
Presidente do EUA Donald Trump e Lula presidente do Brasil - créditos: divulgação
04-08-2025 às 08h28
Claudio Siqueira (*)
Os fluxos comerciais e políticos revelam um jogo desigual. A China não larga mais o Brasil — mas também não se compromete. Já os Estados Unidos, que precisam desesperadamente reaproximar o país para manter presença na América Latina, perderam espaço e confiança. Hoje, carecem de doutrina e fôlego econômico para reconquistá-la.
Por necessidade histórica — e não por ideologia — o Brasil foi, por anos, elo vital no Sul global. Agora, em meio à guerra comercial entre os gigantes, nos tornamos interessantes e cobiçados e seguimos agindo como periferia, sem exigir contrapartidas reais. Eis o verdadeiro problema.
A China é, desde 2009, nosso maior parceiro comercial. Compra soja, minério, carne — e paga bem. Em 2023, o superávit comercial do Brasil com a China passou dos 50 bilhões de dólares. Dinheiro vivo. Mas, além disso, o que recebemos? Muito pouco. Os investimentos em infraestrutura são lentos, sem transferência tecnológica, e voltados à sua própria rota de escoamento — não ao desenvolvimento nacional. A China lucra imensamente com o Brasil — e retribui pouco. Isso precisa ser dito.
Os Estados Unidos, por sua vez, perderam moeda política e credibilidade. A doutrina atual (com Biden ou Trump) se volta para dentro: reindustrializar, conter a China, manter a América Latina sob controle. Só que isso não basta. Foram décadas apoiando ditaduras, sabotando projetos estratégicos (como os acordos com Petrobras e Embraer entre 2005 e 2010), impondo padrões sob o rótulo de “democracia”, sem oferecer nada de concreto. Se quisessem de fato recuperar o Brasil como aliado estratégico, precisariam apresentar um Plano Marshall verde, digital e produtivo. Não farão isso.
A China já nos considera aliados, mas não nos trata como parceiros. Os EUA nos desejam (precisam de nós), mas perderam o encanto e o crédito.
Cabe ao Brasil abandonar o papel coadjuvante e ser o centro da própria equação.
Isso exige rejeitar a condição de exportador de commodities e assumir a posição de articulador do Sul global. Implica investimento pesado em industrialização, soberania digital, infraestrutura física, inovação tecnológica e integração regional com foco no Mercosul, na CELAC, e na cooperação energética, comercial e científica entre vizinhos.
É hora de cobrar mais da China e exigir dos EUA algo efetivo, não apenas discurso.
Estar entre os dois gigantes é maturidade geopolítica. Mas exige projeto, e isso ainda não temos com clareza.
Enquanto isso, seguimos entregando terra e comprando microchip (e chamando isso de globalização).
O futuro não está em escolher Pequim ou Washington. Está em negociar com ambos, impor limites, exigir ganhos — e investir em nós mesmos.
O Brasil não precisa ser quintal dos EUA nem celeiro da China. Precisa ser potência do Sul global, com os pés na própria terra e os olhos no próprio céu.
(*) Claudio Siqueira é jornalista