
Alberto Sena Batista lançará, no dia 23 de maio o seu terceiro livro, intitulado “Darcy Ribeiro do Fazimento”. CRÉDITOS: Divulgação
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20-05-2025 às 09h11
Eduardo Brasil*
O jornalista e escritor montes-clarense, Alberto Sena Batista lançará, no dia 23 de maio, na Galeria do Centro Cultural da Academia Montes-clarense de Letras, o seu terceiro livro, intitulado “Darcy Ribeiro do Fazimento”, em que conta sua convivência com o professor ilustre, hoje conhecido no Brasil e no mundo por sua obra, que fez dele múltiplos personagens – sociólogo, antropólogo, escritor, político, indigenista etc.
Nesta entrevista, Alberto Sena conta um pouco da convivência com Darcy, que, por incrível possa parecer, temia não ser lembrado mais depois do seu passamento. Claro que o autor nunca acreditou nisso e considerava ser uma maneira de ele de pedir mimos.
P – O seu relacionamento com Darcy Ribeiro começou foi aqui, em Montes Claros?
R – Não. Foi muito depois, no ano de 1987 (…), quando fui convidado para integrar a assessoria de imprensa dele, nomeado secretário Extraordinário para Assuntos Sociais e de Desenvolvimento de Minas Gerais, junto ao também jornalista Calos Olavo da Cunha Pereira. Aí em Montes Claros, quando repórter do O Jornal de Montes Claros, convivi com Mário Ribeiro, Marão, e Paulinho, filho dele.
P – Você nasceu em Montes Claros – e foi pelas mãos da Irmã Beata, como sei que gosta de falar – mas viveu aqui até quando?
R – Sim, nasci em Montes Claros e na Santa Casa quando possuía “Misericórdia” no nome, e me recordo bem que deixei a cidade de trem de ferro saído da estação ferroviária, no dia 2 de fevereiro de 1972.
P – Na época você trabalhava no O Jornal de Montes Claros, do dr. Oswaldo Antunes e Waldyr Senna Batista, não era mesmo?
R – Sim. O Jornal de Montes Claros era o melhor daquela época, depois surgiu o Diário de Montes Claros. O Jornal era conhecido como “Mais Lido”, e na verdade, era uma escola prática de jornalismo, formou vários profissionais, a partir de Robson Costa, Carlos Lindenberg, Paulo Narciso, Waldemar Brandão, Luiz Ribeiro, Benedito Said e tantos outros que ainda estão na ativa até hoje.
P – Mas, e quando aflorou o escritor? Sei que o livro Darcy Ribeiro do Fazimento é o terceiro. E os outros dois?
R – O escritor sempre existiu em mim e fazia literatura até mesmo no dia a dia do Jornalismo. Mas ao ponto de publicar livro, o primeiro foi “Nos Pirineus da Alma”, sobre a caminhada que fiz em companhia de Silva, duas vezes, no Caminho de Santiago de Compostela, na França e na Espanha, em 2001 e 2002, quando fizemos ao todo 1.300 quilômetros somados e 15 anos depois nasceu o livro. O outro “Retrato de Nós Mesmos” é sobre o tempo vivido em Montes Claros até o dia da partida, em 1972.
P – E este terceiro, como se deu?
R – Eu não podia deixar de fazer este terceiro, Darcy Ribeiro do Fazimento, que, aliás, já estava escrito faz tempo e, agora, é a ocasião do lançamento, porque há tempo para tudo, como reza o Eclesiastes. Se eu não fizesse este livro ficaria em dívida com Darcy, porque, absurdamente, como conto nele, esse montes-clarense mais ilustre temia não ser lembrado depois da morte. E se eu que convivi com eles durante setes meses, em Belo Horizonte, na assessoria de imprensa dele, não escrevesse nada, claro, mais dia menos dia, Darcy cobraria de mim. Então, para poupá-lo desse trabalho, eis a experiência com ele, baseado naquilo que fazia a alegria dele: a escola.
P – Ele veio para Minas a convite do então governador Newton Cardoso, para criar aqui as escolas de ensino de tempo integral, mas acabou não conseguindo executar. Como é que foi isso?
R – Darcy veio para construir uma “fábrica de escola”, como dizia, que espalharia por toda Minas Gerais as escolas de argamassa armada, de baixo custo, que prescindiam do ferro e do aço. Mas, ao contrário do poeta Carlos Drummond de Andrade, que encontrou uma pedra no seu caminho, Darcy encontrou pelotas de ferro e de aço. Como ele não tinha tempo a perder, porque tinha pressa de viver e executar os seus sonhos, ele preferiu não ficar aqui batendo boca e foi-se embora para o Rio de Janeiro e criou, em São Paulo, com Oscar Niemeyer o “Memorial da América Latina”.
P – Foi realmente uma pena…
R – Escola sempre fez a alegria de Darcy. Se dependesse só dele, não haveria nenhum brasileiro analfabeto. Na outra ponta, a intenção dele era criar a Universidade do Saber.
P – Como assim?
R – Acostumado a criar e reformar universidades, haja vista a Universidade de Brasília (UnB) que só surgiu porque Darcy insistiu tanto, ao final ele queria reunir, na Universidade do Saber, as cabeças mais preparadas, a fim de tornar o Brasil a maior potência do mundo…
P – Não das armas…
R – Sim, não das armas, mas do Saber, do Conhecimento.
P – Você não acha que o Brasil está precisando de uma meia dúzia de Darcy’s?
R – Acho sim. Ele era um homem de fato genial, que alimentava amor desmesurável ao povo brasileiro, raça formada por branco, preto e índio. Não há nada igual no mundo. Segundo Darcy, essa miscigenação é a explicação da competência dos brasileiros. Na opinião dele, o que falta aos brasileiros de baixa condição é comida e escola. Por isso que ele queria fazer aqui essa escola para onde a juventude brasileira iria toda manhã e seria recebida com um bom café da manhã e depois iria para a sala de aula. Teria atividade esportiva, de arte e trabalho manual, almoçaria e voltaria para a sala e só iria embora no final do dia, de banho tomado.
P – Que coisa linda!
R – Pois é, só que ele encontrou aqui as tais pelotas de ferro e aço. Os interesses econômicos, como sempre, estavam acima de qualquer coisa.

* Eduardo Brasil é jornalista, radialista e cineasta, produtor do filme “U Hômi Qui Casô Cum a Mula”