
Abuso de poder econômico em campanhas eleitorais - créditos: Revista Cenárius
17-07-2025 às 13h00
Lucio de Medeiros Advogado Eleitoral(*)
As recentes cassações dos mandatos dos prefeitos de Martins Soares e Vieiras, ambos na Zona da Mata mineira, pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), acendem um alerta importante sobre as irregularidades nas campanhas eleitorais e reforçam a seriedade da Justiça Eleitoral no combate a práticas ilícitas que tem o condão de macular a lisura do pleito. As decisões, tomadas por unanimidade na sessão de 9 de julho de 2025, enaltecem a aplicação rigorosa da legislação eleitoral contra o abuso de poder político e econômico, e a prática de condutas vedadas.
Em Martins Soares, o prefeito Paulo Sérgio Pereira (PSDB), e o vice- prefeito Alex Sandro Franco de Andrade (PSDB) foram cassados por compra de votos. A Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), proposta pelos partidos MDB, PT e PDT, apontou que a concessão irregular de benefícios da assistência social do município foi utilizada para obter apoio político e votos. A sentença do juiz da 168ª Zona Eleitoral, Marcos Paulo Coutinho da Silva, decidiu pela existência de distribuição indevida de benefícios sociais em ano eleitoral. O relator do recurso no TRE, desembargador federal Miguel Angelo, manteve o entendimento, destacando o aumento de quase 400% nos valores pagos como benefício de assistência social sem o devido respaldo legal, o que comprometeu a isonomia do pleito. Além da cassação dos diplomas e multa de R$ 5 mil para cada um, o ex-prefeito Fernando Almeida de Andrade (PSDB) também foi condenado à inelegibilidade por oito anos e multa de R$ 50 mil, por ter sido beneficiado pela prática.
Já em Vieiras, o prefeito Ricardo Celles Maia (PSD) e o vice Antônio Gouvea Passos (PSDB), reeleitos em 2024, tiveram seus mandatos cassados por diversas irregularidades. A ação, proposta pela coligação adversária “A Esperança Vai Vencer”, alegou condutas ilícitas relacionadas à contratação de servidores, distribuição de benefícios, doação de casas e kits escolares, propaganda institucional e uso de veículos oficiais em campanha. O juiz da 187ª Zona Eleitoral reconheceu as irregularidades que restaram comprovadas, as quais configuraram condutas vedadas e abuso de poder político e econômico. O relator do recurso no TRE, juiz Ricardo Barouch, reafirmou as condutas vedadas na contratação de pessoal temporário nos três meses antes do pleito e na distribuição de kits escolares. Em relação aos abusos de poder político e econômico, foram reconhecidos na contratação de pessoal temporário no ano da eleição, com um aumento expressivo de 108 servidores contratados em 2024, em comparação com os anos anteriores. Barouch manteve a cassação do prefeito e do vice-prefeito, aplicou a inelegibilidade apenas a Ricardo (prefeito) e reduziu a multa para R$ 10.641.
Esses casos, embora ainda caiba recurso e os prefeitos permaneçam nos cargos até o julgamento de eventuais embargos de declaração, servem como um balizador crucial para as futuras campanhas eleitorais. A ênfase dada à distribuição indevida de benefícios sociais, ao uso eleitoreiro da máquina pública e à contratação excessiva de pessoal em ano eleitoral demonstra o quão atentos os órgãos de controle estão a essas práticas.
A Lei nº 9.504/97, conhecida como Lei das Eleições, estabelece limites para a atuação de gestores públicos em períodos eleitorais, visando garantir a igualdade de oportunidades entre os candidatos. O §10º do art. 73 da referida Lei, proíbe expressamente a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, a não ser em casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.
A jurisprudência do TRE-MG e, por extensão, de outros tribunais eleitorais, vem se consolidando no sentido de coibir qualquer tentativa de desvirtuar o processo democrático por meio de vantagens indevidas. A perda do mandato, a inelegibilidade por oito anos e as multas aplicadas são sanções severas que visam desestimular tais condutas e proteger a lisura das eleições.
Para pré-candidatos, candidatos, advogados e profissionais envolvidos em campanhas, esses casos são um lembrete de que a observância da legislação eleitoral não é uma mera sugestão, mas uma exigência inegociável. A busca por atalhos ou a instrumentalização da estrutura pública para fins eleitorais pode levar a consequências drásticas, como a perda do mandato, mesmo após a vitória nas urnas. Os cases acima afiram de maneira clara que a cada eleição, a Justiça Eleitoral demonstra que está cada vez mais atenta e equipada para garantir a integridade do processo democrático.
*Lucio de Medeiros Advogado Eleitoral Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/MG Subseção Barro Preto