
Culinária mineira, uma das melhores do Brasil - créditos: divulgação
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11-06-2025 às 08h30
Wilson Cid*
A gastronomia mineira é celebrada em prosa e verso desde os tempos em que aqui penetraram bandeirantes e garimpeiros ávidos por arrancar da terra o nosso ouro. A bem da verdade, antes até, porque muito do que souberam os pioneiros, e sabemos ainda hoje, vem das lições deixadas pelos índios, peritos na intuição de descobrir o que a terra, os rios e as matas podiam oferecer para sua sobrevivência. A esse patrimônio somava-se o saber na conservação dos alimentos, num tempo de sal caríssimo; e ainda andavam longe da imaginação os recursos da refrigeração.
Muitos escritores procuraram mostrar o que em Minas mais lhes seduziu quando foram à mesa, de onde logo desponta a intimidade de nossa gente com o feijão, a couve e a carne de porco. Aos prosadores e poetas recorremos, quando um empresário nos manifestou desejo de ilustrar as paredes de seu novo restaurante com frases e versos de autores famosos e referências sobre pratos que tradicionalmente saem de nossas cozinhas. Elaborou-se a seleção de sabores montanheses, talvez algum dia com aproveitamento para as projetadas paredes.
1. O lombo era macio, tão suave, que todos imaginávamos que seu primeiro dono devia ser um porco extremamente gentil, expoente da mais fina flor da espiritualidade suína.
(R. Bragg, citado por Noêmia Abdala em “Receita de Mineiridade”)
2. Às 8 horas serviram o derradeiro prato de carne assada, com olho de arroz, farinha do Reino e cebolas.
(Agripa Vasconcelos, em “Congo Soco”)
3. Tempos bons dos doces e quitandas, das deliciosas comidinhas mineiras. Nada de serviço à francesa; os pratos todos na mesa, fumegantes e cheirosos.
(Autran Dourado)
4. O tutu de feijão, o lombo de porco, o torresmo e a linguiça imprimem ao prato um jogo de cores ameno, tão grato, cuja nota fogueira é o verde molhado da couve mineira.
(Rangel Coelho, em “Meu Barro Municipal”)
5. Com a devida licença do senhor barão, estou servindo um prato novo nas Gerais. É o macarrão, comida dos bem-aventurados. Percebe-se o odor da santidade, por ser feito da mesma substância com que se fabricam as hóstias.
(Mordomo do Barão de Catas Altas)
6. Quando a fome foi excitada pelo caldo quente da galinha, todos desejavam carnes, feijão, tudo com torresmo.
(Bodas de João Batista, Barão de Catas Altas, e Laura)
7. O óleo é bom pra comida / e também pro candieiro / serve pra fritar biscoito / e é um bom salmeiro.
(Hermes de Paula, Comissão Mineira do Folclore)
8. Depois dessa sopa eu mandaria servir uma traíra pescada pela manhã no Rio das Velhas, aí perto de Santa Luzia, e vinda por trem especial se preciso fosse, guisada em molho de tomate com pimenta malagueta discretamente dosada, fumegante e aromal. Depois do peixe, frango ensopado com batatas novas e guisado por cozinheira sábia. Depois viria o lombo clássico, como só se conhece lá nas montanhas, depois de subida a Serra da Mantiqueira.
(João Camilo de Oliveira Torres, em “Histórias de Minas Gerais”)
9. Compotas de laranja curtidas em água corrente sob o luar montanhês, figos frescos cristalizados por uma senhora idosa, digna continuadora das gloriosas tradições da glutonaria dos capitães-generais de Minas.
(João Camilo de Oliveira Torres, obra citada)
10. Os cereais, comprados em grandes partidas, deterioravam-se por falta de depósitos apropriados. Os gêneros estragados não iam para o lixo; entravam nas panelas e eram distribuídos nas mesas. Todo o empenho do pessoal culinário, desde o irmão encarregado da cozinha, era agradar aos padres, que sempre tiveram mesa reservada proverbialmente lauta.
(Augusto da Costa Leite, em “Saudades e lembranças do Caraca”)
11. Na toalha fumegante o feijão de Minas, em cujo caldo espesso se desdobram folhas de couve repolhuda. O verde tenro dos quiabos casa-se com o amarelo fulvo da abóbora em derredor de longos nacos de lombo de porco.
(Eldi Pontes, dezembro 1893, Belo Horizonte, “A Vida Exuberante de Olavo Bilac”)
12. Sopa creme de neve, garoupa ao molho de camarões, empadinhas, costeleta de carneiro com ervilhas, coxinhas de frango com arroz à chinesa, leitoa assada à brasileira, peru e presunto com farofa.
