A efemeridade, marca registrada dessa modernidade fluida, se manifesta na curta duração da satisfação proporcionada pelo consumo desenfreado. A alegria de adquirir o novo smartphone
11-01-2025 às 08h43
Raphael Silva Rodrigues*
A pedido da Dra. Yaçanã Eduarda da Cunha (vide referências: http://lattes.cnpq.br/7005863317757722 , amiga de “Casa de Afonso Pena” e estudiosa da Teoria da Justiça, fui encorajado a trazer novas reflexões decorrentes do modesto texto intitulado ‘Modernidade Líquida’, que foi publicado recentemente por esse prestigioso Diário de Minas (conferir: https://diariodeminas.com.br/modernidade-liquida/).
Na modernidade líquida de Zygmunt Bauman, as relações se diluem com a mesma velocidade com que novas necessidades são criadas. O efêmero governa absoluto, ditando comportamentos e moldando desejos. Em meio a esse turbilhão de sensações passageiras, o consumo se apresenta como ponto de salvação, prometendo a concretização da felicidade por meio da aquisição. Contudo, essa busca incessante por satisfação instantânea, materializada em produtos descartáveis e experiências superficiais, revela-se uma armadilha, aprisionando o indivíduo em um ciclo vicioso de consumo e frustração.
O indivíduo, apoiado na modernidade líquida, é bombardeado por um marketing sedutor e persuasivo, sendo induzido a acreditar que a posse do “próximo lançamento” ou a participação na “experiência da moda” são os ingredientes mágicos para alcançar a tão sonhada felicidade. Nesse contexto, a gratificação instantânea se torna o objetivo principal, relegando a busca por uma alegria genuína e duradoura a um plano secundário.
Em uma sociedade onde o “ter” se sobrepõe ao “ser”, a felicidade é frequentemente associada ao consumo, à posse do novo, do último lançamento. A lógica do mercado, implacável, alimenta essa busca frenética por prazeres superficiais e passageiros. Afinal, a felicidade efêmera é um produto altamente rentável.
A efemeridade, marca registrada dessa modernidade fluida, se manifesta na curta duração da satisfação proporcionada pelo consumo desenfreado. A alegria de adquirir o novo smartphone, por exemplo, se esvai rapidamente, sendo substituída pela ansiedade de adquirir o modelo mais recente, alimentando um ciclo interminável de desejos insaciáveis. Esse consumo voraz, além de gerar um vazio existencial, também contribui para a descartabilidade acelerada de produtos, impactando negativamente o meio ambiente e aprofundando as desigualdades sociais.
Bauman, em sua análise crítica da sociedade contemporânea, destaca a fragilidade dos laços humanos nesse contexto líquido. As relações interpessoais, assim como os produtos, se tornam descartáveis, facilmente substituíveis por novas conexões superficiais. Em busca de preencher o vazio existencial, o indivíduo se lança ao consumo desenfreado como forma de suprir a carência afetiva e a falta de sentido na vida. As redes sociais, nesse cenário, atuam como vitrine para a felicidade encenada, intensificando a necessidade de consumir para exibir uma vida aparentemente perfeita e invejável.
Por outro lado, a busca por uma felicidade sólida e duradoura se torna ainda mais desafiadora. A solidão e o vazio existencial, subprodutos dessa constante instabilidade, impulsionam ainda mais a busca por satisfação imediata, alimentando um ciclo destrutivo. Não se trata de um discurso contra o capitalismo, mas sim uma reflexão sobre o consumo exagerado em face da busca da tão almejada felicidade.
E será que é possível romper com essa lógica perversa que associa felicidade à posse material? A experiência e a maturidade nos ensinam que a verdadeira alegria reside na construção de relações sólidas, na busca por propósito de vida e no desenvolvimento pessoal. A felicidade autêntica, salvo melhor juízo, não se encontra nas prateleiras das lojas, mas sim na construção de um sentido para a vida que transcenda a efemeridade do consumo desenfreado.
*Raphael Silva Rodrigues: Doutor e Mestre em Direito (UFMG), com pesquisa Pós-doutoral pela Universitat de Barcelona, na Espanha. Especialista em Direito Tributário e Financeiro (PUC/MG). Professor do PPGA/Unihorizontes. Professor de cursos de Graduação e de Especialização (Unihorizontes e PUC/MG). Advogado e Consultor tributário.