
Tempos que ficaram aparentemente esquecidos. CRÉDITOS: Reprodução
19-07-2025 às 10h08
Regina Alvarenga*
Rememorando os tempos de escola, em meados da década de 1950 até meados de
1960, permanecem vivos na memória alguns momentos de cunho religioso, e
recordações musicais, ligadas ou não à religião.
O leitor que tiver estudado em colégio confessional haverá de identificar-se. Mas, espero
compartilhar com os que lerem, em geral, as emoções da infância e adolescência.
No contexto do catolicismo, no curso primário, éramos constantemente levados a assistir
à projeção de slides sobre a vida dos santos, o que me encantava. Também gostava de
contemplar a imagem de Nossa Senhora – era grande, talvez maior que o tamanho
humano. E de admirar também a parte interna da casa de boneca (ficava no pátio) vendo,
pela janelinha, a boneca e os móveis da sua casinha – um mundo de sonho.
Também era marcante o costume de, antes de sermos conduzidos enfileirados à sala de
aula, cantarmos o hino nacional e outras músicas que são diárias nos colégios católicos.
Crianças trazem no peito fortes sentimentos que afetam a relação com os colegas, sendo
esta dinâmica, ou, por outro lado, quase inexistente. Meu caso era o segundo, o da
timidez.
O meu aprendizado ia bem; o caos começou quando passei a ter a professora de
aritmética mais avançada, uma freira. Não conseguia acompanhar a matéria. Depois, com
ajuda de uma instrutora particular, consegui passar no exame de admissão e entrei para o
ginasial, em outro colégio católico.
Este novo colégio era uma construção linda, de arquitetura no estilo holandês. Lembro-me
de caminhar pelos grandes corredores, pelas escadas de madeira. A capela era muito
bonita, mas só íamos levadas pelas irmãs de caridade – não me lembro de ir lá sozinha.
As freiras eram alemãs, ou holandesas, algumas com forte sotaque. Havia uma que vivia
afastada – devido ao trauma da guerra.
Já, então, no ginasial, comecei a desenhar caricaturas de professores, entre estas a de
um professor de Ciências. Na aula, desenhei um pinto, como uma cobra muito longa, que
na ponta tinha um rosto. As colegas estavam segurando o riso, por pouco ele não viu o
desenho. “Qual a graça que o palhaço aqui não entendeu?”
No ginasial também se começava a aprender latim e francês. Nas aulas de educação
física, nos esportes, eu não me destacava e, de fato, não gostava.
O ensino era sempre expositivo – o professor fazia arguições. A aluna que era chamada
havia de se levantar para responder à pergunta. Na época era assim. Atualmente, em
2025, as escolas já vêm tentando uma didática em que o aluno possa construir a sua
aprendizagem.
Foi, então, que o trio surgiu – eu e duas colegas ficamos amigas, achando tudo
engraçado. Rir era forma de sobrevivência emocional. Era nervosismo que se expressava
em riso. O colégio era só para moças.
Foi assim, entre alegrias e tristezas, que passei por dois colégios de freiras.
Mais histórias devo ter para contar, caso a memória me traga momentos mais
gratificantes.
Voltando aos primeiros anos escolares – eu ainda pequena – vêm-me os ecos desse
tempo longínquo, cheio de vozes, sons, aromas, sustos, irmãs de caridade. Raramente
havia uma novidade.
Bem, houve a notícia da morte do papa. Surpreendentemente, todas tivemos direito de
chorar…mesmo sem ter muita noção do porquê.
Nessa época, uma menina segurava fortemente uma pasta – eu carregando meu material
escolar. Era gostoso e acalmava morder a alça de couro da pasta amiga, o que deixava
um caldo na boca.
As horas fora de casa eram longas. Tempo de andar de uniforme, de confessar, de ter um
missal e um terço, de fazer primeira comunhão. De receber medalha de menção honrosa.
De saber que não se pode entrar na clausura das irmãs – o que escondiam elas?
Tempos que ficaram aparentemente esquecidos.
*Regina Alvarenga é formada em Letras e especializada em Tradução, UFJF. Livro
publicado: “Caminhos de Mim” – poemas contos e crônicas, patrocínio do Programa
Cultural Murilo Mendes, Prefeitura de Juiz de Fora. Terceiro lugar na categoria Professor,
no Primeiro Concurso de Poesia do Museu Mariano Procópio, Juiz de Fora.