(Banquete dos 200 anos de Ouro Preto em homenagem ao presidente Júlio Bueno Brandão, cardápio no vernáculo, não em francês, protesto de Castro Lopes)
13. Arysa oviparis cremata (arroz de forno), tutus ob lubum (tutu de feijão com lombo), avis incárum rara (peru), aper darvini gratia evolutus (javali evoluído graças a Darwin, leitão).
(Banquete que Diogo Vasconcelos ofereceu a eclesiásticos amigos, em Ouro Preto, todos os pratos citados em latim, maio de 1918)
14) a) Salada do Geraldo, no Faisão Dourado, para prevenir ou remediar a ressaca: legumes leves, grão de bico, grãos de feijão mulatinho levemente cozido, gomos de laranja ácida, azeitonas, vinagre e azeite.
b) Outro remédio para o mesmo mal: Sopa do Zarur, “Jesus, está chamando”: feijão em grãos, bastante caldo dele, pedaços de linguiça, couve em fios e macarrão fino.
c) Sopa de cebolas.
d) Receita de Waltencyr Mattos ao Inácio: depois de uma pinguinha, pratos tratados com afeto e cortesia, com os nomes sempre carinhosamente no diminutivo: um feijãozinho com anguzinho, couvinha rasgadinha, carninha moidinha.
15. Nas casas da roça despejam-se simplesmente alguns pratos de farinha sobre a mesa, onde cada um se serve com os dedos, arremessando com um movimento rápido a farinha na boca, sem que a mínima parcela caia por terra, com certeira pontaria.
(John Emanoel Pohl, em viagem a Minas, sobre o “capitão”, citado por Eduardo Frieiro)
16. Em grandes travessas, leitoas ajoelhadas sobre as curvas, tinham presas à dentadura ovos cozidos e sobre os dorsos tostados rodelinhas de limão.
(João Lúcio, em “Pontes & Companhia”, sobre banquete de fazendeiro rico do Sul de Minas)
17. Enquanto a canoa desliza nas corredeiras, o caldeirão da feijoada vai fervendo na popa, onde se fez fogo sobre lastro de areia. Quando partiram já tinham quebrado o jejum com uma espetada de carne seca. São já 10 horas, é mister almoçar.
(Legodão Pereira, canoeiro do Jequitinhonha, em “O Município de Araçua”)
18. O mineiro planta o milho e cria o porco; o porco come o milho; o mineiro come o porco.
(Dito)
19. Desjejum: mingau de fubá, simples ou polvilhado de canela ou com melado e pedacinhos de queijo, ou café com leite e quitanda.
Almoço: feijão com lombo ou torresmo, feijão com couve ou farinha, angu com quiabo, arroz branco, carne de porco, pouca verdura, alface, taioba, repolho. Angu obrigatório.
Jantar: sopa de legumes com carne e farinha de milho, feijão simples ou com fubá, mandioca ou batata-doce, arroz com ovos estrelados.
(Classe média de Vila Rica, nos tempos da exploração do ouro)
20. Não conseguimos comprar em lugar nenhum nem galinha nem ovos. No jantar serviram novamente folhas de couve cozidas.
(Georg Von Langsdorf, maio de 1824, Barbacena)
21. O arroz, qual as águas deste mundo, come-se salgado ou doce;
Na pele do porco, qual nos vulcões deste mundo, crateras miúdas;
Comprime-se o molhe de couve, com a lâmina mais afiada do mundo, enche-se a travessa de fios verdes.
(Poeta José da Rocha Paixão, pai de Verônica, sogro de Povy)
22. A carne consistia em um naco de porco assado. Há, em geral, galinha ‘au riz’, com cabeça, pescoço e miúdos.
(Richard Burton)
23. Os ovos fritos, tão comuns em Minas quanto as omeletes na Itália. Tutu de feijão é o pão de cada dia de muitos lugares onde o pão de trigo não é procurado e o pão de milho desconhecido.
(idem)
24. Minha avó voltava com uma cuia de ovos e bandeja com banana, queijo fresco ainda chorando, biscoitos de polvilho e café. Avelino se servia, fazendo render a pausa da viagem.
(Olavo Romano, em “Casos de Minas”)
25. A festa tradicional da família luso-brasileira, que é vernacularmente a consoada, uma ceia de Natal, a Missa do Galo, o presépio do Menino Jesus, as pastorinhas, a
troca de obséquios (quitutes, frutas, arroz-doce, rabanadas, condessas de pastéis, partes de leitão ou cabrito. Garrafas de vinho ou licor até o Ano Novo. Festa que só veio a ser corrompida por via francesa depois da República.
