Só Alá na Causa - créditos: divulgação
02-11-2025 às 12h40
Solange Mendes*
Minha mãe teve três maridos, e quando se foi, o namorado que era 40 anos mais novo que ela, ficou na saudade. Era uma mulher sabida, tinha a idade de quem estava perto e, na maioria das vezes, eram bem novas. Sempre gostou de viajar para qualquer lugar e compreendia qualquer tipo de viver. Cuidava dos bichos achados na rua, como cuidava das pessoas, e qualquer dia ou hora, tinha sempre um prato de comida e uma cama limpa para quem precisava.
Se minha mãe estivesse aqui, iria fazer 84 anos em maio. Não sei como seria, das duas uma, ou ela tinha mudado pro Iraque (lá nenhum parente ou conhecido iria) ou estaria tão plastificada que ia ter que usar um crachá, senão, ninguém ia imaginar que ela era ela… Era tão vaidosa e tinha tanta birra de envelhecer, que um dia ela ia acabar ficando mais nova que a neta, porque das filhas, já era há muito tempo….
Um dia, no meu aniversário, ela ligou para me dar os parabéns, me cumprimentou toda alegre, pediu a Deus por mim e no final perguntou quantos anos eu estava fazendo, quando eu falei 45, acabou a festa. Ela disse que era mentira minha, que quem tinha 45 era minha irmã mais velha, que na verdade é dez anos mais velha do que eu. Aí ela falou que estava com as panelas no fogo, tinha que desligar…
Mais tarde essa minha irmã me telefonou, para me parabenizar e falou que mãe tinha ligado pra ela, e perguntado a sua idade. Quando ela falou que tinha 55 anos, minha mãe disse que estava com as panelas no fogo, desligou e minha irmã não entendeu nada. Mas eu entendi e rimos muito, ela não gostou de ter filhas com as nossas idades, pois na verdade o que ela queria mesmo, era queimar nossas línguas, idades e certidões, pois isso afirmava os anos que ela não queria ter.
Um dia ela ficou toda feliz, pois eu falei que se tirasse na loteria, ia presenteá-la com uma plástica. Foi a melhor promessa que alguém lhe fez!
Hoje, com os meus cinco netos na idade que estão, e com dois bisnetos, não sei como ela ia encarar essa de ter trineto. Como seria, o que diria, vai saber …
Só sei que de tanto conviver com essa vaidade, também já estou começando a me preocupar. Há pouco tempo entrei na livraria Van Damme a procura de um livro sobre o islamismo. O proprietário, meu amigo, não gostou muito, quando eu falei que ia me converter, falou que me considerava moderna, e não acreditava que eu ia dar um passo atrasado. Quando falei que a intenção era mesmo esconder o rosto pra me livrar de uma plástica futura por causa das rugas, ele achou graça, e enchendo a minha bola, falou que eu ia demorar a precisar disso…
E como minha mãe, que se estivesse aqui, teria os cabelos lisos e negros, só escova definitiva, e se bobeasse, já teria feito uns preenchimentos e colocado silicone em pontos estratégicos, se a coisa ficar muito feia, vou radicalizar.
Se um dia eu passar a usar burca, não pense que é porque aumentou a minha fé em Alá, é que para não ficar enrugada como um maracujá maduro, prefiro pintar os olhos de lápis preto, parecer misteriosa e continuar passeando pela vida, só com eles de fora!
*Solange Mendes é Colunista, Cronista do Diário de Minas

