
189º aniversário de nascimento do Visconde de Ouro Preto - créditos: divulgação
28-02-2025 às 12h32
Silvio Aderne Neto (*)
No último final de semana, comemoramos o 189º aniversário de nascimento do Visconde de Ouro Preto, um dos mineiros mais brilhantes e de caráter irrepreensível do século XIX e início do século
XX. Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto, nasceu em Ouro Preto em 21 de fevereiro de 1836 e faleceu em Petrópolis, coincidentemente, no mesmo dia, 21 de fevereiro de 1912. Filho primogênito de um negociante português de Braga e de uma mãe oriunda de tradicional família ouro-pretana, deixou sua cidade natal ainda jovem para estudar Direito em São Paulo, na prestigiada Faculdade do Largo São Francisco.
Sua trajetória foi rápida e ascendente. Logo assumiu o cargo de Oficial de Gabinete do Presidente da Província de São Paulo, Francisco Diogo de Vasconcelos. Em seguida, foi nomeado Secretário de Polícia em Ouro Preto, Deputado Provincial, Deputado Geral e, com apenas 30 anos, tornou-se o Ministro da Marinha mais jovem da história do Brasil. Posteriormente, também ocuparia o Ministério da Fazenda, o Senado e, mais tarde, seria elevado à nobreza com o título de Visconde. Seu nome ficou definitivamente marcado na história como o último Presidente do Conselho de Ministros do Império, cargo que assumiu sob o reinado de Dom Pedro II.
Com a Proclamação da República, Afonso Celso, filho ilustre de Minas Gerais, exilou-se em Portugal e na França. Retornou ao Brasil em 1894, dedicando-se ao jornalismo, à advocacia, à escrita de livros e às críticas ao novo regime, até seus últimos dias.
Austero em seu comportamento, eloquente nas palavras e incansável nos estudos, Afonso Celso se destacou desde os tempos de faculdade. No terceiro ano do curso de Direito, já era convidado a trabalhar no gabinete do Presidente da Província de São Paulo. Aos 21 anos, se destacaria pela profundidade argumentativa ao defender seu chefe das críticas da imprensa. Antes de concluir o curso, ele se desligou do governo, em desacordo com a postura de Fernando Torres em relação a seu antecessor.
Após a formatura de Afonso Celso, o próprio Fernando Torres, demonstrando o carinho e consideração que lhe devotava, escreveu uma carta recomendando-o ao Presidente do Conselho de Ministros, o Marquês de Olinda. Muito profética, embora tenha sido carregada de ironia, seria a observação feita pelo Marquês de Olinda ao terminar de ler a carta: “Senhor Celso, o meu particular amigo Fernando Torres afirma tais coisas a respeito do senhor que só tenho uma resolução a tomar: é propor-lhe que me substitua, com o que ficarei muito grato, e assuma a Presidência do Conselho dos Ministros e a Pasta do Império…” No entanto, Afonso Celso buscava apenas um cargo inicial para sua carreira. Com o apoio de Torres, ele assumiu o cargo de Secretário de Polícia em Ouro Preto.
O destino, porém, reservava mais para Afonso Celso. Em 1860, ele foi eleito Deputado Provincial e, em 1864, Deputado Geral. Logo, passou a se destacar no Parlamento, principalmente ao defender o projeto de navegação de cabotagem para embarcações estrangeiras, o que contribuiu para o avanço do comércio marítimo brasileiro. Sua atuação chamou a atenção e ele foi convidado para integrar o gabinete como Ministro da Marinha.
Durante sua gestão no Ministério da Marinha, o Brasil enfrentava os momentos mais difíceis da Guerra do Paraguai. Afonso Celso teve papel crucial ao convencer o Visconde de Inhaúma, Comandante da Esquadra, a forçar a passagem pelos obstáculos do Rio Paraguai e superar a
Fortaleza de Humaitá. Essa manobra ficou marcada como uma das maiores vitórias da Marinha brasileira na guerra. Além disso, teve a visão de enviar o pintor Vítor Meireles ao front para registrar cenas da batalha, o que resultou nas obras-primas “Combate Naval de Riachuelo” e “A Passagem de Humaitá”.
Sua visão administrativa também foi fundamental na criação do Museu Naval, em 14 de março de 1868, no Rio de Janeiro. Afonso Celso incentivou o desenvolvimento da indústria naval brasileira, promovendo a modernização do Arsenal de Marinha e a autonomia dos capitães responsáveis pelas oficinas de construção naval e pirotecnia. Também enfrentou desafios críticos como a escassez de médicos durante a guerra, agravada por epidemias como o cólera. Suas memórias desse período estão registradas no livro “A Marinha de outrora: Subsídios para a História”, publicado em 1894.
Em 1876, foi reeleito Deputado Geral e, em 1879, tornou-se Senador. No mesmo ano, foi convidado para o Ministério da Fazenda, onde se destacou novamente pela austeridade e controle dos gastos públicos. Em 1888, foi agraciado com o título de Visconde de Ouro Preto. Sua última posição de destaque foi a presidência do Conselho de Ministros do último gabinete de Dom Pedro II, cargo que ocupou até o fim da Monarquia, quando lutou pela preservação da Instituição, sem sucesso. Com a Proclamação da República, Afonso Celso exilou-se, primeiro em Portugal e depois na França.
Em Portugal, defendeu a honra de sua pátria, respondendo de forma contundente a um português que criticava o Brasil pela queda da Monarquia: “O senhor não tem competência para julgar a gente de minha terra. Ela é tão digna, altiva e capaz de bravura quanto a portuguesa. Pelo menos lá não há quem deixe o Brasil para vir ganhar dinheiro em Portugal e regresse ao Brasil para falar mal dos portugueses.”
Retornando ao Brasil em 1894, dedicou-se ao jornalismo, à literatura e à criação de clubes monárquicos. Em 1900, foi eleito admitido no no Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, do qual se tornaria Presidente pouco antes de falecer, em Petrópolis, em 21 de fevereiro de 1912, deixando um legado de coragem, dignidade e contribuição incalculável à história nacional.
O Visconde de Ouro Preto, um mineiro e marinheiro de alma e caráter ímpares, teve uma trajetória política brilhante, mas, infelizmente, muitas vezes esquecida ou mal compreendida. Seu nome, no entanto, merece ser lembrado como um dos maiores patriotas do Brasil.
(*) Silvio Aderne Neto é capitão de Mar e Guerra da Marinha do Brasil, historiador, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e Relações Institucionais da CFMG.