(Eduardo Frieiro, em “Feijão, angu e couve”)
26. Badulaque, versão cabocla do guisado feito de fígado e bofes, conhecido na região de Carangola.
(Caderno de Minas, “Hoje em Dia”, junho 1992)
27. A farofa não é criação mineira, mas foi aqui que sobreviveu e ganhou posteridade, figurando entre os poucos não deterioráveis nas matalotagens dos viajantes que rompiam os sertões proibidos do Leste.
(idem)
28. Bichos da taquara. Nasciam entre as taquaras certos bichos roliços e compridos, todos brancos, da grossura de um dedo, os quais os índios chamam ‘rau’, assados ou torrados. Faz-se com eles um guisado, que em nada difere da carne de porco estufada.
(Eduardo Frieiro, obra citada)
29. É ainda ao feijão que os mineiros vão recorrer para a invenção de outro prato de nossa gente: o tutu com couve e linguiça, que disputa negritude com a feijoada, mas com a vantagem de ser um dos poucos capítulos de nossa culinária com direito a avançar sobre todas as estações do ano.
(?)
30. Inhá Luíza advertia ao Tonico Horta, o dia em que o vira estalando a bunda dos formigões (tanajuras) na gordura, para comer que nem pipoca.
(Pedro Nava, Memórias)
31. A dieta do tropeiro tinha de ser necessariamente pouco variada. Nela entrava em primeiríssimo lugar o feijão, seguido da farinha de mandioca, do toucinho, da carne de vento ou seca e do café. A carne seca supria a falta do sal, caríssimo então, e da carne fresca, cuja provisão era muito difícil. Ao antigo tropeiro, deve-se a cozinha típica mineira.
(José Alípio Goulart)
32. Famílias doceiras mandam à rua tabuleiros de cocadas, de canudos de queijo, de breviários e pés de moleque. Outras apuram uns cobrinhos com o bolo de feijão muito apimentado, ou fabricam em tachos de cobre as amêndoas com que se enchem os cartuchos da Semana Santa.
(Gilberto Alencar, em “Misael e Maria Rita”)
33. A mesa tinha um significado especial naquelas casas antigas. Convertia-se, em dado momento, numa espécie de altar, onde se davam graças a Deus pela comida.
(Roberto Dilly, sobre a Colônia de São Pedro, em depoimento na Funalfa)
34. Nas cozinhas da Colônia, o fogão chamado ‘econômico’, de lenha, e no alto, sobre trempes, carnes eram defumadas e conservadas, quando vinham do quintal. Nessa hora entrava em cena o porco.
(Roberto Dilly, depoimento citado)
35. Azeitonas e manteiga fresca, sopa de galinha, pastéis de truta, garoupa com molho bearnês, bife de fígado de ganso, ponche à romana, costelas de porco com cogumelos, peru recheado à brasileira, presunto de York, aspargos ao molho de vinagre.
(Banquete em homenagem a Santos Dumont, Juiz de Fora, 22 de setembro de 1903, Hotel Rio de Janeiro)
36. Mayonnese, poule au riz, garoupe, crivettes farcies et siris, póulet a jardinière, dindome truffé, filet aux champignon.
(Menu du déjeuner offert a Mr le Dr Hermenegildo Villaça a les collegues de Juiz de Fora a la Pension Colombo, 7 de julho de 1906, véspera de sua partida para a Europa)
37. João Pinheiro era vegetariano; Antônio Carlos com uma empada estava satisfeito; Raul Soares vivia de dieta, mais pílulas que guisados; Juscelino, era frango com quiabo e angu; presidente Francisco Salles se satisfazia com duas colheres de arroz, um pouquinho de chuchu e uma asa de frango; Israel Pinheiro, tutu com quiabo e linguiça.
(Governantes de Minas)
38. Banquete a Santos Dumont, 1903, e Rodrigues Alves, 1904, no Palácio da Liberdade: tutu à mineira.
39. Carne de sol curtida à noite, principalmente à noite, no sereno para ficar mais tenra, mantém os sulcos e regala o paladar mais exigente.
(Montes Claros)
40. Bambá de couve. Sopa onde também entram carne de porco e fubá ‘doce e amável’.
(Anna Marina, jornal “Estado de Minas”)
41. Frango da roça com o quiabo, que pede o socorro do angu para dar consistência à goma deixada pelo quiabo.
(JK, no restaurante do Antenor)
42. O feijão tropeiro vai no embornal, não se sabe quando e onde o viajante poderá parar para matar a fome. O feijão já cozido com farinha de mandioca esperando a adesão do torresmo.
