O cara olhou com jeito de quem não estava entendendo nada, mas não opôs nenhuma reação. Ficou olhando para mim e eu, então, aproveitei e disse-lhe: – Levo, aqui, na mochila, livros. Você gosta de ler?
29-12-2024 às 18h00
Alberto Sena*
Lá ia eu com a mochila nas costas cheia de livros “Nos Pirineus da Alma”, sobre as nossas duas experiências no Caminho de Santiago de Compostela, na França e Espanha para entregá-los às livrarias. Era terça-feira de manhã, um dia depois das comemorações do Natal. O peso dos livros nas costas me fazia suar mais do que o normal. Ia a pé e me encontrava na Rua Viçosa com Avenida do Contorno.
Ao dobrar a esquina, fui surpreendido por um rapaz de porte atlético, com uma arma na mão. Parecia um revólver calibre 38. Ele usava óculos escuros e com voz autoritária, disse-me, assim, de supetão:
– Isto é um assalto!
Olhei para ele meio encabulado e não sei porque cargas d’água me veio a ideia de inquiri-lo:
– Isto não é um assalto. Em nome de Cristo, não é. Trata-se de uma oportunidade para você se redimir.
O cara olhou com jeito de quem não estava entendendo nada, mas não opôs nenhuma reação. Ficou olhando para mim e eu, então, aproveitei e disse-lhe:
– Levo, aqui, na mochila, livros. Você gosta de ler? Se gosta vou lhe mostrar um. Custa R$ 60,00.
Aí é que o camarada não entendia nada mesmo. Sei lá porque, ele enfiou a arma na cintura, cobriu-a com a camisa e me perguntou:
– Que livro é esse? Gosto de ler, sim senhor.
Aproveitei a deixa dele e saquei de um livro como quem gira um revólver no dedão indicador. E, em seguida, entreguei-o a ele. O assaltante o segurou com as mãos, deu uma folheada, olhou as fotos inseridas ao final do livro e fez o seguinte comentário:
– Sabe que eu sempre quis fazer o Caminho de Santiago? E logo emendou: – Dizem que quem faz o Caminho volta diferente do que era, é verdade?
Eu respondi:
– Sim e não. Depende da pessoa, depende do que ela pretende ao fazer o Caminho.
O camarada ficou olhando para mim como se estivesse vendo sei lá o quê, e enfiou a mão na algibeira, retirou um pequeno pacote de notas de R$ 100 e de R$ 50 e me indagou:
– Faz por R$ 50? Levo um.
Fiz. Ele me deu o dinheiro e saiu andando com o livro na mão, como se nada tivesse acontecido.
É claro, nada aconteceu mesmo. Tudo isso foi fruto de minha imaginação. Quando andava com a mochila nas costas fui pensando nessa possibilidade, imaginando um diálogo meu com um assaltante a mão armada.
P.S.: Aceitamos pedidos para envio pelos Correios. Basta manifestar o interesse.
*Jornalista e escritor