Vem aí a COP30 - créditos: Agência Pará
28-10-2025 às 15h23
Marcelo de Castro Souza(*)
Tudo está interligado. Cada ação, pensamento ou sistema social compõe uma rede invisível que atravessa o tempo e o espaço.
Na Idade Média, éramos uma sociedade que se via como portadora da “grande revelação”, guiada por um Estado julgador, capaz de impor costumes e verdades absolutas. Entretanto, esse mesmo período foi marcado por comportamentos considerados selvagens no convívio social e nas relações diplomáticas — uma era de violência, perseguições e crenças que moldaram profundamente a mentalidade medieval.
Em meio a esse cenário, um pequeno grupo, em algum lugar, começou a pensar diferente. Com registros escritos e reflexões sistemáticas, esses indivíduos documentaram mudanças de comportamento humano e inauguraram um processo de transição rumo à civilização.
Compreender essa trajetória evolutiva exige observar tempo e espaço como dimensões entrelaçadas. A história, afinal, repete-se em ciclos, como uma ciranda de nós mesmos ao longo da vida.
Essa constatação conduz inevitavelmente a momentos sombrios: a Santa Inquisição, com suas fogueiras acesas em nome da fé e da “evolução”; e, séculos depois, o Holocausto — um testemunho brutal da capacidade humana de destruir culturas, comunidades e identidades.
Quanto mais uma teoria se aprofunda, mais surgem movimentos de perseguição, tentativas de silenciamento de povos e de apagamento dos vínculos que conectam o ser humano ao seu território e à natureza.
Na Amazônia, entre tantas histórias esquecidas, ecoam as memórias dos soldados da borracha, dos projetos PIN e Fordlândia, da corrida pelo quinino, da compra do Acre e da exploração da chamada “madeira mármore”.
Narrativas que revelam batalhas silenciosas, nas quais conhecer a terra e manter seus domínios sempre significou garantir a segurança jurídica de um território. Daí nasceu a expressão: “Quem tem de fato, tem por direito.”
Do início do século XXI até a COP 30, passaram-se vinte e cinco anos de verdadeira “caça às bruxas” contra brasileiros que enfrentaram as fronteiras dessas terras, sustentando a posse nacional com suor, resistência e, muitas vezes, com o luto de mães que perderam seus filhos para as doenças tropicais.
A intensificação de uma utopia conservacionista remete à “Teoria do Universo 25”: trabalhamos à noite e nos escondemos de dia, enquanto somos caçados e exibidos como troféus. O coliseu moderno está prestes a inaugurar, com um nome sugestivo — “A Nova Belém”.
Nessa encenação, veremos equipamentos queimados, helicópteros disparando mísseis, agentes do Ibama descendo de rapel em pleno voo, acampamentos destruídos e pessoas fugindo pela mata apenas com a roupa do corpo. A cena lembra roteiros de filmes de streaming. A ciência, com todo o seu poder explicativo, parece ter espaço para tudo — inclusive para pedir desculpas no futuro.
As vozes da floresta têm um som peculiar: um gemido profundo, semelhante ao abandono dos esquecidos no frio da Polônia, nas praças da França ou nos mais recentes projetos de integração nacional. Quando domesticamos os lobos, acreditamos que havíamos evoluído. No entanto, ainda hoje, há cães presos por correntes esticadas no chão.
Estamos longe de retirar essa corrente do pescoço, porque aqueles que a colocam ainda não alcançaram a evolução plena.
E quando tudo isso passar, a COP 30 poderá ser lembrada como o maior massacre velado da história do planeta — não por armas declaradas, mas pelo som abafado da floresta, pelas culturas silenciadas e pelos povos invisibilizados em nome de um ideal que esqueceu de ouvir quem sempre esteve aqui.
“O tempo passa mais devagar para objetos em movimento rápido. Para um observador em repouso, o tempo de um objeto em movimento parecerá passar mais lentamente.”
Albert Einstein
Precisamos de tempo, ciência e crédito para mostrar que somos capazes de continuar aqui.
As vozes da Amazônia precisam de espaço para pronunciar as mazelas humanas.
Carta Aberta à COP 30
INSTITUTO ECO CACHIMBO
(*) Marcelo de Castro Souza, é técnico em Meio Ambiente, trabalha com mudanças de categoria de Unidade de Conservação na região da BR 163.


