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Putin candidato na Rússia mais uma vez

Putin candidato na Rússia mais uma vez

Mascha Gessen, jornalista e escritora com mais de vinte livros publicados, conta com minúcias a história, desde os tempos em que Putin era menino

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13-03-2024 às 09h:29

Manoel Hygino*

A União Soviética não mais existe, mas a Rússia de Putin não amenizou, até onde se sabe, a violência contra os opositores do governo. A morte de Alexei Navalny, principal líder anti regime político do Kremlin, incentiva a luta por um regime aberto às ideias e à democracia. A esposa do principal inimigo de Putin, preso e isolado no Ártico, foi peremptória: “Há três dias, Vladimir Putin matou meu marido, Alexei Navalny. Putin matou o pai dos meus filhos”, declarou Yulia. Com ele, quis matar o nosso espírito, a nossa liberdade, o nosso futuro”.

Em 2020, ela conseguiria que Alexei, em coma na Sibéria devido a envenenamento, saísse do país, para tratar na Alemanha. Depois, retornou para a colônia penitenciária no Ártico, onde faleceu, mas as causas são cuidadosamente escondidas. As potências ocidentais e pessoas íntimas do falecido acusam Putin de responsabilidade no óbito.

A morte de Alexei Navalny é mais um capítulo triste da história da Rússia. Ela se junta a Alexander Litvinenko, Anna Politkovskaya, Natalia Estemirova, Stanislav Markelov, Boris Nemtsov, Sergei Yushenkov, Denis Voronenkov, Sergei e Yulia Skripal, Nikolai Glushkov e tantos outros opositores que pereceram ao enfrentar o Kremlin de Putin.

E houve mais. Entre 30 de janeiro e 2 de maio de 2022, oligarcas russos foram eliminados: 30 de janeiro, Leonid Shulma, chefe de Transporte da Gazprom Invest, encontrado morto em sua casa de campo: 28 de fevereiro, Alexander Tiulakov, também alto executivo da Gasprom, morto em garagem de casa; 28 de fevereiro, Mikhail Watford, milionário nascido na Ucrânia, encontrado sem vida em sua casa em Surrey, Inglaterra; fim de março, Vasili Melnikov, dono da Medstom, empresa de suprimentos médicos, morto ao lado da família, em Nizny Novgorod; 18 de abril, Vladislav Avaiev, ex-vice-presidente do Gazprombank, também localizado sem vida em seu apartamento em Moscou; em 19 de abril, Sergei Protosenia, ex-executivo da companhia de gás Novatek, achado igualmente morto no norte de Barcelona, com esposa e filha; em 2 de maio, Andrei Krukovski, diretor da estação de esqui Kranaya Polyana, perto de Sochi, ao cair de um penhasco.

EXEMPLO ANTIGO

Na realidade, Putin não perde tempo. Neste março, ele concorre mais uma vez à presidência da Rússia. Mascha Gessen, jornalista e escritora com mais de vinte livros publicados, conta com minúcias a história, desde os tempos em que Putin era menino ousado nas ruas de Leningrado. “The Observer” comentou: “Se o poder de Putin for desafiado, não será porque seus inimigos morrem misteriosamente, mas porque a escala da pilhagem que ele permitiu se tornou intolerável. Mascha Gessen oferece detalhes intrigantes do pequeno e briguento nanino Putin, recusando-se a ser intimidado nos quintais sujos de Leningrado”.

A exemplo dos czares que dominaram a Rússia antes da Revolução de Outubro de 1917, que levou os comunistas bolcheviques ao poder, o presidente Putin quer se perpetuar no poder. E há mais: Caso vença este mês, ele poderá permanecer na presidência do seu país até 2036, o que o tornara o líder mais longevo na história moderna da Rússia, ultrapassando o sanguinário Josef Stalin, à frente do império soviético de 1928 até 1953, quando morreu.

A morte de Alexei Navalny deve ter sido em 22 de fevereiro. Cinco dias após, o corpo ainda não fora liberado para a família. Ludmila Navalnaya, a mãe, de 69 anos, entrou na Justiça da cidade de Salekhar sob alegação de inação do comitê de investigação. A família não teve acesso aos restos mortais. Uma audiência foi agendada para 4 de março. Ela gravou um vídeo pedindo a Putin: “Deixe-me enfim ver meu filho. Eu exijo que o corpo de Alexei me seja entregue imediatamente para que eu possa enterrá-lo de forma humanitária”.

Um paramédico do Hospital local declarou que o corpo de Alexei mostrava que o corpo apresentava sinais de fortes convulsões, sinais que indicavam tentativa de ressuscitá-lo após paradas cardíacas. A advogada da mãe e ela própria foram informadas que a causa da morte foi “síndrome da morte súbita”, termo vago para diferentes síndromes cardíacas que causam paradas cardíacas súbitas e morte.

Joe Biden, presidente dos EUA, afirmou: “Não sabemos exatamente o que aconteceu, mas não há dúvida de que a morte de Navalny foi consequência de algo que Putin e seus capangas fizeram”, afirmou. Para o presidente francês, Emmanuel Macron, a morte causou “raiva e indignação”. “Na Rússia de hoje, espíritos livres são colocados no Gulag e condenados à morte”, declarou. Ele disse ainda que a morte “mostra a fraqueza do Kremlin e seu medo dos oponentes”.

O DIFÍCIL ENTERRO

As perseguições, assassinatos e toda espécie de violência que marcaram o regime soviético, não tiveram trégua com o fim da URSS. Mascha Gessen, embora vivendo em período perverso, sendo jornalista, teve coragem de acompanhar episódios dolorosos, crimes cruéis. Sobre o assassinato da ativista Galina Sterovoitova, que não temia denunciar as ações criminosas da KGB, ela relata: “Nunca descobri quem estava por detrás do assassinato de Galina (os dois homens que anos depois foram condenados pelo crime eram apenas matadores de aluguel). Nem jamais descobri o porquê. O que descobri foi que, ao longo dos anos 1990, enquanto jovens como eu construíam vidas novas em um novo país, um mundo paralelo se desenvolvia. São Peterburgo (nome primitivo de Laningrado) havia preservado e aperfeiçoado muitos dos principais traços do Estado soviético: um sistema de governo que trabalhava para aniquilar seus inimigos – um sistema paranóico e fechado que se empenhava em controlar tudo e dominar qualquer coisa que não pudesse controlar”.

A afirmação corrobora integralmente os fatos a que se assiste agora com relação ao principal opositor de Putin. Os jornais de todo o mundo contam a novela dramática da vida e da morte de Alexei Navalny, inclusive os problemas do seu próprio sepultamento. Os diários do Brasil noticiaram, por exemplo, em  março deste 2024: “A equipe do opositor russo Alexei Navalny, que morreu em fevereiro na prisão, denunciou que serviços funerários se recusaram a transportar o corpo para a igreja onde seria realizado o velório, em Moscou. “É uma vergonha. Os motoristas do carro funerário se recusaram a levar Alexei ao necrotério”, lamentou Ivan Khdanov, um de seus colaboradores. “Primeiro, não fomos autorizados a alugar uma sala funerária para nos informar que nenhum carro funerário levará o corpo para lá”, confirmou sua equipe. Os funcionários “recebem ligações de pessoas desconhecidas que as ameaçam para não levar o corpo de Alexei a lugar nenhum!”

Finalmente os atos derradeiros: manifestações dos opositores a Putin. Mais de uma centena de prisões. Cânticos pelas cidades. Agora, restará aguardar o pleito, que definirá o futuro do atual presidente e da própria nação.

*Da Academia Mineira de Letras e da Associação Nacional de Escritores.

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