
Esquadrão anfíbio da marinha do EUA corta o mar do Caribe próximo à Venezuela com 4 mil militares - créditos: divulgação
24-08-2025 às 08h48
Rogério Reis Devisate (*)
Após oferecer recompensa de 50 milhões de dólares (algo como 275 milhões de reais) pela captura do presidente venezuelano Nicolas Maduro, sob o argumento de luta contra o narcotráfico, os Estados Unidos mobilizaram frota naval com destino à Venezuela.
Em meio a tantas outras surpresas advindas de posturas adotadas pelo presidente Trump, essa mobilização altera substancialmente o cenário regional e global e coincide, também, com as reivindicações imperialistas da Venezuela, que avança sobre o território e o petróleo do Equador, na rica região de Essequibo.
Não sejamos inocentes a ponto de ignorar a cobiça de muitos sobre a imensa riqueza petrolífera existente na Margem Equatorial, que até é capaz de transformar o Amapá na “Dubai brasileira” e que, curiosamente, não está sendo explorada pelo Brasil – seja por questões políticas, seja por entraves de licenciamento ambiental, seja por decisão judicial liminar em feito ajuizado pelo Ministério Público Federal.
Podemos não estar correndo para explorar essa riqueza, mas o mundo está observando tudo de perto… e, convenhamos, a verdade é que riqueza enterrada não serve de nada.
Todos os tesouros do mundo só foram vistos como tal após ingressarem na cadeia econômica. Enquanto eram promessa de riqueza, de nada serviam. Nesse rumo, o nosso petróleo está lá, tão encapsulado e guardado e protegido, que nem nós o exploramos. Ora, quem não cuida, perde!
Enquanto não nos apossamos, com atos concretos de exploração, apenas o deixando lá, intocado e guardado nos seus depósitos naturais, esse petróleo estará sujeito à cobiça estrangeira e a ingressar na alça de mira dos elevados propósitos exploratórios das grandes empresas mundiais do seguimento.
Dizer que isso é impossível de ocorrer é rasgar os livros de história. Sugerir que o mundo mudou é ignorar que a humanidade continua a agir como sempre agiu. A turma do “deixa estar para ver como ficará” nada fará se o caldo engrossar e poderá ser tarde demais se continuarmos a fazer de conta que nada está a ocorrer.
Não é aqui, evidentemente, o local e o espaço para se debater geopolítica ou se alongar na história e nos fatos havidos. Todavia, o petróleo esteve como pano de fundo de praticamente todos os grandes conflitos militares no Século XX e tende a estar no Século XXI. Também é inegável que o Oriente Médio tem o seu petróleo sob o jugo exploratório de grandes trustes internacionais e que, politicamente, a região foi dividida, para ser enfraquecida.
O mundo ainda depende enormemente dessa fonte energética e ninguém pode abrir mão de energia, notadamente nestes tempos em que se prevê disputas entre os EUA e a China e tantos países em torno da liderança envolvendo a Inteligência Artificial – que demanda muito consumo energético e se fala, até que precisará de um aumento na oferta de cerca de 165%!
Portanto, seríamos inocentes se achássemos que essa movimentação da frota americana estaria apenas focando no narcotráfico internacional e na chefia de governo da Venezuela.
Ousaria dizer que o jogo é multifacetado e, também, pesado. Não foi à toa que Nelson Rockfeller veio ao Brasil quando Getúlio cuidava da criação da Petrobrás, pois é óbvio que isso afetaria os negócios das indústrias petrolíferas da família…
O nosso Pré-Sal, objeto de tanta ansiedade como a salvação do país, está sendo explorado, mas não por nós, exclusivamente, já que dessa atividade participam a Shell (anglo-holandesa), a CNPC (Corporação Nacional de Petróleo da China ou China National Petroleum Corporation) e a Total (francesa).
Como se vê, o tabuleiro exploratório é de poucos – porém poderosos – jogadores e os EUA querem o seu lugar nobre, à mesa.
Pode ser que esta nossa análise passe longe do alvo, embora haja grande possibilidade de acertar na mosca, em razão dos ativos petrolíferos venezuelanos – os maiores do mundo – e do que há nas margens do Equador e na costa do Amapá.
Nem o presidente daquele país ou o narcotráfico mobilizariam, à luz do dia e sob o radar dos satélites globais, uma frota de navios de guerra. Não se age tão abertamente e com todas as cartas na mesa. O jogo costuma ser mais discreto, manipulado e não declarado. Aliás, muitas vezes se faz o oposto do que se diz.
Este deslocamento estratégico soa como tendo outro propósito, alvitrando lançar âncoras de potentes vasos de guerra numa região que cresceu muito em valor geopolítico e financeiro.
A propósito, se os navios ficarem ali, quem os tirará?
Demonstração de força atrai reação. O teorema de Tucídides, o grande general da Guerra de Peloponeso, se faz presente mais uma vez e cobra a conta dos poderosos de plantão. Quando uma potência ameaça e se vê ameaçada por outra, a tendência é a tensão subir, se espraiar, aumentar os gastos militares e os acordos e tratados de ocasião.
Por fim, os jornais indicam que Maduro mobiliza 4 milhões e meio de milicianos, para proteger o país contra os EUA. Essa notícia surpreende, por três motivos.
Em primeiro lugar, fica claro que Maduro tem milicianos “de esquerda”. Isso é algo bem interessante de se notar, na medida em que há tendência nacional de se associar os milicianos a algo próprio da direita.
Outra questão relevante diz respeito à quantidade de milicianos de que disporia o regime venezuelano, pois quatro milhões e meio de pessoas armadas é número muito elevado e que parece ter maior impacto diante de uma população de apenas 28 milhões. Assim, teríamos uns 15% da população armada e se portando como milicianos…
O terceiro motivo é o indicativo de que a ordem interna estaria afetada, porquanto as forças armadas daquele país teriam apenas 109 mil militares ativos… Ou seja, as forças armadas estariam subjugadas diante do muito maior número de milicianos de esquerda.
Outra análise pode concluir que o regime estaria prestes a jogar essa parcela do povo como escudo protetor… sendo, portanto, dispensáveis e descartáveis, ante inimigo poderoso.
Que o desfecho de tudo isso seja o melhor possível: mais saudável para a população civil e mais harmônico para a região e os países vizinhos e que comecemos, concreta e efetivamente, a explorar aquele petróleo, fixando o fato consumado do nosso domínio e utilização daquela fonte energética.
(*) Rogério Reis Devisate é membro da Academia Brasileira de Letras Agrárias, da União Brasileira de Escritores e da Academia Fluminense de Letras. Presidente da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da UBAU. Membro da Comissão de Direito Agrário da OAB/RJ. Defensor Público/RJ junto ao STF, STJ e TJ/RJ. Autor de vários artigos jurídicos e dos livros Grilagem das Terras e da Soberania. Colunista do Diário de Minas