(?)
43. Quem não goste do paio ou do rabinho de porco deve assumir a dignidade de recusar a feijoada, que só é monumental quando vira festa de tudo.
(Fábio Fortuna)
44. Que se cuide bem da escolha de um componente fundamental, a couve tronchuda.
(Paulo Pinheiro Chagas)
45. Feijoada: peso, glória e opróbio.
(Guimarães Rosa)
46. Receita mais saborosa é sentar-se a uma mesa mineira e ir provando, devagarinho, os pratos típicos do País das Gerais.
(Roberto Drummond)
47. O feijão presente no abará, avô do tutu à mineira, temperado com pimenta em folha de bananeira.
(Waldemar de Almeida Barbosa, em “Negros e Quilombos em Minas Gerais”)
48. Nesta parte de Minas não ficou herança preta mais preciosa do que a amplitude do feijão preto.
(Menturino Paula (Baiano), em “Minas Culinária”)
49. A cabidela de galinha para depois das procissões de Nossa Senhora nas noites de seu mês de maio.
(Pedro Nava)
50. A feijoada, prato alto como as sinfonias, como o verso alexandrino, prato glorioso do milagre da unidade nacional.
(Idem)
51. Obra prima da simplicidade, o nômade feijão tropeiro.
(Idem)
52. Galinha desfigura-se num caldo dum marrom suntuoso. Tão grosso, tão macio, tão escorregadio, tão fácil, como se cada um fosse recheando a boca, mastigando, engolindo veludo em estado pastoso.
(Pedro Nava, sobre frango ao molho pardo em casa de Guady Jorge)
53. Os escravos podiam viver malvestidos e mal alimentados, porém jamais passar sem uma dose diária de aguardente e um naco de fumo.
(Mafalda Zemella, em “Abastecimento da Capitania das Minas Gerais no século 18”)
54. O feijão, comia-se com um ovo frito, a linguiça frita, o lombo frito e o torresmo totêmico. Repetia-se antes de acabar. Parece Fuga de Bach. É de chorar. O nômade feijão do tropeiro das Minas rivaliza com o floreado gótico de sedentária feijoada.
(Pedro Nava)
55. Se o leitor conhece casamento mais feliz me conte, por favor: linguiça da grossura de um dedo médio frita e pão francês quentinho da padaria.
(Eduardo Almeida Reis, em “Dicionário Amalucado”)
56. Isso de feijoada completa com arroz ou laranja é heresia: o primeiro abranda e o segundo corta o gosto. O gosto deve ser conservado dentro da exuberância e do exagero de sua natureza barroca.
(Pedro Nava, em “Chão de Ferro”)
57. Filosófica, a feijoada completa pelo luto de sua cor, e pelos restos mortais que são seus ingredientes, é também memento. Depois dela, como depois da orgia, a carne é triste.
(Idem)
58. Feijoada, para ser completa, deve ter ambulância na porta e termômetro marcando 40 graus.
(Sérgio Porto)
59. O fogão, a pedra de quentar fogo, a trempe de sabão, tudo queimando lenha, entra ano sai ano. O telhado, de uma grossa camada de negro picumã, de que não escapa o longo varal de bambu, sempre repleto de deliciosas linguiças e apetitosos lanhos de toucinho.
(Alberto Furtado Portugal, em “Contos da Mata Mineira”)
60. Leitinho à toa, dava ao dono ares de sitiante. Uma pequena roça de milho, duas quartas de feijão, um porco engordando no fundo da horta. Pra que mais?
(Olavo Romano, em “Casos de Minas”)
61. Com milho cria galinha, com milho engorda cevado/, com milho alegra a cozinha e faz um prato adequado.
(Wilson de Lima Bastos, em “Na Sombra da Aroeira”)
62. Lobrobô com costela de porco e ora-pro-nobis. Angu sem sal para ensopados temperados com alho.
(Maria do Perpétuo Socorro Neves, em “Manifestações folclóricas na Zona da Mata”)
63. Dispensava-se, tanto quanto possível, o sal, produto chiquíssimo e raríssimo em todo o período colonial. O problema de abastecimento de sal foi dos mais graves do Brasil.
(Mafalda Zemella, em “O abastecimento da Capitania de Minas Gerais no século 18”)
64. A farinha come-se com qualquer fritura, ou assado, ou com qualquer caldo. No café, como agrossante, com ovo mexido em forma de farofa.
(Edilberto Trigueiros, em “Nas carrancas do Rio São Francisco”)
65. O mineiro não é homem de bons pratos ou de bons vinhos. A mesa é sempre um acessório em Minas. Só para os hóspedes é que a enchem de iguarias.
