
Praça Zacarias, Curitiba-PR - créditos: divulgação
25-08-2025 às 08h48
Hatsuo Fukuda (*)
Por toda a minha vida tenho convivido com pessoas de fora de Curitiba. Sempre atribuí isto ao fato de ser eu, também, um álien – o instintivo reconhecimento dos rejeitados – mas hoje, usando o mais moderno método científico existente, o achismo, concluo que o estrangeirismo faz parte da cidade. Uma curitibanice, enfim.
Se formos às origens desta curitibanice, vamos encontrar um estadista baiano, Zacarias de Góis e Vasconcelos – primeiro presidente da província -, talvez a pedra fundamental da existência do Paraná e, portanto, de Curitiba. Hoje, esquecido e ignorado por todos, relegado à nome de praça central e a um antigo Grupo Escolar na Rua Ubaldino do Amaral, foi por sua iniciativa que se plantaram as sementes do que é hoje o Paraná e Curitiba. Ele desenhou a imigração, entre outras coisas, a pedra fundamental da Terra de Todas as Gentes, na expressão feliz de Paulo Vítola e Marinho Galera. E definiu o traçado da Estrada da Graciosa, que ligou Curitiba ao Litoral, uma bela rodovia que hoje é atração turística.

Helena Klody, Paulo Leminski e dalton Trevisan
A maior poeta da terra, ucraniana, por azares do destino, nasceu em Cruz Machado, no interior do Paraná, foi estudante e depois professora do Instituto de Educação.
Por Helena Kolody tenho uma reverência que adoto para as figuras santas (aliás, Hélio Leites, como lembrou a Amélia Filizola, chamou-a de santinha municipal). Ler sua poesia, para mim, é uma experiência mística. Eu a via, às vezes, chegando para almoçar aos sábados no restaurante Alameda Gril, na Alameda Cabral, caminhando lentamente, ajudada por uma amiga, com um semblante sereno e sorridente.
Não quero ser o grande rio caudaloso
Que figura nos mapas.
Quero ser o cristalino fio d’água
Que canta e murmura na mata silenciosa.
Outra excentricidade curitibana com certeza foi o poeta Paulo Leminski – o homenageado deste ano no Festival de Paraty. O autor de Distraídos Venceremos, na minha versão de curitibanice, só podia ser filho de pai polaco, mãe com origens negra e indígena.
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Helena Kolody e Paulo Leminski possuíam a vocação curitibana para universais, e, entre outras fontes, inspiraram-se na poesia japonesa para seus trabalhos, Kolody sendo uma das pioneiras no Brasil. A professorinha normalista sabia das coisas; o polaco riponga não deixava por menos. Eram da província, mas não eram jecas.
Na última vez que o vi, ele estava em um bar, com a cineasta Berenice Mendes, ambos sorridentes. Gosto de lembrá-lo assim, em um bar, com uma amiga, despreocupado, bebendo cerveja.
Dalton Trevisan, o curitibano da gema, continua na Rua Ubaldino, desnudando, para desgosto dos bons (nunca por demais louvados), o eterno labirinto povoado por Joões e Marias em sua eterna guerra conjugal. Para Dalton, Curitiba era a província, cárcere, lar.
Não se enganem, ele, também, é um estranho numa terra estranha.
(*) Hatsuo Fukuda é advogado e procurador aposentado do Estado do Paraná
