
“O Olho Que Tudo Vê”, semelhante ao “Olho de Hórus”, que representa o deus do céu, da guerra e da caça, mas que, também, está ligado a proteção, poder real e boa saúde. CRÉDITOS: Divulgação
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24-03-2025 às 10h07
Caio Brandão*
O sol ainda não tinha abraçado o conjunto de prédios conhecido como Zhongnanhain, situado a oeste da Cidade Proibida, em Pequim, e Xi Jinping, secretário-geral do Partido Comunista, encontrava-se entregue a rotina de afazeres. Xi reside nesse conjunto, que além de abrigar parte da administração pública e a do Partido, acolhe funcionários do alto escalão, inclusive o seu líder maior, responsável por gerir o país.
Xi Jinping, que acumula o cargo de Presidente da República Popular da China, ocupa pequeno apartamento funcional, com três quartos e uma suíte, dois banheiros de uso comum, duas salas, sendo uma para refeições, espaço de trabalho, serventia destinada às atividades domésticas, varanda voltada para o nascer do sol, e não dispõe de acomodações para criadagem.
O desjejum lhe foi oferecido às cinco da manhã pela esposa, Peng Liyuan, que atuou como cantora de ópera e ainda se dedica a pesquisas da cultura asiática. Sua única filha, Xi Mingze, apelidada de Xiao Muzi – Little Wood, em tradução livre, ou, ainda, “Pequena Notável”, em português -, está com trinta e dois anos de idade e leva vida discreta. É versada no idioma francês e no ano de 2010 matriculou-se na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, sob pseudônimo, tendo se graduado em psicologia. Segundo uma congressista americana, Xiao Muzi teria dado prosseguimento aos estudos, nos Estados Unidos, onde ainda reside e se mantém sob rigoroso recato social, mantendo as cautelas de estilo e evitando chamar atenção sobre si. O FBI sabe disso e a protege, coisas da política.
Na pequena mesa redonda, coberta com toalha adornada com desenhos de bambu e alguns elementos sofisticados, em tons pastéis, uma pequena travessa, de mingau de cor amendoada e feito à base de arroz, legumes e ovos, e um bule de chá verde. No centro da mesa uma cesta de pãezinhos cozidos no vapor, recheados de carne moída e acrescidos de tempero tradicional chinês, e ao lado uma travessa de cor azul, com motivos de dragões e contendo caldo com bolinhos de carne de porco. O desjejum, oferecido em porções minúsculas, mas suficientes, é prática cotidiana na casa onde reside o segundo homem mais poderoso do planeta.
Após o desjejum, Xi Jinping, caminhando sobre tapetes artesanais de lã de alta qualidade, com desenhos florais e feitos à mão por artesãos da região de Xinjiang, segue para a pequena varanda, onde executa, por vinte minutos, exercícios de Tai Chi Chuan – “arte marcial milenar chinesa, que combina movimentos lentos e fluidos, com técnicas de meditação”. Peng Liyuan, a esposa, estimula Jinping a dar ênfase a exercícios respiratórios e a dobrar os joelhos, repetidas vezes, para fortalecer os ligamentos das dobras das pernas, que já contam 71 anos de idade.
Às cinco horas e trinta minutos, descendo por elevador quarenta andares chão adentro, no subsolo do complexo de Zhongnanhain, Xi mantem o semblante circunspecto e traja terno escuro e camisa social branca, muito bem passados, e calça sapatos de couro na cor preta. Não usa gravata, e daria preferência ao traje tradicional chinês, conhecido como “terno Mao”, que tem modelo inspirado nas roupas tradicionais da nacionalidade, mas se submete aos protocolos do Partido.
Às seis horas, Xi está sentado em sua cadeira de trabalho, com recosto feito de “rattan”, material flexível e durável, que permite a circulação de ar, além de promover a postura correta. A sala é redonda, ampla, e a sua cadeira giratória.
Nas paredes, em série, telas enormes de computadores de última geração, que rodam programas desenvolvidos por consórcio formado pelas empresas “Tencent”,” Alibaba Group”, “Huawei”, “Baidu” e “JD. Com”, empresas de fundamental importância no desenvolvimento tecnológico chinês, e que também executam trabalhos mediante contrato com o Partido Comunista, sob rigoroso controle e absoluta reserva, quanto ao desenvolvimento de programas ultrassecretos.
Na sala ao lado, sob proteção de paredes espessas feitas de material isotérmico de alta resistência, ficam instalados os computadores de última geração, máquinas de alta complexidade, os chamados computadores quânticos, que operam sob baixíssima refrigeração, em torno de duzentos e setenta graus centígrados negativos, alcançados pelo uso de nitrogênio e de hélio líquidos.
Xi Jinping troca palavras com assessores, declinando frases curtas e objetivas, e recebe posto na sua cabeça, capacete de cor cinza, com detalhes em branco e vermelho, conhecido como “O Olho Que Tudo Vê”, semelhante ao “Olho de Hórus”, que representa o deus do céu, da guerra e da caça, mas que, também, está ligado a proteção, poder real e boa saúde.
Curiosamente a nota de um dólar também apresenta impressa uma pirâmide, com o desenho de olho no seu interior, figura que tem a ver com “O Olho da Providência”, que retrata a onisciência de Deus e a sua capacidade de tudo ver.