(Alceu de Amoroso Lima, em “Voz de Minas”)
66. Ao chegar ao morro, à várzea e à fazenda do juiz de fora (velhos conhecidos e pouso habitual de tropeiros) obteve um pouco de milho e arroz, o que, juntamente com papagaios e tucanos, caçados à beira da estrada, melhoraram o seu cardápio habitual.
(Em Eduardo Frieiro, obra citada, sobre a passagem do mineralogista Alexandre Caldeleugh, 1821, pela região de Juiz de Fora)
67. A chave mestra da cozinha de Antônio Dornas Vieira: a rude munheca de samambaia. Quando chove, no verão, as samambaias do mato soltam os brotos. Ou carne moída com ora-pro-nobis.
(Richard Burton, em “Viagens ao Planalto do Brasil!”, 1868, em Diamantina)
68. Os habitantes de Minas comem enormemente.
(Saint Hilaire, em “Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais”)
69. Aquele feijão de tropeiro, aquela farofa de ovo, o torresmo, a cebola frita com alho, a salsa e a pimenta tinham emprestado um sabor olímpico; aquele arroz cozido na panela de pedra; aquela couve tronchuda; aquele angu temperado com pouco sal; aquele lombo de porco conservado na banha que enchia antigas latas de querosene; aquela linguiça de tripa fina; aquele frango ‘caipira’ de carne tenra, alimentado a angu e couve e ciscando solto na horta. E tudo isso feito em fogão de lenha.
(Paulo Pinheiro Chagas, em “Esse Velho Vento da Aventura!”, jantar em sua homenagem, eleito deputado em 1951, em Mandacaia.
Aos sabores da mesa, com os mineiros
A gastronomia mineira é celebrada em prosa e verso desde os tempos em que aqui penetraram bandeirantes e garimpeiros ávidos por arrancar da terra o nosso ouro. A bem da verdade, antes até, porque muito do que souberam os pioneiros, e sabemos ainda hoje, vem das lições deixadas pelos índios, peritos na intuição de descobrir o que a terra, os rios e as matas podiam oferecer para sua sobrevivência. A esse patrimônio somava-se o saber na conservação dos alimentos, num tempo de sal caríssimo; e ainda andavam longe da imaginação os recursos da refrigeração.
Muitos escritores procuraram mostrar o que em Minas mais lhes seduziu quando foram à mesa, de onde logo desponta a intimidade de nossa gente com o feijão, a couve e a carne de porco. Aos prosadores e poetas recorremos, quando um empresário nos manifestou desejo de ilustrar as paredes de seu novo restaurante com frases e versos de autores famosos e referências sobre pratos que tradicionalmente saem de nossas cozinhas. Elaborou-se a seleção de sabores montanheses, talvez algum dia com aproveitamento para as projetadas paredes.
1. O lombo era macio, tão suave, que todos imaginávamos que seu primeiro dono devia ser um porco extremamente gentil, expoente da mais fina flor da espiritualidade suína.
(R. Bragg, citado por Noêmia Abdala em “Receita de Mineiridade”)
2. Às 8 horas serviram o derradeiro prato de carne assada, com olho de arroz, farinha do Reino e cebolas.
(Agripa Vasconcelos, em “Congo Soco”)
3. Tempos bons dos doces e quitandas, das deliciosas comidinhas mineiras. Nada de serviço à francesa; os pratos todos na mesa, fumegantes e cheirosos.
(Autran Dourado)
4. O tutu de feijão, o lombo de porco, o torresmo e a linguiça imprimem ao prato um jogo de cores ameno, tão grato, cuja nota fogueira é o verde molhado da couve mineira.
(Rangel Coelho, em “Meu Barro Municipal”)
5. Com a devida licença do senhor barão, estou servindo um prato novo nas Gerais. É o macarrão, comida dos bem-aventurados. Percebe-se o odor da santidade, por ser feito da mesma substância com que se fabricam as hóstias.
(Mordomo do Barão de Catas Altas)
6. Quando a fome foi excitada pelo caldo quente da galinha, todos desejavam carnes, feijão, tudo com torresmo.
(Bodas de João Batista, Barão de Catas Altas, e Laura)
7. O óleo é bom pra comida / e também pro candieiro / serve pra fritar biscoito / e é um bom salmeiro.
(Hermes de Paula, Comissão Mineira do Folclore)
8. Depois dessa sopa eu mandaria servir uma traíra pescada pela manhã no Rio das Velhas, aí perto de Santa Luzia, e vinda por trem especial se preciso fosse, guisada em molho de tomate com pimenta malagueta discretamente dosada, fumegante e aromal. Depois do peixe, frango ensopado com batatas novas e guisado por cozinheira sábia. Depois viria o lombo clássico, como só se conhece lá nas montanhas, depois de subida a Serra da Mantiqueira.
