Morre Amelina Chaves, de muitos filhos e livros
Ela casada, com filhos – e um deles, o Roldão, era um dos meus amigos de infância – e eu, um pivete, como diria o poeta Henry Corrêa de Araújo, jornalista, criador da denominação
23-01-2024 às 14:31h.
Alberto Sena*
Ao abrir o celular li a notícia da morte dela, escritora Amelina Chaves, aos 92 anos de idade, acontecida na noite desta segunda-feira, 22 de janeiro de 2024, levada por um AVC. Sozinho, no momento, não pude conter uma manifestação interior, no fundo do coração – “hummm...”, um tanto pesaroso.
Ato contínuo, me recordei dela, de quando fomos vizinhos, na Rua São Francisco, em Montes Claros. Ela, duas ou três casas depois do cruzamento com a rua Corrêa Machado, e eu, um imóvel – o açougue do senhor Nilo – antes do cruzamento.
Ela casada, com filhos – e um deles, o Roldão, era um dos meus amigos de infância – e eu, um pivete, como diria o poeta Henry Corrêa de Araújo, jornalista, criador da denominação – de 9/10 anos de idade. Frequentei a casa dela. Roldão e eu tínhamos sonhos circenses. Circo era uma das maiores atrações daquela época, final da década de 1950, depois do cinema de rua.
Ela podia ser a minha mãe. O tipo dela era semelhante ao da minha mãe. O tamanho, a expressão corporal, os olhos com um brilho particular. O jeito de falar.
O marido dela, senhor Almir, era “detetive” da Estrada de Ferro Central do Brasil (EFCB), e, naquela época, quando a meninada assistia filmes de caubóis norte-americanos, a gente ficava impressionado com ele de revólver na cintura, o que na visão do menino impunha respeito e até um certo temor.
A casa de dona Amelina, salvo engano, ainda está no mesmo lugar, um tanto afastada do alinhamento da rua. Semelhante à onde moramos, que ainda existe e quem a adquiriu construiu na frente se igualando ao alinhamento da rua, mas sem demolir a casa antiga.
Foi Amelina que, muito mais tarde reencontrei, em Grão Mogol, onde ela foi visitar o Presépio Natural Mãos de Deus, criado pelo economista e sociólogo Lúcio Bemquerer, também falecido há mais de dois anos.
Na ocasião, acompanhei Amelina na volta para Montes Claros, quando ela me levou à casa onde morei e me apresentou a moradora. No momento, a dona fazia almoço e teve a bondade de nos atender e então me mostrou toda a casa antiga, conservada. Foi como se estivesse fazendo um mergulho dentro de mim mesmo, porque aquela casa é de uma importância enorme e principalmente o quintal, grande, dando fundos para a linha do trem de ferro.
Não me recordo mais do título do primeiro livro dela, mas me surpreendeu, porque não imaginava que a mãe de Roldão, às voltas com a filharada toda, de repente se revelava escritora. Na época, eu já estava no jornal Estado de Minas e trabalhava também na Editora Comunicação, do escritor André Carvalho, que editou o livro dela.
A última notícia relacionada aos livros de Amelina é que ela já havia chegado aos 36.
Era uma pequena grande mulher. Podia-se medir a estatura dele da testa para cima. Era chamada de “Dama da Literatura” pelos confrades da Academia Montes-clarense de Letras (AML). Doutora Honoris Causa pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
Amelina nasceu na Vila do Sapé, município de Francisco Sá. Sapé se tornou Burarama e esta, Capitão Enéas, fruto das ações de um grande sonhador, que, inclusive, foi prefeito de Montes Claros, o Capitão Enéas.
Por tudo que fez, pelos filhos que criou, pelo esforço literário que desprendeu ao longo de uma vida empreendedora, como artesã, ela sempre teceu livros bem sucedidos, de cunho social; ela mostrou o nosso Norte de Minas e a sua gente, como são – e essa é a grande herança deixada por ela, calcada numa só palavra de quatro letras, Amor.
Por tudo, como amigo dela, desde criança, mas de pouca convivência devido à distância – eu em BH e ela em MOC – tenho só que agradecer a Deus por Amelina. Ela cumpriu escorreitamente a missão e quando chegou a hora, se foi, certamente, em paz.
*Editor Geral do DM