
22-07-2025 às 09h00
Lúcio de Medeiros*
A política brasileira, em constante polvorosa, ganhou novos contornos recentemente com a declaração de Eduardo Bolsonaro que se encontra nos EUA. Ao afirmar que “se o Brasil não resolver nos próximos meses ou semanas essa crise institucional, não haverá eleição em 2026”, o deputado federal não apenas lançou um alerta, mas também abriu o debate sobre os limites da crítica e a linha tênue que separa o discurso político da potencial ameaça à ordem democrática.
A essência da referida declaração gira em torno da situação do seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, réu no STF e inelegível até 2030 por decisão do TSE, pelo abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação. O filho número 2 vê a pressão dos Estados Unidos, como a “única esperança” para garantir as eleições de 2026 à oposição. A insistência de que Trump “não vai recuar diante de Alexandre de Moraes” e que até mesmo “não reconhecerá uma eleição sem a participação de Jair Bolsonaro” levanta questionamentos sérios sobre a soberania e a estabilidade do processo eleitoral brasileiro. Anota-se, por oportuno que recentemente, inclusive, o Ministro Alexandre de Moraes teve o visto americano revogado, bem como de seus “aliados” da Corte Suprema.
Sob a ótica do direito dogmático, a discussão ganha contornos variados. A fala de Eduardo Bolsonaro, ao condicionar a realização das eleições à “resolução” de uma “crise institucional”, dialoga com a interpretação de uma possível ameaça. Embora o crime de ameaça, previsto no Código Penal, exija um mal injusto e grave a uma pessoa determinada, a natureza genérica da advertência, dirigida ao sistema eleitoral como um todo, não minimiza seu impacto político. Pelo contrário, em um cenário pós-8 de janeiro, discursos que insinuam o não cumprimento de ritos democráticos ou o questionamento da legitimidade eleitoral tendem a serem vistos com redobrada atenção pelas instituições.
Mais preocupante ainda é a sutil, mas presente, insinuação de uma ameaça de golpe. A defesa de uma “anistia ampla, geral e irrestrita” para o processo de julgamento da tentativa de golpe de Estado e a sugestão de que “se tudo der errado, pelo menos nós já estaremos vingados” são frases que, em um contexto de polarização, podem ser interpretadas como uma tentativa de desestabilizar as instituições e relativizar a gravidade de atos contra o Estado Democrático de Direito. A pressão externa, através da imposição do tarifaço econômico sobre produtos nacionais, descritas pelo governo como “chantagem inaceitável”, é admitida por Eduardo como a “única novidade que está fazendo o sistema repensar” e a “fina esperança” que resta. Isso nos revela uma estratégia clara de usar artifícios externos para influenciar decisões internas, atropelando a autonomia e a soberania do país. Seriam esses os indícios do crime de lesa-pátria, previsto anteriormente na Lei de Segurança Nacional, que atualmente se insere no contexto do Título XII (DOS CRIMES CONTRA O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO) do Código Penal? Há quem diga que sim.
Inobstante, por trás dessas declarações, os interesses parecem claros, notadamente a defesa intransigente de Bolsonaro pai e a tentativa de reverter sua inelegibilidade, além de pressionar o Judiciário, em especial o ministro Alexandre de Moraes, acusado de atuar como uma “ditadura” e de querer humilhar a família Bolsonaro.
A questão que não quer calar: existe alguém acima da lei? A Constituição nos ensina que não, uma vez que todos somos iguais perante a lei. A retórica de Eduardo Bolsonaro busca criar uma narrativa de que há uma atuação judicial politicamente motivada, sugerindo que certas autoridades estariam agindo de forma discricionária, ou que há uma “perseguição política”. Essa percepção, embora não se sustente juridicamente, é uma ferramenta poderosa para deslegitimar as instituições e mobilizar bases de apoio.
O apelo às “elites brasileiras” para que “segurem Alexandre de Moraes” e a sugestão de que o Brasil pode virar uma “Venezuela” são tentativas de semear o medo e a instabilidade, forçando uma intervenção política em processos judiciais. Vamos continuar acompanhando os próximos movimentos desse complexo tabuleiro, com vista à defesa do Estado Democrático de Direito, das Instituições e sobretudo da nossa Soberania.
Doutor Lúcio de Medeiros é Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/MG – Subseção Barro Preto