(João Camilo de Oliveira Torres, em “Histórias de Minas Gerais”)
9. Compotas de laranja curtidas em água corrente sob o luar montanhês, figos frescos cristalizados por uma senhora idosa, digna continuadora das gloriosas tradições da glutonaria dos capitães-generais de Minas.
(João Camilo de Oliveira Torres, obra citada)
10. Os cereais, comprados em grandes partidas, deterioravam-se por falta de depósitos apropriados. Os gêneros estragados não iam para o lixo; entravam nas panelas e eram distribuídos nas mesas. Todo o empenho do pessoal culinário, desde o irmão encarregado da cozinha, era agradar aos padres, que sempre tiveram mesa reservada proverbialmente lauta.
(Augusto da Costa Leite, em “Saudades e lembranças do Caraca”)
11. Na toalha fumegante o feijão de Minas, em cujo caldo espesso se desdobram folhas de couve repolhuda. O verde tenro dos quiabos casa-se com o amarelo fulvo da abóbora em derredor de longos nacos de lombo de porco.
(Eldi Pontes, dezembro 1893, Belo Horizonte, “A Vida Exuberante de Olavo Bilac”)
12. Sopa creme de neve, garoupa ao molho de camarões, empadinhas, costeleta de carneiro com ervilhas, coxinhas de frango com arroz à chinesa, leitoa assada à brasileira, peru e presunto com farofa.
(Banquete dos 200 anos de Ouro Preto em homenagem ao presidente Júlio Bueno Brandão, cardápio no vernáculo, não em francês, protesto de Castro Lopes)
13. Arysa oviparis cremata (arroz de forno), tutus ob lubum (tutu de feijão com lombo), avis incárum rara (peru), aper darvini gratia evolutus (javali evoluído graças a Darwin, leitão).
(Banquete que Diogo Vasconcelos ofereceu a eclesiásticos amigos, em Ouro Preto, todos os pratos citados em latim, maio de 1918)
14) a) Salada do Geraldo, no Faisão Dourado, para prevenir ou remediar a ressaca: legumes leves, grão de bico, grãos de feijão mulatinho levemente cozido, gomos de laranja ácida, azeitonas, vinagre e azeite.
b) Outro remédio para o mesmo mal: Sopa do Zarur, “Jesus, está chamando”: feijão em grãos, bastante caldo dele, pedaços de linguiça, couve em fios e macarrão fino.
c) Sopa de cebolas.
d) Receita de Waltencyr Mattos ao Inácio: depois de uma pinguinha, pratos tratados com afeto e cortesia, com os nomes sempre carinhosamente no diminutivo: um feijãozinho com anguzinho, couvinha rasgadinha, carninha moidinha.
15. Nas casas da roça despejam-se simplesmente alguns pratos de farinha sobre a mesa, onde cada um se serve com os dedos, arremessando com um movimento rápido a farinha na boca, sem que a mínima parcela caia por terra, com certeira pontaria.
(John Emanoel Pohl, em viagem a Minas, sobre o “capitão”, citado por Eduardo Frieiro)
16. Em grandes travessas, leitoas ajoelhadas sobre as curvas, tinham presas à dentadura ovos cozidos e sobre os dorsos tostados rodelinhas de limão.
(João Lúcio, em “Pontes & Companhia”, sobre banquete de fazendeiro rico do Sul de Minas)
17. Enquanto a canoa desliza nas corredeiras, o caldeirão da feijoada vai fervendo na popa, onde se fez fogo sobre lastro de areia. Quando partiram já tinham quebrado o jejum com uma espetada de carne seca. São já 10 horas, é mister almoçar.
(Legodão Pereira, canoeiro do Jequitinhonha, em “O Município de Araçua”)
18. O mineiro planta o milho e cria o porco; o porco come o milho; o mineiro come o porco.
(Dito)
19. Desjejum: mingau de fubá, simples ou polvilhado de canela ou com melado e pedacinhos de queijo, ou café com leite e quitanda.
Almoço: feijão com lombo ou torresmo, feijão com couve ou farinha, angu com quiabo, arroz branco, carne de porco, pouca verdura, alface, taioba, repolho. Angu obrigatório.
Jantar: sopa de legumes com carne e farinha de milho, feijão simples ou com fubá, mandioca ou batata-doce, arroz com ovos estrelados.
