Ministro Gilmar Mendes, ministro decano do STF - Supremo Tribunal Federal - créditos: STF
04-12-2025 às 09h43
Samuel Arruda*
Na liminar proferida nesta quarta-feira (3), Gilmar Mendes suspendeu trechos da Lei 1.079/1950 — a chamada “Lei do Impeachment” — que permitiam que qualquer cidadão denunciasse ministros do STF por crimes de responsabilidade. Com isso, passa a ser prerrogativa exclusiva da PGR iniciar pedidos de impeachment contra magistrados da Corte.
Além disso, a decisão altera o rito de julgamento, exigindo um quórum qualificado de 2/3 dos senadores (em vez de maioria simples) para prosseguir com o processo, e veda a utilização do mérito de decisões judiciais como fundamento para responsabilização — mudanças que, segundo críticos, tornariam praticamente inviável qualquer impeachment.
Gilmar Mendes justificou a medida alegando que a regra precedente — que permitia pedidos populares — gerava “intimidação” do Judiciário por meio de impeachments políticos, ameaçando sua independência.
A repercussão no Legislativo foi imediata e contundente. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, classificou a decisão como uma clara “usurpação de prerrogativas” do Legislativo e expressou preocupação com a concentração de poder nas mãos de um único magistrado.
O senador Esperidião Amin condenou a medida como uma “usurpação descarada” da soberania popular — lembrando que a Constituição e a Lei do Impeachment sempre permitiram que cidadãos comuns denunciassem autoridades por crimes de responsabilidade.
Na Câmara dos deputados, líderes da oposição definiram a decisão como “ato autoritário” e “traição à democracia”. Para eles, ao retirar do povo e do Parlamento a prerrogativa de fiscalizar o STF, a Corte estaria se blindando contra críticas e investigações.
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema, também criticou a medida, chamando-a de “ofensa à Constituição” e um desrespeito à democracia.
Especialistas ouvidos por alguns veículos afirmam que a decisão torna o impeachment de ministros do STF “praticamente impossível”, minando os mecanismos de controle e tornando a Corte quase intocável.
Isso é um risco para o equilíbrio institucional
A possibilidade de que qualquer cidadão pudesse denunciar membros do STF era um mecanismo de controle democrático e participação popular. Ao retirá-lo, a decisão enfraquece a fiscalização cidadã sobre o Judiciário;
Concentrar na PGR — que é um órgão do próprio sistema de Justiça — a prerrogativa de denunciar magistrados pode reduzir riscos de politização de pedidos de impeachment, mas também limita gravemente a transparência e a accountability
Tornar o processo mais rígido (quórum elevado, proibição de críticas ao mérito judicial) transforma o impeachment em algo simbólico, ineficaz, especialmente em casos de abuso de poder ou conduta questionável;
Quando o Judiciário se regula sem controle externo efetivo, há o risco de desequilíbrio entre os poderes — um pilar da democracia.
A decisão monocrática de Gilmar Mendes representa mais do que uma simples interpretação jurídica de pontos da Lei do Impeachment: configura uma tentativa de autocontenção seletiva — ou melhor, de autoproteção institucional. Segundo especialistas, essa iniciativa representa um retrocesso institucional sob a máscara de proteção.
Sob o pretexto de preservar a independência do Judiciário, o ministro elimina mecanismos de controle, participação popular e fiscalização legítima sobre os membros mais elevados da Corte. A reação unânime do Congresso, juristas e governadores mostra que o Brasil assiste a um movimento autorreferente que — se consolidado — poderá acelerar o empobrecimento dos freios e contrapesos da democracia.
*Samuel Arruda é jornalista e articulista

