para isso, em processos eleitorais, usa de ardis, de artimanhas, de recursos não raros, extremamente utilizados no dia a dia da administração pública que vai da corrupção generalizada à fraude.
- Políticos não ideológicos. Políticos como classe, políticos como casta, o sindicato dos políticos, os políticos como organização (criminosa ou não), em paralelo com a concepção da ciência política e do político que surge da Ética a Nicômaco, de Aristóteles. A mais importante ação humana que é a ação política, a busca da felicidade e do bem coletivo desvirtua-se com a concepção de parlamento que transforma o político em instituição, primeiro torna-se uma classe, a classe política, com interesses e diferenciações sociais que os tornam um grupo a ser sindicalizado. Depois, a classe política busca a transferência do patrimônio – votos, representação, base eleitoral – para o núcleo familiar, os herdeiros.
Os vínculos degradados obrigam a constituição em seguida da atividade política como uma atividade empresarial. Empresa, instituição, em que a simbiose (?), em que a mistura, entre o público e o privado, perde suas individualidades e em que sua manutenção, espaço e poder só se dará através do crime organizado, em que a corrupção é fato menor, porque comum: padrão de sobrevivência política – a política compreendida como ação criminosa.
- A farsa fardada: o Exército nacional. A suposição da existência de um País se assentaria na soberania da Nação e, basicamente, na existência de um exército nacional. Este exército cumpriria garantias constitucionais específicas () e, para isso, teria que existir, esta é a sua primeira condição. Segunda condição, teria que ter uma estrutura orgânica, enfim, ter uma estrutura militar, organização, equipamentos, condições de garantir a integridade física da Nação, do Estado, senão de ataque para a expansão, pelo menos de defesa. Isto não existe.
Em paralelo com qualquer estrutura militar, o que hoje se chama exército brasileiro é uma ficção. Não existe, assim como não existe uma força armada nacional, complementada por estruturas localizadas na Marinha e na Aeronáutica. Quem em sã consciência acredita na existência da Marinha Nacional e que fosse capaz, por estrutura, equipamentos e armamentos de defender a ampla e violável costas nacionais.
Estamos de quatro para o mundo que queira atacar e aqui se atracar. Não temos uma força militar naval capaz de defender sequer uma faixa limitada da costa nacional. Por exemplo, se chegasse um exército invasor para ocupar a baia da Guanabara, ocuparia em menos de duas horas de conflito.
A Força Aérea, a garantia do espaço aéreo nacional, a defesa aérea? Se o Exército não tem como dar comida aos seus soldados, os aviões de combate não têm como levantar voo e, caso consigam permanecer no ar, serão objetos de admiração por obsoletos.
Entretanto, a não existência efetiva, como realidade militar, das Forças Armadas (existe apenas como ficção e como elemento decorativo das solenidades virtuais) não significa que isto que se chama de exército, marinha e aeronáutica não sejam instrumentos de ação de grupos estrangeiros mais poderosos e que, em outros momentos, acionaram tais instrumentos na consecução de seus objetivos estratégicos dentro do que compreendem como ação geopolítica.
Por sua vez, existem outras atividades que, extra-constitucional, se pode dar às denominadas forças armadas. São muitas as hipóteses e/ou atividades que se poderiam atribuir às “Forças Armadas”, um grupo de homens organizados militarmente e que, para além das solenidades, poderiam ser acionados em períodos emblemáticos, campanha de vacinação, proteção de eleitores em épocas de eleição, proteção de cidades em eventos internacionais etc. A última hipótese, seria existir como força policial ou auxiliar da força policia para casos extraordinários ou como referência à força policial, algo como apoio moral à força policial em ocasiões limites, enfim, para meter medo, pela aparência de força e de vestimentas, àquelas forças que, internamente, viessem a ameaçar o próprio Estado (organizações internas do crime também supostamente denominado de crime organizado e que, por ser organizado, exercesse de alguma forma funções de Estado).