(Classe média de Vila Rica, nos tempos da exploração do ouro)
20. Não conseguimos comprar em lugar nenhum nem galinha nem ovos. No jantar serviram novamente folhas de couve cozidas.
(Georg Von Langsdorf, maio de 1824, Barbacena)
21. O arroz, qual as águas deste mundo, come-se salgado ou doce;
Na pele do porco, qual nos vulcões deste mundo, crateras miúdas;
Comprime-se o molhe de couve, com a lâmina mais afiada do mundo, enche-se a travessa de fios verdes.
(Poeta José da Rocha Paixão, pai de Verônica, sogro de Povy)
22. A carne consistia em um naco de porco assado. Há, em geral, galinha ‘au riz’, com cabeça, pescoço e miúdos.
(Richard Burton)
23. Os ovos fritos, tão comuns em Minas quanto as omeletes na Itália. Tutu de feijão é o pão de cada dia de muitos lugares onde o pão de trigo não é procurado e o pão de milho desconhecido.
(idem)
24. Minha avó voltava com uma cuia de ovos e bandeja com banana, queijo fresco ainda chorando, biscoitos de polvilho e café. Avelino se servia, fazendo render a pausa da viagem.
(Olavo Romano, em “Casos de Minas”)
25. A festa tradicional da família luso-brasileira, que é vernacularmente a consoada, uma ceia de Natal, a Missa do Galo, o presépio do Menino Jesus, as pastorinhas, a
troca de obséquios (quitutes, frutas, arroz-doce, rabanadas, condessas de pastéis, partes de leitão ou cabrito. Garrafas de vinho ou licor até o Ano Novo. Festa que só veio a ser corrompida por via francesa depois da República.
(Eduardo Frieiro, em “Feijão, angu e couve”)
26. Badulaque, versão cabocla do guisado feito de fígado e bofes, conhecido na região de Carangola.
(Caderno de Minas, “Hoje em Dia”, junho 1992)
27. A farofa não é criação mineira, mas foi aqui que sobreviveu e ganhou posteridade, figurando entre os poucos não deterioráveis nas matalotagens dos viajantes que rompiam os sertões proibidos do Leste.
(idem)
28. Bichos da taquara. Nasciam entre as taquaras certos bichos roliços e compridos, todos brancos, da grossura de um dedo, os quais os índios chamam ‘rau’, assados ou torrados. Faz-se com eles um guisado, que em nada difere da carne de porco estufada.
(Eduardo Frieiro, obra citada)
29. É ainda ao feijão que os mineiros vão recorrer para a invenção de outro prato de nossa gente: o tutu com couve e linguiça, que disputa negritude com a feijoada, mas com a vantagem de ser um dos poucos capítulos de nossa culinária com direito a avançar sobre todas as estações do ano.
(?)
30. Inhá Luíza advertia ao Tonico Horta, o dia em que o vira estalando a bunda dos formigões (tanajuras) na gordura, para comer que nem pipoca.
(Pedro Nava, Memórias)
31. A dieta do tropeiro tinha de ser necessariamente pouco variada. Nela entrava em primeiríssimo lugar o feijão, seguido da farinha de mandioca, do toucinho, da carne de vento ou seca e do café. A carne seca supria a falta do sal, caríssimo então, e da carne fresca, cuja provisão era muito difícil. Ao antigo tropeiro, deve-se a cozinha típica mineira.
(José Alípio Goulart)
32. Famílias doceiras mandam à rua tabuleiros de cocadas, de canudos de queijo, de breviários e pés de moleque. Outras apuram uns cobrinhos com o bolo de feijão muito apimentado, ou fabricam em tachos de cobre as amêndoas com que se enchem os cartuchos da Semana Santa.
(Gilberto Alencar, em “Misael e Maria Rita”)
33. A mesa tinha um significado especial naquelas casas antigas. Convertia-se, em dado momento, numa espécie de altar, onde se davam graças a Deus pela comida.
(Roberto Dilly, sobre a Colônia de São Pedro, em depoimento na Funalfa)
34. Nas cozinhas da Colônia, o fogão chamado ‘econômico’, de lenha, e no alto, sobre trempes, carnes eram defumadas e conservadas, quando vinham do quintal. Nessa hora entrava em cena o porco.
(Roberto Dilly, depoimento citado)
35. Azeitonas e manteiga fresca, sopa de galinha, pastéis de truta, garoupa com molho bearnês, bife de fígado de ganso, ponche à romana, costelas de porco com cogumelos, peru recheado à brasileira, presunto de York, aspargos ao molho de vinagre.
