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Os militares da cavalaria do Exército, em agressivas e amedrontadoras atitudes, CRÉDITOS: Arquivo pessoal
Eu, colegial “auto tornado”, irresponsavelmente, manifestante estudantil, me orgulhava de estar entranhado naquele cenário tenso.
19-02-2025 às 09h25
Carlos Morici *
Eu, 12 pra13 anos, aluno brigão do Colégio Batista Mineiro, o nosso “Batistão” e “piolho” dos colegas maiores que faziam o Científico. Saí atrás deles para uma peripécia histórica na minha lembrança pré adolescente: descer a rua Varginha até a avenida do Contorno que ficava ali em baixo, saltando a linha da Rede Ferroviária.
Do outro lado da Contorno, a Escola de Engenharia da UFMG. Nós, eu ainda de uniforme cáqui do colégio, nos envolvemos numa missão mágico louca, apoiando os alunos da faculdade: a de nos postarmos num ponto estratégico no alinhamento da rua da Bahia, onde a cavalaria do exército, em escaramuças contrárias a uma manifestação que já se encorpava, aguardava ordens para impedir os movimentos de uma possível passeata.
Os militares da cavalaria do Exército, em agressivas e amedrontadoras atitudes, começaram a mover seus enormes cavalos com agitação e rudeza, impondo bruscos solavancos nos assustados animais, um ódio sobre o qual eles não tinham nenhum entendimento, ainda mais sob fortes esporadas…
Tudo isso na tentativa de impedir o grupo de se aglutinar e se manifestar contra a recente ditadura militar, já prenunciada cruel.
Eu, colegial “auto tornado”, irresponsavelmente, manifestante estudantil, me orgulhava de estar entranhado naquele cenário tenso.
De alguém, sem que eu tivesse percebido e deslumbrado com aquele campo de iminente batalha, recebi um saco daqueles de pipoca, pesado e cheio de bolinhas de gude das mais vagabundas.
Nos espalhamos para o outro lado do ribeirão Arrudas e de lá, ao ver a cavalaria se movimentando para atacar os estudantes que começavam a correr, recebi um berro para jogar um punhado de bolas onde a cavalaria iria, obrigatoriamente, passar. Os militares se moviam para atacar os jovens manifestantes e cercá-los mais a frente.
Sem perceber nossa ação de furtiva emboscada, diversos cavalos e cavaleiros começaram a cair, como num filme de poeirento faroeste, patinando sobre as bolinhas…
Foi trágico!
Emocionante!
Eu, cheio de uma alegria estranha, entendi, após sair às pressas, do lado de lá, que minha semente socialista começou a germinar, ali.
*Carlos Morici é jornalista