- A farsa econômica Alguns episódios emblemáticos que revelam como funciona a permanente, impiedosa e grosseira farsa denominada economia brasileira. Ela não existe. Os principais episódios: A guerra do Paraguai; o encilhamento; Rotschild, imperador do Brasil; a Cana de Açúcar; a Mineração; O assalto e a tragédia da Vale do Rio Doce.
Estes os fatos, mas o que revela a realidade da economia “brasileira” ou portuguesa ou inglesa ou norte-americana são os números. Vamos aos números, vamos aos dados que faz a riqueza e a felicidade dos estrangeiros, dos grupos estrangeiros que sempre dominaram isto que estrategicamente e estilisticamente se denomina Brasil, um quase-país, que tem um quase-governo.
- A ciência econômica A economia como ciência, dentro do limite de procedimentos mensuráveis e como hipótese de mudanças na condição de vida das pessoas nasce a partir de um professor de ética (Adam Smith). A construção da riqueza é a construção nata do talento do homem. Bens produzidos pelos homens são bens de ligação, são agregados valores pelo trabalho e o trabalho é, tanto em sua individualidade como na produção industrial, uma conquista da expansão e da construção do homem moderno.
As riquezas terão a natureza que os valores lhes derem e quem estabelece os valores é o homem. A riqueza é propriedade coletiva. A maior lição de Ética dada por Adam Smith está em sua obra A Riqueza das Nações, em que ele busca a origem da riqueza de todos. Em que ele abre caminho para se interrogar sobre a construção da vida digna e de nações poderosas.
Preocupação que está na Ética a Nicômaco, de Aristóteles. Uma obra de maturidade e uma obra em que se reporta o pensador diretamente no compromisso imediato com o filho e com os compromissos do filho na sociedade grega, a ética é a ação política, a ética é a ciência política. A primeira manifestação, em Aristóteles, conduz a ética para a política.
No século XVI, a economia nasce das aulas de ética numa universidade inglesa, a economia nasce da realidade. Naquele momento, a economia nasce diante da embrionária organização do Estado, já exaustivamente pensado pelos homens. O que vamos construir com todo o poder econômico que surgirá do trabalho humano?
- A farsa do nacional, da formação nacional e da guerra nacional A batalha dos Guararapes – quando ocorreu a batalha – a expulsão dos holandeses. Como este território era administrado pelos dois invasores? Como era a administração holandesa? Como era a administração portuguesa? Não teríamos expulso o invasor errado? Não deveríamos ter expulsado os portugueses, além da administração espanhola com a Restauração? Ou os dois invasores?
Em Mauritsstadt (Recife), “um observatório aí foi levantado, criados jardins e pátios de animais (zoológicos) só o tempo faltou para se ver ali funcionar uma tipografia já encomendada, e organizar uma universidade já concebida”.
Diplomata e historiador Manoel de Oliveira Lima, ao acreditar na importância política de se fundamentar uma obra sobre a Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira, pesquisa em arquivos europeus, e nos revela uma estranha, trágica e inconfortável realidade: esta ficção chamada Brasil só existe para os estrangeiros e na maioria das vezes só existe para os estrangeiros errados, os mais incultos, os mais incapazes e os mais violentos.
De 1654, data da expulsão dos holandeses, até o século XIX, foram mais de dois séculos até que no “Brasil” se pudesse, legalmente, instalar uma gráfica e uma universidade. Qual era a regra do jogos dos invasores portugueses? Explorar e guardar as riquezas naturais. A multidão nas cidades? Zero à esquerda. Jamais entrará na história destas riquezas – este o verdadeiro negócio mantido pela ilusão da existência de um paraíso e de um eldorado – mantido pela ilusão da existência do Brasil.
Um bom negócio, com certeza. Para quem? Para aqueles que hoje, extraem, todos os anos, deste lugar, também chamado de Brasil (isto é, uma bela mina de ouro) mais de 55,92% do PIB. Isto é 55,92% do PIB, Produto Interno Bruto.
