Alguém imagina como repercutirá, na campanha, discursos e notícias sobre o corte de investimentos em saúde e educação, previdência, trabalho e empresa, desenvolvimento social e…
14-11-2024 às 08h:02
Rogério Reis Devisate*
Quem não se lembra das passeatas de 2013, que mobilizaram o Brasil? O povo estava nas ruas, sem bandeiras partidárias, pedindo mais investimentos em saúde e educação, protestando contra os elevados gastos com a construção de locais para a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas, querendo mais segurança e mais transporte e a suspensão do aumento das tarifas de ônibus.
As passeatas demonstraram o acerto do pensamento de Ulisses Guimarães, para quem os políticos temem o povo nas ruas.
Uma década depois, vemos o Governo Federal discutir o corte de gastos e focar em algumas áreas e Ministérios, falando-se que deve atingir a saúde, a educação, a previdência social, o desenvolvimento social e o trabalho e a empresa. Mais: também há a possibilidade de alcançar o Ministério da Defesa, o que pode envolver tanto o corte de investimentos quanto as despesas com a folha de pagamento dos ativos e inativos.
O pacote econômico está sendo preparado e será submetido ao Parlamento, inclusive com parte que envolve nova proposta de mudança no texto constitucional, via PEC – Proposta de Emenda à Constituição, objetivando a revisão dos gastos obrigatórios. Passará, também, pelo crivo do povo.
As contas vêm sido comprometidas há tempos. Apesar da arrecadação significativa, os gastos públicos aumentam. O FMI – Fundo Monetário Internacional piorou a sua projeção sobre a dívida nacional do Brasil, apontando que deve chegar a 87,6% em 2024 e a 97,6% em 2029 (ou seja, quase 100%)!
Não se pode deixar de lembrar o que ocorreu em França há poucos séculos, quando, diante dos elevados gastos, o Rei Luís XVI convocou o seu Ministro das Finanças, Jacques Necker, para sanear os combalidos cofres franceses. Como a tradicional fórmula de aumento de tributos seria impossível, o jeito foi reunir as 3 classes: a igreja, a nobreza e o povão (burguesia e povo). Sabemos que as coisas correram bem e que o povo foi para as ruas, iniciando a Revolução Francesa que, dentre outros efeitos, ocasionou a decapitação do Rei e da Rainha Maria Antonieta, deixou famosa a guilhotina e gestou Napoleão.
Voltando ao pretendido corte de gastos do governo, neste planejamento em andamento, reflitamos como será a campanha presidencial de 2025.
Alguém imagina como repercutirá, na campanha, discursos e notícias sobre o corte de investimentos em saúde e educação, previdência, trabalho e empresa, desenvolvimento social e talvez a folha de pagamento de ativos e inativos no Ministério da Defesa (Exército, Marinha e Aeronáutica)?
Como será a reação do povo quando se rememorar de que, há cerca de uma década, ali, em 2013, foi para as ruas levantando bandeiras sociais importantes, inclusive por aumento de investimentos em alguns desses setores, agora possivelmente cortados?
Como saímos das passeatas de 2013 para essa situação de 2024, de corte em despesas que foram bandeira de muitos, quando as ruas estavam tomadas de gente?
É crível que as medidas podem impactar de início – e ter essa repercussão negativa nas eleições vindouras – mas não serão hábeis a frear as pressões por oscilações ascendentes das despesas públicas no ano eleitoral. Pensar o contrário é ir contra o senso comum – ainda que a realidade fosse outra, é a expectativa das obras inauguradas e medidas afins que ficam na cabeça do eleitor, em todo ano eleitoral.
Se os freios pretendidos forem eficazes, ótimo. No entanto, embora montanhas sejam movíveis pela crença, essa imensa montanha, com altos, agudos e cortantes cumes, formada por gastos e despesas seculares, não vai ser movida sem grande esforço, com muito suor e, quiçá, n`alguns setores, lágrimas e ranger de dentes.
*Membro da Academia Brasileira de Letras Agrárias, da União Brasileira de Escritores e da Academia Fluminense de Letras. Presidente da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da UBAU. Membro da Comissão de Direito Agrário da OAB/RJ. Defensor Público/RJ junto ao STF, STJ e TJ/RJ. Autor de vários artigos jurídicos e dos livros Grilagem das Terras e da Soberania.