O capacete, peça única e mantido sob severa guarda e vigilância extrema, foi desenvolvido à sombra de computador quântico, que o alimenta através de inteligência artificial levada a extremos, com o poder de oferecer informação, análise e sugestão de tomada de decisão próximos do infinito e com capacidade de acerto impressionante.
Xi Jiping recebe medicação específica e cátodos fixados em partes do seu corpo, sendo vários na cabeça, e os outros para controle da pressão arterial, batimentos cardíacos e rigorosa observância do comportamento dos fluxos neurais de seu cérebro, com informação precisa sobre a atividade elétrica e química, que ocorre entre os neurônios e as células do sistema nervoso.
Findos os procedimentos iniciais, Xi Jiping passa a interagir com as máquinas, recebendo milhares, senão milhões de informações compactadas em blocos, com prioridade para questões urgentes, sejam domésticas ou relativas a qualquer outro país.
Na retaguarda encontram-se quarenta mil terminais de computador, instalados em locais públicos, privados, secretos e ultrassecretos, que recolhem informações de várias partes do mundo, em tempo real para alimentar o sistema e que são colhidas também por satélites e a invasão de câmeras de vigilância, televisores, terminais de computador privados e telefones celulares.
As informações chegam filtradas e selecionadas por depurada seleção, prontas para submissão à decisão final de Xi Jinping, que tem a compreensão dos problemas otimizada por nutrientes sônicos imperceptíveis.
Finda a sessão, que dura em média 60 minutos, Xi Jiping vai ao banheiro, lava o rosto, toma um suco de laranja na pequena saleta de espera e segue para uma das alas reservadas ao Partido Comunista, para a agenda diária com os seus dignatários mais importantes.
Na pauta do dia a formação de oito milhões de engenheiros por ano, versados em no mínimo três línguas estrangeiras; os estudos para a simplificação do idioma chinês, face à demanda internacional e o financiamento de milhões de hectares de plantio de grãos no continente africano e a extração de minério e petróleo nessas terras.
Ainda, a produção em escala progressiva de carros elétricos; a exportação maciça, para ao mundo, a preços competitivos, de toda a linha de eletroeletrônicos conhecida; a exploração de jazidas de lítio no Brasil e o avanço da conquista do espaço, inclusive com a instalação de milhares de placas de coleta de energia solar no espaço sideral. Da agenda constam, ainda, a logística de recrutamento, seleção, capacitação, alimentação, transporte e motivação de dois milhões de soldados profissionais, nas três forças, além do incremento da produção de armamento sofisticado, de terra, mar e ar, e a multiplicação de bases terrestres de lançamento de mísseis balísticos intercontinentais.
O temário do dia finaliza com referência ao Donald Trump e aos seus destemperos e falatórios sobre invadir isto e aquilo, decidir por este ou por aquele país, sem consultar os interessados, aumentar taxas e impostos, distribuir mimos e afagos ao presidente Russo, Wladimir Putin, além de reforçar a autoestima e o orgulho dos americanos, com promessas extravagantes.
Xi Jiping fitou os seus pares, tomou um gole de chá verde, comeu dois bolinhos de arroz e disse:
- Temos registro documentado dos últimos mil, duzentos e cinquenta anos AC, da história de nosso país, desde a Dinastia Shang, e ainda mantemos vínculo com o confucionismo e o taoísmo. Um tem foco na moralidade, ordem social e relações humanas, e o outro foca a busca da harmonia com o Tao, a força fundamental que permeia o universo e nos permite agir em sintonia com o fluxo natural das coisas. Trump é um neófito afoito e tem muito a aprender. Ele passará, como tantos passaram, e a China continuará a expandir o seu crescimento econômico, a suprir as necessidades de seu povo, e a manter no mundo a posição de equilíbrio de forças que vem sustentando. Mas, ponderou, estamos preparados para tudo, concluiu.
- Presidente! Aparteou um ilustre membro do Partido Comunista Chinês, que tem 95 milhões de inscritos:
- Aquele vídeo do Trump ajoelhado, em seus aposentos, fazendo movimentos erráticos, que circulou informalmente no Partido é real, ele surtou, está com algum problema de saúde? – Sim, respondeu Xi, é real, mas nada sério. Um dos nossos satélites capturou a cena do Trump de joelhos, em trajes íntimos, com chinelo na mão, tentando matar uma barata, que invadiu o seu quarto de dormir. Trump tem aversão a insetos, que o tiram do sério. Um simples carrapato pode levá-lo a esmagar com as mãos o saco escrotal e a demitir milhares de servidores públicos, ou a ofender o líder de outro país. – E aquele assessor bilionário, que tem quatorze filhos, com quatro mulheres, oferece algum perigo?
- Por enquanto, não, respondeu. É apenas um ganhador de dinheiro, criativo e que sabe aproveitar oportunidades. Contudo, tem inteligência efervescente, e pode tornar-se perigoso se trocar a sua atividade testicular exacerbada, para entreter-se com projetos militares e ambições de conquista expansionista.
– Aguardemos, falou enquanto se afastava em direção a bebedouro, contendo água temperada com essências naturais e aromáticas.
* Caio Brandão é jornalista. Contato: caio.brandao@uol.com.br