02-02-2024 às 08h38
Jose Altino Machado (*)
Estava eu em um auditório lotado no centro de convenções da Universidade de São Paulo- USP.
Os motivos de estar ali, era proferir palestra sobre gentes e povos da Amazonia. Na época, então, eu era o “bandido mor” da hora e do momento, pois, segundo alguns, representava todo um universo destruidor, não só do meio ambiente amazônico, como do cultural em relação às comunidades indígenas.
A mim, não mais causa incomodo ser visto assim. Já havia vencido os primeiros passos em direção ao microfone e nem bem sabia que haveria de dizer. Tinha o péssimo hábito em concatenar a fala no instante e de acordo com o perfil da plateia e dos ouvintes; o que se tornava uma dificuldade.
Preocupava-me como convencer uma grande e jovem plateia, sonhadora com tendencias utópicas, de que a vida na prática não é bem coisa de fugaz imaginação. Um pouco, alimentados por sonhos, talvez possível, mas não em seu todo.
Confesso que estava meio perdido. ainda mais que no agito das contestações, éramos o assunto do evento. Um bondoso espírito baixou sobre mim para encontrar meio de interação para com eles. Se não sou inteligente, na hora fiquei.
Não fui direto ao assunto, mas sim com as preocupações dos jovens para com o país e a nação que construíamos. Questionei não os propósitos e seu valores em decisões tomadas, até então para a Amazonia e sua ocupação, mas sim, nunca haver lugar para conhecimento das culturas e experiencias do passado.
Procurei mostrar, que não só a juventude ali ouvinte, mas de forma geral, todo mundo se preocupa muito com o estar no momento e com os instantes vividos; como se fossem únicos e nunca passageiros.
Portanto, não seria de valia anular o passado, recriminando antepassados e políticas anteriores, nem criando perniciosos comportamentos ao futuro, permitindo a criação de verdades imprestáveis. Geração futuras padeceriam até encontrar meios para modificá-las.
E para provar a tese que apresentava, arrisquei alto. O reitor, ao meu lado, perguntado, já informara quantos lugares possuía o recinto. 1500… Como havia gente em pé, tínhamos então, mais que isso a ouvir-me. Valia a pena tentar um tudo ou nada, afinal seria a confirmação do que defendia.
Um tanto teatral, buscava convencer com boa retórica que a nossa latina apreensão maior é tão somente, “momentosa” e da hora, embora tudo que nos cerca, abriga e acolhe com segurança, bem ou mal, fora feito e estabelecido por outros que teriam conquistado lugares com diferentes comportamentos e culturas.
Tornando-se claro que fomos recebedores então, de valiosas heranças…. E quanto a isso, sequer, éramos gratos e muito menos os tínhamos em respeitosas memórias por seus feitos, que dirá vividas experiencias.
Em desafio provoquei: “De todos os senhores e senhoras aqui presentes que exercem o dom da crítica ao passado e que se creditam saberem tudo e a tudo buscarem soluções modificadoras, ao que outros construíram e ainda constroem, pergunto, quantos dos senhores poderiam honestamente levantar e proferirem os nomes completos de seus quatro bisavós? Eles estiveram logo ali antes de nós, e que com erros e acertos geraram não só energia para desenvolver nosso país, mas para que todos nós pudéssemos existir.”
“Eles sim, fizeram e participaram de todas as políticas que hoje discutimos como se fossem tão somente nossas, de nosso puro domínio, não dando nunca continuidade a deles.”
Silencio total. Ninguém levantou!!
Cabeças, olhando o teto, apenas se mexiam buscando na memória saída para tão incomoda questão. Quanto a mim, até sem merecer, bem aplaudido. E de pé. Nem sei se pela novidade do raciocínio ou pela esperteza perante a má vontade antes contrária.
Não resta dúvida, que hoje isso se tornou história, vez por outra gostosa recordação, mas como agora aniversaria nossa herdada Figueira do Rio Doce, hoje Governador Valadares, meu torrão natal, que considero uma dádiva divina sob a benção de uma simbólica cruz entre trilhos de ferrovias e rodovias, e que também muitos outros construíram no passado, vale a pena então curtir e atualizar o episódio.
Até porque os conceitos ditados em nossa terra lá se vão bem iguais aos aplicados à Amazonia.
Nossos legados são maravilhosos e aos homens e mulheres passados no tempo, devemos os mais responsáveis respeitos.
Minha cidade é magnifica. Uma das primeiras do Brasil artificialmente projetada. As larguras de nossas calcadas mostram o comedimento daqueles homens quanto as ambições imobiliárias, que foram preteridas, para conforto de seus ocupantes.
Nossas ruas e avenidas, bem largas, que antes acolhiam carroças e charretes, estão aí a suportar intenso tráfego com bom desempenho.
Tivemos o melhor serviço de água do país, o melhor saneamento público do interior e a mais moderna telefonia da América Latina.
Aqui, o frescor das arvores plantadas é bem real, sendo uma das maiores florestas urbanas artificial do Brasil. Agrada ao corpo e olhos. Essas árvores!!!
Tudo, mas tudo, vindo de mais que bisavós. Muita gente que responsavelmente conquistou, fez e deu vida. Alguns com nomes impressos em ruas, praças ou logradouros, mas a maioria de nossa gente, tal qual a Amazonia, hoje sequer sabem quem foram eles.
Nos tornamos altamente destruidores de nossos próprios valores, que jamais deveríamos olvidar por serem eles referências à Nação, valendo dizer que estejam fazendo falta a Ela…
Entretanto, juntas no instante de caça à memória de Valadares e de Amazonia, reconheçamos que muita coisa coube à natureza e à Deus criarem e aos homens cuidarem. Em dias destes tempos, até Ele anda meio esquecido por tantos não muito preocupados.
GV, BH, Macapá 30/01 a 02/02
(*) Jose Altino Machado é jornalista