Isto é 55,92% de toda a riqueza que aqui neste lugar se produz todos os anos, isto é, mais da metade do que você faz não fica aqui para os seus filhos, vai para os verdadeiros donos do negócio chamado “Brasil”.
- A farsa das revoluções Como a revolução de 30, em que um de seus dirigentes, conclama os oligarcas, a fazer a revolução antes que o povo a fizesse, assim como os processos eleitorais e outras disputas, expressam lutas, constantes na história desse lugar denominado de “Brasil” em que sua população, sempre enganada e iludida, serve de manobra para “os serviçais do poder”, para respaldar os “novos” capatazes, aqueles que irão servir aos verdadeiros donos do poder, “a economia nacional” – que nunca foi sequer nacional.
É o que registra o historiador José Honório Rodrigues:
“As lutas que rompem a tradicional balança do poder têm sido travadas entre o governo formal, representativo de forças econômicas dominantes, e os grupos informais que desejam participar do poder e representar essas forças. O personalismo é expressão desta relação social, no fundo, uma herança colonial”.
Aí está a resposta à inquietação do senador Darcy Ribeiro quando, em entrevista à revista Veja, se surpreende com o destino do governo do presidente Fernando Collor de Mello, eleito pelos descamisados.
Diz Darcy, tempos atrás:
“Nós temos um presidente eleito pelos mais pobres, e que optou pelos mais ricos. Eu não apoiei o Collor, mas imaginei que aquele discurso dos descamisados fosse verdadeiro. Fiquei espantado quando ele se deixou rodear e dominar por um grupo de economistas xiitas, cuja característica principal é a insensibilidade social. E que não são brasileiros nem têm necessidades brasileiras. Estão com a cabeça feita lá fora e são de uma ousadia e de uma temeridade incríveis. É gente que não se preocupa com o milhão de desempregados”.
- A Nação Traidora. No “Brasil” existiriam duas nações. O entendimento da realidade por Justiniano José da Rocha que identifica no “Brasil” a existência de duas nações é o registro mais contundente da tragédia coletiva que se impõe e que se perpetua, pois desta realidade se extraem resultados concretos: lucros para o sistema financeiro. Hoje o grande controlador das riquezas.
E estas duas nações diversas são opostas e são inimigas, pois não há como ignorar o conflito que se mantém, justamente, no controle do poder. Justiniano fala em “classe destinada ao governo” que integraria a Nação A, o que na verdade não chega a constituir-se em classe, talvez um grupo, passível de substituição, onde prevalece a mentalidade burocrática do homem público servil.
São pequenos homenzinhos públicos, versáteis e capazes de usufruir de “pequenas corrupções”, da ilusão do poder – são histrionicamente dotados da fantasia do ator medíocre, pois muitas vezes acreditam que são mesmo O Ministro, O General e O Presidente.
Não o são; representam uma peça de duração efêmera. Jamais poderão acrescentar uma fala a mais nesse script, talvez apenas reclamar de público de um mal estar ou do tempero da salada.
Dentro destas duas nações diversas, a diversidade, a diferença estaria basicamente em quem governa e em quem é governado.
A Nação B seria aquela integrada, segundo Justiniano pela classe destinada “a ser governada”. Mais uma vez, ao introduzir o conceito de classe, para aqueles afastados do poder, para aqueles destinados a ser governados, reduz-se a dimensão e a magnitude destes controles: os destinados a ser governados são todos os outros que não estão no primeiro grupo. É, na realidade, toda a população, é o povo que, segundo Capistrano de Abreu:
“foi capado, isto é, sem voz, sem audiência, subjugado e sangrado, isto é, explorado, extorquido, esvaziado e atormentado”.
- Em sua primeira fala ao Senado, Darcy Ribeiro, ao analisar as raízes do atraso e identificar “como único fator causal inegável de nosso atraso é o caráter das classes dominantes”, afirma, categórico:
“O Brasil jamais existiu para si mesmo, no sentido de produzir o que atenda aos requisitos de sobrevivência e prosperidade de seu povo. Existimos é para servir a reclamos alheios. Por isso mesmo, o Brasil sempre foi, ainda é, moinho de gastar gentes. Nos construímos queimando milhões de índios. Depois queimamos milhões de negros. Atualmente, estamos queimando, desgastando milhões de mestiços brasileiros na produção não do que eles consomem, mas do que dá lucro às classes empresariais”.
