Créditos: Divulgação
21-11-2025 às 11h02
Sérgio Moreira*
Oitenta artistas surdos, cegos e autistas, a maioria deles crianças. sobem ao palco do Teatro Feluma, em Belo Horizonte, no dia 23 de novembro, para apresentar o espetáculo “Somos Todos Diferentes”. A apresentação, com entrada gratuita, será aberta por 40 artistas, entre eles crianças, jovens e adultos com deficiência, alunos de violão do músico Wéberty Marliére, criador de método exclusivo para ensinar a esse público. Eles irão apresentar nove músicas. Em seguida, 40 bailarinas e bailarinos com deficiência subirão ao palco.
O espetáculo faz parte do projeto Céu e Terra, que oferece aulas gratuitas de balé e música para crianças, jovens e adultos com ou sem deficiência, criado há 28 anos por Wilmara Marliére para promover a inclusão por meio da arte. Este é o maior espetáculo da história do projeto, que culminará com todos os artistas no palco.
A apresentação marca o retorno de Wilmara aos palcos após um hiato de seis anos, motivado por complicações de saúde. A bailarina é portadora da Síndrome de Arnold-Chiari, uma doença rara que compromete a audição e o equilíbrio devido a uma malformação no crânio. Sua própria trajetória de superação foi o que a inspirou a criar o projeto Céu e Terra.
Segundo Wilmara, o objetivo do projeto é desenvolver a autoestima e a sensação de capacidade, além de estimular a fala, a audição (por meio das vibrações musicais) e a expressão corporal. A proposta também visa incentivar a comunicação e o respeito mútuo entre pessoas com e sem deficiência.
História de superação – Nascida no interior de Minas Gerais, Wilmara conta que descobriu a paixão pela dança ainda na infância. Como sua cidade não possuía escola de balé e a família não tinha condições financeiras para custear estudos fora, ela se inspirava nas apresentações que via na televisão. “Imitava os bailarinos. Cheguei a improvisar sapatilhas usando pedaços de bambu para fazer a ponta”, relembra.
Anos depois, já morando em Belo Horizonte com a irmã Meiry de Paula — que também é bailarina e atualmente faz parte do projeto —, Wilmara começou a frequentar escolas de dança. Mesmo iniciando os estudos já adulta, alcançou rapidamente níveis avançados. Foi nessa época que, após episódios recorrentes de enxaqueca, recebeu, aos 28 anos, o diagnóstico da Síndrome de Arnold-Chiari.
A perda auditiva causada pela doença motivou Wilmara a fazer um estágio no extinto Instituto Santa Inês, referência em educação de surdos. A experiência a sensibilizou profundamente. A partir daí, mergulhou em leituras sobre surdez, participou de eventos na área da saúde e, por iniciativa própria, começou a dar aulas de balé para crianças surdas na sala de sua própria casa. Assim nasceu o projeto Céu e Terra.
Começando com apenas oito alunos, o trabalho chamou a atenção da mídia, o que levou o diretor do Colégio Arnaldo a oferecer uma sala para o projeto — espaço onde funciona até hoje, na capital mineira, atendendo centenas de crianças ao longo dos anos.
“Desde a primeira turma, os exames mostraram melhora na audição das crianças”, afirma. Em 2001, as aulas de música foram integradas ao projeto pelo marido, Wéberty, que dá aulas de violão para alunos cegos, com idades entre 7 e 80 anos. Mais recentemente, o projeto passou também a atender crianças com autismo de grau 1 nas turmas de balé.
Além do marido, Wilmara tem como aliadas no projeto a irmã, a bailarina Meyre de Paula, e a filha, Maria Clara. “Sem eles não teria tanta força para seguir”, declara.
O Projeto Céu e Terra conta com o apoio do Colégio Arnaldo há 28 anos e neste ano tem o patrocínio da Supermix e Hexagon por meio da Lei Rouanet.
Arte é poderosa ferramenta – Para Wilmara, ainda há muitos preconceitos a serem superados, e a arte é uma poderosa ferramenta para mostrar a capacidade das crianças com deficiência. “Lembro de uma mãe que chegou com duas filhas, uma delas surda. Ela disse que não esperava grandes resultados da filha com deficiência. Mas aconteceu o contrário: foi ela quem mais se desenvolveu e acabou se tornando a solista do espetáculo. Essas crianças têm uma capacidade de atenção extraordinária”, conta.
Desde o diagnóstico da síndrome, Wilmara passou por diversas cirurgias na coluna cervical, chegou a ficar sem andar e ouviu dos médicos que nunca mais voltaria a dançar. No entanto, a determinação e o amor pela dança a fizeram seguir em frente. Em 2020, sequelas da Covid-19 impediram seu retorno aos palcos. Agora, após várias sessões de fisioterapia, ela promete uma apresentação especial no espetáculo deste ano.
No palco do Teatro Feluma, Wilmara vai dançar “A Morte do Cisne”, solo clássico criado em 1905 pelo coreógrafo russo Mikhail Fokine. “É o meu balé preferido e estarei no palco, o lugar que mais amo”, afirma, emocionada.
Espetáculo “Somos todos diferentes”
Data: 23 de Novembro, domingo
Horário: 19h00
Local: TEATRO Feluma Prof. Dr. Geraldo Magela Gomes da Cruz – Alameda Ezequiel Dias, 275 – Sétimo Andar – Centro, Belo Horizonte – Minas Gerais
Coluna Minas Turismo Gerais Jornalista Sérgio Moreira
@sergiomoreira63

