
Pastoral de Favelas têm sido protagonistas ativos na defesa dos direitos dos moradores das comunidades. CRÉDITOS: Divulgação
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08-04-2025 às 09h46
Claudio Siqueira*
- O que é a Teologia da Periferia
Nas entranhas das comunidades esquecidas, nasce uma teologia encarnada na realidade do povo. Não se trata de uma elaboração acadêmica distante, mas de uma fé vivida e construída no cotidiano das ruas, das lutas por sobrevivência e dignidade. Essa teologia não busca adaptar-se aos moldes tradicionais, mas propõe uma ruptura com estruturas opressoras, resgatando a essência comunitária e solidária das primeiras comunidades cristãs.
- Avanços e resistências
Mesmo enfrentando resistências, a Teologia da Periferia tem avançado como resposta às contradições sociais e religiosas. Movimentos como a Pastoral de Favelas têm sido protagonistas ativos na defesa dos direitos dos moradores das comunidades, promovendo uma fé que se traduz em ação transformadora. A Pastoral, surgida no fim da década de 1970, desempenhou papel central na reorganização do movimento comunitário das favelas durante a redemocratização brasileira, e ainda hoje desafia o status quo com uma espiritualidade libertadora que se contrapõe ao conservadorismo religioso que legitima desigualdades.
- Jesus — o Deus que se faz homem
No coração dessa teologia está a ressignificação de Jesus como o Deus que se fez homem, solidário com as dores humanas. Essa compreensão parte da kenosis — o esvaziamento voluntário — em que Cristo assume a condição humana em sua plenitude, identificando-se com os pobres, feridos e oprimidos. Não é o homem que se eleva ao divino, mas o divino que se abaixa à humanidade. Nessa visão, Cristo é o irmão de caminhada, o corpo ferido nas periferias, o amor que se ajoelha para servir.
- Influências marxistas e cristãs
A Teologia da Libertação, da qual a Teologia da Periferia herda caminhos, dialoga com o marxismo sem submissão, mas com apropriação crítica. Usa-o como lente de análise das estruturas sociais que geram opressão. Ao mesmo tempo, há no próprio marxismo uma inspiração cristã original — em sua utopia de justiça, igualdade e comunhão. Essa afinidade eletiva, como descreve Michael Löwy, revela uma ponte possível entre fé e revolução, entre Evangelho e transformação radical.
- Resultado das contradições
A emergência da Teologia da Periferia é fruto direto das contradições do capitalismo periférico e das limitações da religião institucionalizada. É a resposta empírica dos que vivem sob o peso da exclusão, mas não se calam. Ao invés de uma fé alienante, propõe-se uma espiritualidade engajada, que nasce do chão da comunidade e busca transformar a realidade a partir da própria vivência. Uma fé que carrega o corpo e a cruz, mas também a esperança.
* Claudio Siqueira é jornalista, editor de vídeo, acadêmico de antropologia na UNILA, trabalha no H2FOZ portal de notícias de Foz do Iguaçu.
Fontes:
- Pastoral de Favelas: https://wikifavelas.com.br/index.php/Pastoral_de_Favelas
- Kenosis: https://pt.wikipedia.org/wiki/Kenosis
- Afinidades entre marxismo e cristianismo da libertação (Scielo): https://www.scielo.br/j/trans/a/kMRndcskjc9dyNsJNJpnBrk/