
A dor de estar vivo é muito grande. Escrever é fácil, sentir é doloroso. CRÉDITOS: Divulgação
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26-02-2025 às 09h34
Daniela Rodrigues Machado Vilela*
O ano novo começa para grande parcela das pessoas no dia primeiro de janeiro. Mas, parte destas toma como parâmetro a data do próprio aniversário, outros, após o período de férias e, ainda outros tantos, só consideram que realmente o ano se inicia, após o carnaval. Há uma parcela, que nem acredita que algo comece, se inicie de fato, mas que tudo continue indefinidamente, que seja um continuum. Necessitamos de referências e as criamos de acordo com nossas preferências.
O passar do tempo parece estar mais rápido e as mudanças mais perceptíveis. A prática diária se apresenta por um acelerar constante. Todos, na pós-modernidade, necessitam trabalhar mais para dar conta dos boletos, filhos, afazeres diários, pois é tempo de múltiplas tarefas. Enfim, no contexto de uma rotina exaustiva, tudo exige um dedicar constante e incessante.
De outro lado, há uma necessidade e desejo de desacelerar, de ter tempo para o lazer, para estar com pessoas queridas, assistir um bom filme ou realizar tantas outras atividades. Há o sentimento de satisfação, o contentamento quanto se desfruta de momentos prazerosos. De outro lado, há o desejo de se estar sempre em busca de coisas “supostamente novas”. Ou seja, em cada fase de nosso viver, atravessa-nos um desejo em potencial. É da natureza humana buscar objetivos, potencializar projetos para serem desenvolvidos e realizados ao longo da vida.
Porém, é indispensável, ressignificar o conquistado, praticar a gratidão. Pressa não convém, imobilismo menos ainda. Há uma necessidade vital de respeitar o passo da vida. Encontrar equilíbrio, sobriedade, apreciar a caminhada. Compreender a transitoriedade de tudo. Dar uma pausa, observar, parar e possibilitar um estar em paz consigo.
O fracasso, muitas vezes, é questão de ponto de vista, pois nem tudo depende de força de vontade, há tantas variáveis atuando em um processo de conquista. Há muita aleatoriedade, jogos do acaso.
Dar segundo o seu merecimento é complexo. Punição para os maus e prêmios para os bons. Na realidade, a dosimetria de penas e castigos, muitas vezes, é matizada, nem sempre perceptível. Assim como a mistura de cores na arte, as características e atitudes são uma mistura de coisas boas e ruins. Luz e sombra representam aspectos não só para a pintura, mas para os dias de vida de qualquer indivíduo. Todos os seres têm seu lado bom e mau. Cabe-nos alimentar as coisas boas e reprimir a maldade, inveja, maledicência, ira e assim por diante.
Conquistas são indicadores de felicidade? Eu diria que nem sempre. Ter sucesso profissional, cargos, posses materiais não substitui ter valores como justeza, honestidade, serenidade e outros.
Expectativas irreais são dolorosas. Quais valores pretendemos possuir e cultivar? Claro que dinheiro e conforto material são ótimos e até indispensáveis, complementam a vida, concedem maior tranquilidade, mas passam longe de bastar.
Enfim, todos pretendem ser aceitos, apreciados e respeitados. Porém, imperfeição e impermanência são palavras de ordem de quem vive. A dor de estar vivo é muito grande. Escrever é fácil, sentir é doloroso. Tudo tem início, auge e decadência. Ou seja, começo, meio e, por fim, decrepitude.
Aprenda a ser generoso consigo e com os demais, seja resiliente. Não permita que a dor o impossibilite de sonhar, dê espaço e tempo para os aprendizados.
Não obstante, receita para um viver bem, não existe, o que funciona para um, não necessariamente funcionará para todos, mas há indicativos e caminhos em que o proveito parece ser maior. Por exemplo, perseguir e realizar coisas boas, atitudes honestas, ter bom caráter, humanidade e solidariedade só faz bem. Praticar maldades, por outro lado, só lhe trará atrasos.
A parábola do semeador na Bíblia, conta que foram semeadas diversas sementes e que cada uma caiu num terreno com alguma particularidade. Umas em terra boa, fértil, outras, em terreno infértil e algumas pelo caminho. Ou seja, efeitos diversos são alcançados também nas pessoas de acordo com a disposição de cada um.
Assim, na vida, semeia-se para aumentar as chances de colheita. Certeza de que seja boa, proveitosa, não há. Mas, se não houver plantio, então é que não há chance nenhuma de colher. Portanto, o que resta é arriscar, dar chance para que as coisas deem certo em algum momento.
Se o ano para você já começou ou ainda vai começar, o importante não é a rapidez para chegar logo, mas seu olhar apreciando o trajeto. A vida é breve, imprevisível, mas pode ter belezas sutis que passam despercebidas. É preciso aguçar o olhar e valorizar as pequenas experiências. Como sugestão, celebrar as pequenas coisas cotidianamente.
As vitórias são circunstanciais. No final, todos morremos, mas todos os outros dias vivemos. Mãos-a-obra: é tempo de realizar, observar, valorizar e acima de tudo viver. Vamos lá, seja lá como for, é tempo de recomeços. Lembre-se caro leitor: a vida se faz nos detalhes, é por meio deles que realizamos coisas realmente significativas!
* Daniela Rodrigues Machado Vilela é Doutora, Mestra e Especialista em Direito pela UFMG. Residente Pós-doutoral (UFMG / FAPEMIG). Professora convidada no PPGD-UFMG. Pesquisadora com ênfase em Filosofia, Trabalho e Linguagem. Diletante na arte da pintura.