O personagem se tornou verdadeiro símbolo da cultura pop brasileira, ganhando campanhas em forma de desenhos animados e outros personagens que passaram a compor a família gotinha
02-01-2025 às
Adriano Augusto Dias de Souza*
Você sabia que no fim de 2024 o Zé Gotinha completou 38 anos?
O carismático personagem criado pelo cartunista Darlan Costa, mineiro de Coromandel, ganhou vida em meados da década de oitenta. A pedido do Ministério da Saúde, que na época estava sob a chefia de Luiz Carlos Borges da Silveira, a escolha do
nome do personagem foi fruto de um grande concurso em nível nacional que ocorreu entre alunos das escolas. O objetivo era envolver os pequenos e trazer um encantamento do público infantil para a temática da imunização, tornando o dia de
vacinação um momento descontraído.
Inicialmente a utilização do Zé Gotinha junto à população agregava as múltiplas estratégias de imunização que almejavam a meta de erradicar a poliomielite em território nacional, alvo que foi alcançado em 89. A “gotinha” que nomeia o Zé decorre
da forma com a qual o processo para a imunização da poliomielite se dava: Vacina Oral contra a Paralisia Infantil (VOP). Entretanto, a figuração do Zé Gotinha não parou por ali, seu sucesso segue sendo aliado importante do Plano Nacional de Imunizações (PNI)
até os dias de hoje. O personagem se tornou verdadeiro símbolo da cultura pop brasileira, ganhando campanhas em forma de desenhos animados e outros personagens que passaram a compor a família gotinha, além de ser incentivador de outros temas de saúde pública, como a amamentação infantil.
Nos últimos anos, devido aos desincentivos públicos à vacinação pelos quais passou o Brasil, envolvendo pronunciamentos do ex-presidente Bolsonaro, dentre outras personalidades dos campos político e artístico, as aparições do Zé Gotinha diminuíram
bastante. O que diminuíram muito, também, foram as taxas de vacinação da população como um todo, de forma especial o público infantil. Estudos indicaram que, em 2019, sete das nove vacinas indicadas para bebês tiveram taxas de cobertura aquém do
preconizado pelo Ministério da Saúde. Em 2021 o Brasil chegou a sua pior taxa histórica de imunização dos últimos 20 anos. Importante ressaltar o quão imprudente é utilizar temáticas de saúde pública, como a vacinação, para realizar embates políticos,
negando a própria ciência em detrimento de convencimentos pessoais sobre a eficácia dos imunizantes. Em 2021 o Zé Gotinha chegou a ser chamado em plena campanha política entre Lula e Bolsonaro, Lula indagou “cadê o Zé Gotinha?”.
Em novembro de 2024, por determinação do Ministério da Saúde, a vacinação infantil para a poliomielite deixou de ser aplicada via VOP e passou a ser substituída pela Vacina Inativada Poliomielite (VIP), que é injetável. Em meio a recente politização pela qual o Zé Gotinha e a vacinação passaram, surgiram também boatos de que o personagem deixaria de ser utilizado. Pois, passado o pleito e com a vitória do presidente Lula, o Zé Gotinha voltou a aparecer com maior frequência e, juntamente, as taxas de vacinação deram indícios de melhoria. Prova disso é a recente recertificação
da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o Brasil como país livre do sarampo: fruto de ações dos governos de incentivo pela vacinação e muito trabalho dos agentes de vigilância e atenção em saúde pública.
Os desafios da imunização no Brasil seguem pungentes, exigindo muito da resiliência da Administração Pública, dos serviços de saúde e dos profissionais. Com toda certeza o Zé Gotinha segue como parceiro nesta batalha. As aparições do Zé não só em dias de vacinação podem servir como um incentivo à memória dos brasileiros para reforçarem este compromisso com a saúde das crianças e também dos adultos. Para os gestores públicos, fica a dica da retomada da utilização deste que já está há quase 40 anos no imaginário do povo lutando contra as doenças que assolam a população.
- Adriano Augusto Dias de Souza Cientista do Estado e Epidemiologista