- A ilusão secular. Um país que sobrevive como um sonho, uma ilusão de já dura 500 anos (GGGG). Nada há que o capte como realidade. Colocados na balança, o Brasil real e o Brasil ficção, podemos abstrair duas imagens.
Numa, o Brasil real detona. São muito tristes e dolorosas as nossas realidades e o registro histórico humilha, um “governo” que chega ao século XXI exercitando um genocídio silencioso e permanente contra sua população. Desequilíbrio total na balança. Consideraríamos o intangível como peso de balança, assim os sonhos e as utopias realizadas pelos brasileiros restam como certezas de que é possível construir uma outra realidade e até mesmo dar espaço, território e verdade a um país diferente: verdadeiro país, justo e humano, equilibrado e feliz.
- Paixão e povo. Toda a obra de Darcy, toda a sua vida, se tem uma palavra síntese, esta palavra é paixão. Grande sempre foi sua alegria e sua imensa paixão.
Se na paixão houve uma que se sobressaiu esta foi, sem dúvida, a sua paixão pelo povo brasileiro. Uma paixão cultivada, uma paixão racional, uma paixão extremamente consciente. Ele sabia em que terreno pisava. Nenhuma ilusão.
Para um homem com a sua inteligência e erudição, ele sabia que, entre as muitas razões, que davam sustentação à sua “estranha loucura” estava o Brasil que ele conhecia e que ele odiava, o Brasil falso, o Brasil desigual, o Brasil da elite corrupta e sanguinária, mas estava também um outro Brasil, o verdadeiro Brasil – só que ele sabia que este Brasil era um país sonhado, um país imaginado, uma imagem.
Daquele Brasil falso, daquele Brasil desigual, daquele Brasil que era uma farsa, Darcy extraia o povo e apontava para o seu povo alguns caminhos, como o mais aberto de todos, a educação, e o seu exemplo, a fé inesgotável nas pessoas, o carinho e a alegria, o continuar, o resistir, a luta permanente e contínua, o nunca desistir.
Um homem imbatível, ele quer o seu povo assim. Ele continuaria a criar este país mesmo quando distante dele, vivendo os dias de exílio, proibido de voltar. De volta, seria exuberante em sua produção e da sua vida brotariam muitas palavras, muitos livros, escolas e inúmeros exemplos para aqueles que queiram algum dia ser homens públicos e que acreditam que é possível forjar as bases de um verdadeiro país e de uma sociedade que elimine, de uma vez por todas, não apenas a desigualdade, mas a mais sórdida das explorações e que se sustenta pela imposição de uma linguagem sofisticada e suja, uma linguagem econômica e embrutecedora, uma linguagem de servos e de marionetes.
Ninguém amou mais o povo brasileiro e ninguém revelou mais o “Brasil” aos brasileiros do que Darcy Ribeiro. Amor deslavado, de declarações repetidas e de humor sensível, de quem dizia querer ser o imperador do Brasil. Revelações contundentes, sem medo e frente a frente com os poderosos – este é o conteúdo de sua Primeira Fala ao Senado.
O Brasil que ele amou não existia, existia apenas em sua imaginação – ele amava e muito o seu povo, o povo brasileiro e odiava a sua elite e todos aqueles que traem, permanentemente, este povo. O Brasil que ele revelava era o Brasil da injustiça, da desigualdade e da violência, o país real com todos os seus males, o país que não dá certo, que não dará certo e que terá que desaparecer do mapa. Há um país a ser derrotado e há um país a ser construído.
O que “existe” não vale nada, não vale um tostão furado.
* Rufino Fialho Filho é Jornalista
“A opinião de nossos colunistas, cronistas e comentaristas não expressão, necessariamente a opinião do jornal Diário de Minas”