Propaga-se um discurso de ódio. Só não o percebe quem considera mais cômodo ignorar os desafios, pensando que assim deles se livra. Falta uma reflexão individual para compreender isso
Nestes tempos sombrios, devemos buscar compreender o conteúdo ideológico dos discursos radicais dos segmentos políticos que se dizem representantes da extrema direita.
Esses extremistas, em atitudes fascistas, se consideram donos da verdade, pois não admitem o diálogo e renegam as regras do jogo democrático, em ambiente onde proliferam a miséria, a insegurança, a desesperança e a ignorância.
Em síntese, expressam em bravatas e ações, disseminadas como ladainhas nas redes sociais, em nome de uma “pseuda” moral e costumes estereotipados, a exclusão social e política de seus inimigos.
O fascismo, historicamente, consiste em uma forma política caracterizada por uma série de elementos que se apoiam mutuamente: a) o culto a um líder carismático, dotado de virtudes quase sobre-humanas; b) o nacionalismo exacerbado; c) o etnocentrismo (o “nós)” da comunidade nacional, de modo excludente); d) a valorização da violência como elemento criativo e regenerador do corpo político; e) a eliminação de partidos políticos dissidentes, considerados subversivos e/ou comunistas; f) o terrorismo policial organizado estatalmente contra todos aqueles vistos como inimigos do regime; g) a projeção imaginária de uma ideia de identidade nacional sem fissuras; h) a mobilização permanente da classe dominante em torno da projetada unidade mística da nação.
Para prevalecer em sociedades conflituosas, o fascismo entroniza no poder pessoas narcisistas.
Adorno propicia indícios sobre a passagem da estrutura autoritária da personalidade para a narcisista, como forma de ajustamento social requerido.
A personalidade autoritária traz consigo a submissão cega à autoridade e uma violência, também cega, contra aqueles que de alguma forma neguem aquela.
A personalidade narcisista, por sua vez, com um ego enfraquecido, se guia por estímulos externos, quase sem ter consciência da distinção entre mundo interno e mundo externo.
Realmente, a personalidade narcisista tem parentesco com a personalidade autoritária: ambas evitam contatos com outros egos, e, desta forma, contato consigo mesmas.
No caso extremo da personalidade autoritária, denominada manipuladora, e no narcisismo, há o isolamento de afetos que, se conscientizados, trariam ansiedades reprimidas à tona.
Em ambos os casos, o Ego quase não logra medir mais os conflitos entre o id e o superego e entre o id e o mundo externo, pois com o enfraquecimento da família, o indivíduo passa a ser socializado diretamente, o que impede a diferenciação.
Devemos fazer opção nos dias de hoje entre o esclarecimento ou a barbárie.
Ou nos engajamos na luta democrática para nos tornarmos conscientes de tudo que se pauta na agressão e no preconceito inseridos em nós mesmos e nos outros, ou nos deixamos nos submeter ao fascinante discurso fascista daqueles que retiram sua sobrevivência psíquica da vã satisfação de odiar.
*Mário Lúcio Quintão Soares é especialista em Direito Constitucional, Comunitário e Eleitoral