
Muitos museus têm apresentado exitosas experiências de comunicação dos trabalhos desenvolvidos por suas equipes profissionais nas áreas de reserva técnica. CRÉDITOS: Divulgação
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08-05-2025 às 09h48
Sérgio Augusto Vicente*
Conservar, pesquisar e comunicar. Eis o tripé que sustenta a missão de uma instituição museológica. Os profissionais que atuam em museus precisam articular suas ações nessa cadeia operatória.
O que muitos ainda não sabem, entretanto, é que esses três pilares são profundamente interrelacionados e interdependentes. Afinal de contas, o ato de conservar um objeto museal não se justifica como um fim em si mesmo, mas pelas inúmeras possibilidades de expô-lo em exposições físicas e/ou virtuais. Ou, simplesmente, pelas pesquisas a serem realizadas sobre ele. Há de convir que, muitas vezes, são as pesquisas e a sua subsequente divulgação para públicos amplos e/ou especializados que muitas vezes justificam ou fundamentam o investimento financeiro na conservação e restauração de uma peça. É também a pesquisa que norteia as escolhas curatoriais inerentes à concepção e montagem das exposições, bem como os seus respectivos programas educativos.
Mais do que articulados, os esteios dessa estrutura estabelecem entre si uma relação dialética, em que um não prescinde do outro. Quando um deles não funciona, o prédio ameaça a ruir.
Equilibrar as peças dessa engrenagem é, pois, um dos grandes desafios dos gestores desses equipamentos culturais. Por negligência ou por simplesmente priorizarem a tão propalada visibilidade política, que muitas vezes se sobrepõe aos trabalhos técnicos realizados nos bastidores, muitos gestores acabam focando exclusivamente em ações de comunicação pouco preocupadas com permanentes ações técnicas de conservação e pesquisa.
Por que não incluir nas ações de comunicação institucional com os públicos os trabalhos técnicos e científicos relacionados à conservação e à pesquisa? Que sentido faz comunicar apenas as exposições, se o que elas comunicam são narrativas tecidas a partir de conhecimentos e saberes alicerçados em investigações que historiadores, museólogos, restauradores, antropólogos, etc, realizam diariamente?
Em síntese, o que se quer dizer é que os “trabalhos de formiguinha” realizados nos bastidores dos museus podem e devem ser igualmente divulgados nas mídias. Faz parte da missão cidadã de um museu explicitar os meandros dos trabalhos realizados com seu acervo. Afinal, antes de integrarem as vitrines de uma exposição – aquelas eticamente fundamentadas, é claro -, os objetos passam por um extenso e hercúleo processo de pesquisa, conservação/restauro, o qual torna possível o encadeamento das narrativas.
Há algum tempo, muitos museus têm apresentado exitosas experiências de comunicação dos trabalhos desenvolvidos por suas equipes profissionais nas áreas de reserva técnica. Apesar de serem ainda pouco conhecidos pelos públicos, as reservas técnicas e os laboratórios de conservação e restauração têm ganhado maior visibilidade. Aos poucos, os públicos vêm se conscientizando da existência desses espaços, de suas funções e de sua importância – tão importantes quanto as áreas expositivas.
Percebe-se a pertinência desse tipo de divulgação quando se presta atenção na experiência dos museus ao longo da pandemia ou, sobretudo, na experiência de instituições que, durante vários anos, tiveram suas portas fechadas por conta de prolongadas obras de restauração em seus prédios. Foi esse o caso do Museu Paulista e da Fundação Museu Mariano Procópio, por exemplo. Houve, em ambos os casos, enorme dificuldade de convencimento dos públicos no sentido de fazê-los entender que os trabalhos técnicos com o acervo nunca foram interrompidos. Do contrário, o que teria possibilitado a reabertura plena dessas instituições com exposições inéditas?
Por mais dedicadas que estivessem à divulgação dos trabalhos realizados em seus bastidores, ambas as instituições não deixaram de enfrentar o grande desafio de conscientizar os públicos de que um museu não se constitui apenas de circuitos expositivos – muito embora esta seja, obviamente, uma dimensão extremamente importante desses equipamentos culturais. Tudo isso corrobora ainda mais a necessidade de os museus incorporarem definitivamente aos seus programas de comunicação e educação uma permanente conscientização dos públicos acerca do mencionado tripé de sustentação.
* Sérgio Augusto Vicente é Professor de História e Historiador. Doutor, Mestre, Bacharel e Licenciado em História pela UFJF. Colunista do jornal “Diário de Minas” e colaborador de outros periódicos. Membro correspondente da Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil (Mariana-MG). Trabalha na Fundação Museu Mariano Procópio (Juiz de Fora-MG)