
Itaipu Binacional, 50 anos de parceria com muita energia - créditos: Itaipu Binacional
Getting your Trinity Audio player ready...
|
23-04-2025 às 08h08
Marcelo Barros(*)
Entre 2022 e 2023, a inteligência brasileira operou como operam os grandes — com precisão técnica e foco em interesses nacionais. A ABIN executou uma ação clássica de Estado, mas esbarrou no velho problema: a diplomacia do pedido de desculpas. O Brasil parece ainda não ter entendido que inteligência é uma ferramenta de poder, não um erro a ser corrigido em nota oficial.
Operação limpa e legítima: o básico da inteligência moderna
A Agência Brasileira de Inteligência utilizou o que há de mais comum em operações cibernéticas de coleta de informações: Cobalt Strike, phishing direcionado, roubo de cookies de sessão, senhas e dados de e-mail. Trata-se do “kit padrão” da espionagem contemporânea. Nada de novo ou criminoso — apenas o necessário para obter vantagem informacional sobre autoridades paraguaias em uma negociação de bilhões envolvendo a Usina de Itaipu.
Essa ação é textbook. Qualquer país sério, diante de um ativo estratégico como Itaipu, investiria pesado em inteligência de antecipação. O alvo, nesse caso, não era político por capricho — era geopolítico, energético e econômico. A ABIN agiu com profissionalismo técnico e foco claro: proteger o interesse nacional brasileiro. A falha não está na operação. Está no pós-operação.
O Brasil precisa parar de se envergonhar de ter inteligência
O verdadeiro escândalo não é a espionagem. O escândalo é o desconforto institucional que o Brasil ainda demonstra com o uso da própria inteligência. Países como Estados Unidos, China, Rússia e Israel não apenas operam suas agências com amplitude — como também negam com firmeza ou simplesmente ignoram qualquer exposição pública de suas ações.
Quando a NSA foi exposta espionando Angela Merkel, os EUA não pediram desculpas à Alemanha. Quando a China vazou 147 milhões de dados da Equifax, o foco foi no estudo de padrões comportamentais e digitais da população americana, não em relações públicas. Israel jamais admitiu o Stuxnet oficialmente — mas a ação é estudada como uma das mais sofisticadas da história.
Enquanto isso, o Brasil, ao ter uma de suas poucas ações de inteligência bem-sucedidas reveladas, reage com constrangimento, envia embaixador para dar explicações e pausa negociações estratégicas. Esse comportamento revela um país que ainda trata inteligência como crime, e não como ferramenta de soberania.
O governo errou feio ao recuar e expor a própria jogada
A diplomacia brasileira perdeu a oportunidade de manter a posição clássica em casos de inteligência: silêncio ou negação técnica. Ao invés disso, adotou o caminho do pedir desculpas, congelar negociações com o Paraguai e, na prática, admitir uma ação legítima como se fosse um escândalo internacional.
Esse tipo de recuo compromete a autoridade do Brasil no cenário internacional, enfraquece a confiança em suas instituições de Estado e passa a mensagem de que o país não sustenta as próprias estratégias. Inteligência, por definição, é jogo bruto. Quem entra precisa entender que, quando pego, nega. Sorri. E nega de novo. Não há pedido de desculpas no mundo da geopolítica realista.
O Brasil tem capacidade técnica, agentes bem formados e operações eficientes. Falta ainda espinha institucional para sustentar sua atuação como potência regional com ambições globais. Enquanto a ABIN joga certo e o governo joga para agradar, a soberania brasileira vai ficando em segundo plano — e o país segue pedindo desculpas por agir como adulto em um mundo de gigantes.
(*)Marcelo Barros é jornalista