A reportagem teve enorme repercussão. O poeta maior, Carlos Drummond de Andrade, que na época publicava suas crônicas no jornal, leu a reportagem e escreveu o poema “Triste Horizonte”
20-01-2025 às 09h04
Alberto Sena*
No ano de 1974, havia só dois anos na Redação do jornal Estado de Minas, à Rua Goiás 36, no Centro de BH, recebi um estudo da Fundação João Pinheiro relacionado com a mineração na Serra do Curral, que dentre outras coisas chamava a atenção para os estragos da então Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) hoje integrada ao grupo Vale S.A.
A empresa tinha intenção – e já até tinha iniciado a destruição – de explodir a Serra do Curral, bem em frente às vistas dos belo-horizontinos, de modo a abrir enorme buraco – informava o estudo – ao ponto de comparar com o nível da Praça Rui Barbosa, da Estação Ferroviária.
A pedido do jornalista e escritor Roberto Drummond, na ocasião substituindo o titular, Geraldo Magalhães, no caderno então chamado de 2ª Seção, fiz uma pesquisa e incursão à Serra do Curral, baseado no estudo da Fundação João Pinheiro, o que gerou uma reportagem que Drummond titulou assim; “SERRA DO CURRAL PEDE SOCORROOO…”.
A reportagem teve enorme repercussão. O poeta maior, Carlos Drummond de Andrade, que na época publicava suas crônicas no EM, leu a reportagem por mim assinada e baseado na nossa denúncia, ele fez o poema “Triste Horizonte”, que, ironicamente, está exposto na entrada do Parque da Serra do Curral, localizado no outro extremo do Parque das Mangabeiras.
Resultado, diante de tamanha repercussão, a MBR interrompeu as explosões e mandou equipe de técnicos à Europa a fim de buscar tecnologia para operar na Serra do Curral poupando o seu frontispício.
Ao final da exploração, já integrando as empresas da Vale do Rio Doce, nomenclatura que a empresa trocou para Vale S.A., depois dos desastres de suas barragens em Mariana e Brumadinho, sobrou um buraco com cerca de 300 metros de profundidade atrás da Serra do Curral, que se vai enchendo de água há mais de dez anos e só estará completamente cheio em 2025, conforme a previsão.
E como já estamos em 2025, seria o caso de verificar, com a aquiescência da empresa, se o enorme buraco está cheio e se não representa problema para a população da capital, de a água romper a serra e tornar a Avenida Afonso Pena em um rio de consequências inimagináveis.
De lá até aos dias de hoje se passaram 51 anos e, ao que se pode deduzir, as cenas se repetem, porque a empresa está com projeto para liberação da Serra do Curral à mineração, com a criação, inclusive, de uma bacia de rejeitos, o que, segundo o abaixo-assinado em curso, pedindo o tombamento estadual da serra, poderá gerar uma poluição do ar belo-horizontino sem precedentes, com poeira de minério até a Praça Sete.
Particularmente, eu me sinto na obrigação de participar desse abaixo assinado, e recomendo a todos as pessoas de boa vontade para fazerem o mesmo, porque o poder econômico não pode se sobrepor aos interesses da sociedade.
O título dado pelo jornalista e escritor Roberto Drummond em minha reportagem, em 1974, hoje pode ser o mesmo de há 51 anos: “SERRA DO CURRAL PEDE SOCORROOO…”.
*Jornalista e escritor