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Dom Pedro II e a “Confederação dos Tamoios

Dom Pedro II e a “Confederação dos Tamoios

O autor desta obra, Visconde de Araguaia, em 1856, recebeu a solicitação de uma edição personalizada para o imperador. A obra tinha como objetivo se tornar um monumental documento

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29-08-2024 às 10h:10

Sérgio Augusto Vicente*

Em 1856, Domingos José Gonçalves de Magalhães, também conhecido como Visconde de Araguaia, publicou uma de suas obras mais conhecidas, "Confederação dos Tamoios". Diretamente financiada pelo imperador D. Pedro II, a obra tinha como objetivo se tornar um monumental documento de demonstração de “validade nacional” do tema indígena. Por meio dessa epopeia nacional pautada na representação dos indígenas como heróis nacionais e na busca de um passado comum para os brasileiros, tentava-se legitimar o projeto de construção de um mito nacional de fundação para o ainda “jovem” Estado-Nação brasileiro.

O autor nasceu em Niterói, em 1811, e faleceu em Roma (Itália), em 1882. Formou-se em medicina em 1832, mesmo ano em que também estreou com seu primeiro volume de versos. Em viagem a Paris, em 1833, estabeleceu contato com o romantismo francês, momento em que também começou suas aspirações à reformulação literária de seu país. Em 1836, em parceria com Sales Torres Homem e Manuel de Araújo Porto Alegre, fundou a revista "Niterói". Ainda em 1836, publicou "Suspiros poéticos e saudades", considerada obra inaugural do Romantismo no Brasil, na qual defendia a possibilidade de construção de uma literatura nacional, voltada à valorização da natureza e à maior liberdade de criação poética. Por isso, Magalhães é considerado um dos principais poetas da primeira geração romântica brasileira.

Em “Confederação dos Tamoios”, os indígenas foram representados a partir do modelo eurocêntrico do “bom selvagem”, inspirado em Rousseau, narrando a luta da denominada “brava nação Tamoio” pela liberdade contra os agressores portugueses. Após a obra receber críticas negativas de José de Alencar, o imperador, sob o pseudônimo de “O Outro Amigo Do Poeta”, escreveu artigo em defesa de Domingos de Magalhães no carioca “Jornal do Comércio”.

A Biblioteca do Museu Mariano Procópio possui um exemplar dessa obra. Porém, não se trata de qualquer exemplar, mas de um que possui elementos que o tornam extremamente raro: além do brasão imperial na capa e uma dedicatória impressa de José Gonçalves de Magalhães a D. Pedro II, este ainda contém um manuscrito original, a caneta, em que o mordomo da Casa Imperial solicita ao autor a remessa de uma edição especial do livro para o chefe do trono brasileiro.

Esse manuscrito, além de tornar essa obra extremamente rara e única, deixa-nos entrever a preocupação com a deferência e o valor simbólico do objeto a partir da sua relação com o monarca brasileiro. Toda essa narrativa que envolve a personalização de um exemplar confere ao referido item bibliográfico o status de obra rara, com grande relevância para a história do livro no Brasil e, especialmente, para as pesquisas referentes às coleções vinculadas à história da monarquia brasileira. Não por acaso, este exemplar da Biblioteca do Museu foi analisado e citado pela historiadora e antropóloga da USP, Lilia Moritz Schwarcz, em um de seus mais famosos livros: “As Barbas do Imperador”, que se debruça sobre diversas peças do acervo da instituição, que é um dos mais relevantes do país e de projeção internacional.

Se você está interessado em pesquisar na Biblioteca, nos Arquivos Histórico e Fotográfico e na Reserva Técnica da instituição, basta realizar a sua solicitação pelo e-mail pesquisamapro@pjf.mg.gov.br, através do qual lhe será enviado um formulário a ser preenchido com seus dados pessoais, seu tema de pesquisa e seus objetivos gerais.

O Museu Mariano Procópio é uma instituição que, desde 2023, está integralmente reaberta aos públicos, com três exposições (“Rememorar o Brasil: a Independência e a construção do Estado-Nação”; “Fios de Memória: a formação das coleções do Museu Mariano Procópio” e o museu-casa Villa Ferreira Lage), bem como um exuberante e amplo parque, com paisagismo construído, lago artificial com pedalinhos e trilhas.

*Transcrição do manuscrito mencionado no texto: “Mordomia da Casa Imperial no Rio de Janeiro, em 14 de julho de 1856.

Ilmo. e Exm. Sr.,

Havendo o Dr. Domingos José Gonçalves de Magalhães oferecido a Sua Majestade O Imperador o seu poema Confederação dos Tamoios, o Mesmo Augusto Senhor Dignou-se Mandar Fazer uma edição Sua, e me ordenou lhe enviasse o exemplar que a acompanha. Cumprindo esta Imperial Determinação tenho a satisfação de renovar os protestos de estima e consideração com que sou

De V. Exa..

Ilmo. Exmo. Snr. Conselheiro

Dr. Francisco Ignacio de Carvalho Moreira.

Mto. Atenciosamente Paulo Barboza de Sá."

*Sérgio Augusto Vicente é professor de História e historiador. Graduado, Mestre e Doutorando em História pelo PPGHIS/UFJF. Atualmente, trabalha no Museu Mariano Procópio – Juiz de Fora

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