29-12-2024 às 10h00
Bento Batista*
Como fotógrafo de profissão, ele fotografou “Juquinha”, o lendário andarilho da Serra do Cipó, chamado José Patrício – Juquinha das Flores tratado. Personagem simples que até ganhou escultura feita pelas mãos da artista Virginia Ferreira, plantada em um dos lugares mais aprazíveis da exuberante Serra do Cipó, na Região Metropolitana, um dos pontos mais abençoados do planeta, a 100 quilômetros de Belo Horizonte.
Figura despojada, miserável até, “Juquinha” às vezes era visto subindo ou descendo a estrada, quando nem asfaltada era. Dele contam histórias estapafúrdias, como ter sido picada por cobra mais de 100 vezes e ter morrido e ressuscitado outras tantas.
Para sobreviver, o homem vendia buquês de sempre-viva, uma florzinha típica da região do Maciço do Espinhaço, que se inicia na Bahia, passa por Diamantina, Grão Mogol, Serra do Cipó, até Belo Horizonte, onde ganha a denominação de Serra do Curral.
O autor da foto de “Juquinha” é o fotógrafo Alberto Lume.
“Juquinha” tinha bócio, vulgarmente chamado “papo”, mal comum nos tempos de antigamente, por carência de iodo. Depois que passaram a colocar iodo no sal, a incidência de bócio se foi reduzindo até quase zero.
Alberto Lume é um dos poucos sobreviventes da exposição de obras de artistas na Praça Savassi, nas manhãs/tardes de sábado. A Savassi mudou muito nos últimos anos. Em virtude do surgimento dos shopping-centers, a região andou perdendo o seu glamour.
As livrarias da Rua Fernandes Tourinho mantêm o lume da intelectualidade, enquanto o comércio tradicional da área vive dias de incertezas.
O escritor Roberto Drummond e a poetisa Henriqueta Lisboa, tornados bronze espiam impassivelmente as transformações da Savassi, enquanto o tempo passa pelas imagens deles.
O fotógrafo Lume resiste, com mais de meio século de profissão, ele e alguns poucos. Chapéu mergulhado na cabeça, barba grande – poderia, nessa época, fazer o papel de Papai Noel, não fosse sua performance esguia; teria de fazer enchimento no abdômen, o que não seria difícil. Ele ri, com um copinho descartável na mão.
Como fotógrafo, registrou para a posteridade, além de Juquinha e um dos pés dele, com a surrada sandália de dedo, o Pirulito, quando foi retirado da Praça Sete e levado para a Savassi. Lume retratou também o grande Grande Otelo. Entre as fotos dele há muitas consideradas relíquias, como o Viaduto Santa Teresa, no final da década de 70. Lume é fotógrafo do tempo.
*Jornalista