Atenções dos brasileiros se dividem entre eleições e Copa do Mundo - créditos: divulgação
28-12-2025 às 11h21
Marcelo Castro
O poder, quando exercido como serviço, constrói civilizações. Quando se afasta dessa função, converte-se em instrumento de ruptura, desorientação moral e enfraquecimento institucional.
Na Europa, o Estado moderno foi forjado a partir de pilares claros: disciplina militar, primado do direito, educação clássica e autoridade moral das instituições. Esses elementos garantiram continuidade histórica, estabilidade administrativa e respeito simbólico à ordem pública.
No Brasil, a transição da monarquia para a república, em 1889, rompeu com esse modelo sem oferecer um substituto à altura. A queda de Dom Pedro II não significou apenas o fim de um regime, mas a dissolução de um símbolo que organizava a obediência, a técnica administrativa e a hierarquia institucional. A República nasceu sem lastro simbólico e sem um projeto moral claro.
Esse vazio foi progressivamente ocupado por narrativas ideológicas. Ao longo do século XX, especialmente após 1964, consolidou-se uma estratégia de ocupação cultural e institucional do poder, conduzida majoritariamente pela esquerda. O processo não se deu pela força, mas pela base: arte, educação e linguagem. A cultura tornou-se o primeiro campo de disputa; a educação, o eixo central.
Inspirado por uma leitura ideológica da pedagogia, o sistema educacional passou a formar cidadãos mais treinados para a contestação do que para a responsabilidade, mais orientados por direitos do que por deveres. Família, Igreja e tradição foram tratadas como obstáculos ao “progresso”. O resultado foi a substituição de valores estruturantes por um relativismo moral travestido de liberdade.
A Constituição de 1988 consolidou juridicamente esse rearranjo. Embora tenha ampliado garantias sociais, institucionalizou também uma visão de Estado inchado, moralmente neutro e dependente de mediações ideológicas. A advertência de João Figueiredo, em 1983 — “não vou deixar o Brasil virar uma Cuba” — sintetizava o conflito de fundo: não se tratava apenas de regime político, mas de modelo civilizacional.
Com a globalização, o Brasil aprofundou suas contradições. Governos de esquerda, especialmente a partir dos anos 2000, optaram por uma inserção internacional baseada na exportação de commodities, sem projeto industrial ou tecnológico consistente. A decisão de reconhecer a China como economia de mercado consolidou uma dependência estrutural: hoje, o país asiático domina parcelas estratégicas da cadeia de suprimentos do agronegócio, da mineração, do aço, da indústria leve e do mercado imobiliário.
Na outra ponta, a relação com a União Europeia tornou-se um exercício de submissão regulatória. Décadas de negociações resultaram em restrições ambientais e produtivas, sem contrapartidas comerciais efetivas. Esse entrave, sustentado por governos e militâncias de esquerda, fragilizou a soberania produtiva nacional em nome de uma retórica ambiental seletiva.
Após quase quarenta anos de redemocratização — sendo dezoito sob governos declaradamente de esquerda — o saldo é inequívoco: crescimento sem autonomia, inclusão sem sustentação e direitos sem responsabilidade. O país encontra-se preso a um modelo que relativizou valores, esvaziou a educação e corroeu a fé — justamente os pilares que historicamente sustentaram sua coesão social.
À luz de Edmund Burke, ignoramos o pacto entre gerações e desprezamos a tradição. Com Mário Sérgio Cortella, fica evidente a perda do sentido ético do agir coletivo. E, como alerta Mangabeira Unger, a esquerda brasileira falhou ao capturar o Estado sem ousar reinventar suas instituições, preferindo administrar a dependência a construir um projeto nacional.
A crise que se anuncia não é apenas econômica ou política — é civilizatória. Não será resolvida por slogans, nem por disputas eleitorais. Exigirá o resgate da fé como eixo moral, da família como núcleo formador e da responsabilidade como valor público.
O poder, quando compreendido como serviço, ainda pode produzir civilização. Mas o tempo para adiar essa reconstrução está se esgotando…
FELIZ ANO NOVO!!
Marcelo Castro.

