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A consensualidade é um meio eficaz de acesso à justiça. CRÉDITOS: Divulgação
18-02-2025 às 11h05
Cristiane Helena de Paula Lima Cabral*
A formação da sociedade e do Estado se deu a partir do conflito no momento em que os indivíduos se viram incapazes de gerenciarem as suas crises e um dos exemplos que podemos citar é o contrato social, no modelo citado por Rousseau, em que se estabeleceu uma instituição capaz de pôr fim, ou pelo menos tentar resolver os litígios.
A partir do monopólio da jurisdição, o Estado passa a dizer o direito (mesmo que também exista outras alternativas, como a arbitragem, por exemplo) e com isso o Poder Judiciário é a instituição responsável por julgar os litígios entre as pessoas, sejam elas jurídicas ou físicas.
O Código de Processo Civil, atrelado à Lei de Mediação, traz os chamados métodos alternativos de solução das controvérsias e fomenta a implementação da consensualidade na resolução dos conflitos.
Assim, a consensualidade é um meio eficaz de acesso à justiça, conceito destacado por Mauro Cappelletti, e, com isso, vê-se que o Brasil passou a priorizar mecanismos consensuais para reduzir a sobrecarga do Judiciário e promover soluções céleres.
Uma instituição que pode auxiliar, ainda mais vez, o uso do consenso no Brasil é o Tribunal de Contas. Com atribuições definidas na Constituição da República, os Tribunais de Contas exercem o controle externo da Administração Pública com a responsabilidade de realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional dos órgãos públicos, ou seja, verificar onde os recursos públicos estão sendo aplicados e como se dá o cumprimento das políticas públicas.
Assim, considerando a atuação no âmbito da Administração Pública, os Tribunais de Contas passam a exercer um papel estratégico na promoção da consensualidade, que vai além da fiscalização tradicional, devendo sempre fomentar soluções pacíficas de conflitos.
Com isso, podemos verificar que os Tribunais de Contas vêm assumindo um papel ativo no controle externo consensual, como, por exemplo, o Decreto nº 9.830/2019 e a Nota Recomendatória da Atricon nº 02/2022, que incentivaram a resolução de conflitos via diálogo. Ainda, destaca-se a Instrução Normativa nº 91/2022 do Tribunal de Contas da União, que estabeleceu procedimentos para a solução consensual de controvérsias.
Experiências regionais também mostram a eficácia do consensualismo. O Tribunal de Contas de Mato Grosso criou mesas técnicas para promover mediações com gestores públicos, resultando em soluções ágeis e menos litigiosas.
Já em Minas Gerais, o Tribunal intermediou um acordo com o governo estadual para aquisição de ônibus, solucionando uma controvérsia que beneficiou a população. Além disso, tramita no próprio Tribunal um projeto de resolução que visa instituir a mesa de conciliação e prevenção de conflitos afetos a órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Minas Gerais com o intuito de promover, não só o uso amplo da consensualidade, como também da justiça restaurativa no controle externo.
A atuação consensual dos Tribunais de Contas contribui para reduzir burocracias e evitar judicializações, ao mesmo tempo em que mantém o controle social e a fiscalização efetiva dos recursos públicos. Além de maior celeridade, essa abordagem promove soluções alinhadas ao interesse público, reforçando a eficiência e a legitimidade das instituições de controle.
A adoção de métodos consensuais pelos Tribunais de Contas demonstra que o controle externo pode ser, além de fiscalizador, um instrumento de pacificação social. Com isso, esses órgãos fortalecem sua função constitucional e fomentam uma Administração Pública mais eficiente, transparente e participativa.
* Cristiane Helena de Paula Lima Cabral é professora, advogada e funcionária do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.