(Banquete em homenagem a Santos Dumont, Juiz de Fora, 22 de setembro de 1903, Hotel Rio de Janeiro)
36. Mayonnese, poule au riz, garoupe, crivettes farcies et siris, póulet a jardinière, dindome truffé, filet aux champignon.
(Menu du déjeuner offert a Mr le Dr Hermenegildo Villaça a les collegues de Juiz de Fora a la Pension Colombo, 7 de julho de 1906, véspera de sua partida para a Europa)
37. João Pinheiro era vegetariano; Antônio Carlos com uma empada estava satisfeito; Raul Soares vivia de dieta, mais pílulas que guisados; Juscelino, era frango com quiabo e angu; presidente Francisco Salles se satisfazia com duas colheres de arroz, um pouquinho de chuchu e uma asa de frango; Israel Pinheiro, tutu com quiabo e linguiça.
(Governantes de Minas)
38. Banquete a Santos Dumont, 1903, e Rodrigues Alves, 1904, no Palácio da Liberdade: tutu à mineira.
39. Carne de sol curtida à noite, principalmente à noite, no sereno para ficar mais tenra, mantém os sulcos e regala o paladar mais exigente.
(Montes Claros)
40. Bambá de couve. Sopa onde também entram carne de porco e fubá ‘doce e amável’.
(Anna Marina, jornal “Estado de Minas”)
41. Frango da roça com o quiabo, que pede o socorro do angu para dar consistência à goma deixada pelo quiabo.
(JK, no restaurante do Antenor)
42. O feijão tropeiro vai no embornal, não se sabe quando e onde o viajante poderá parar para matar a fome. O feijão já cozido com farinha de mandioca esperando a adesão do torresmo.
(?)
43. Quem não goste do paio ou do rabinho de porco deve assumir a dignidade de recusar a feijoada, que só é monumental quando vira festa de tudo.
(Fábio Fortuna)
44. Que se cuide bem da escolha de um componente fundamental, a couve tronchuda.
(Paulo Pinheiro Chagas)
45. Feijoada: peso, glória e opróbio.
(Guimarães Rosa)
46. Receita mais saborosa é sentar-se a uma mesa mineira e ir provando, devagarinho, os pratos típicos do País das Gerais.
(Roberto Drummond)
47. O feijão presente no abará, avô do tutu à mineira, temperado com pimenta em folha de bananeira.
(Waldemar de Almeida Barbosa, em “Negros e Quilombos em Minas Gerais”)
48. Nesta parte de Minas não ficou herança preta mais preciosa do que a amplitude do feijão preto.
(Menturino Paula (Baiano), em “Minas Culinária”)
49. A cabidela de galinha para depois das procissões de Nossa Senhora nas noites de seu mês de maio.
(Pedro Nava)
50. A feijoada, prato alto como as sinfonias, como o verso alexandrino, prato glorioso do milagre da unidade nacional.
(Idem)
51. Obra prima da simplicidade, o nômade feijão tropeiro.
(Idem)
52. Galinha desfigura-se num caldo dum marrom suntuoso. Tão grosso, tão macio, tão escorregadio, tão fácil, como se cada um fosse recheando a boca, mastigando, engolindo veludo em estado pastoso.
(Pedro Nava, sobre frango ao molho pardo em casa de Guady Jorge)
53. Os escravos podiam viver malvestidos e mal alimentados, porém jamais passar sem uma dose diária de aguardente e um naco de fumo.
(Mafalda Zemella, em “Abastecimento da Capitania das Minas Gerais no século 18”)
54. O feijão, comia-se com um ovo frito, a linguiça frita, o lombo frito e o torresmo totêmico. Repetia-se antes de acabar. Parece Fuga de Bach. É de chorar. O nômade feijão do tropeiro das Minas rivaliza com o floreado gótico de sedentária feijoada.
(Pedro Nava)
55. Se o leitor conhece casamento mais feliz me conte, por favor: linguiça da grossura de um dedo médio frita e pão francês quentinho da padaria.
(Eduardo Almeida Reis, em “Dicionário Amalucado”)
56. Isso de feijoada completa com arroz ou laranja é heresia: o primeiro abranda e o segundo corta o gosto. O gosto deve ser conservado dentro da exuberância e do exagero de sua natureza barroca.
(Pedro Nava, em “Chão de Ferro”)
57. Filosófica, a feijoada completa pelo luto de sua cor, e pelos restos mortais que são seus ingredientes, é também memento. Depois dela, como depois da orgia, a carne é triste.
(Idem)
58. Feijoada, para ser completa, deve ter ambulância na porta e termômetro marcando 40 graus.
(Sérgio Porto)
59. O fogão, a pedra de quentar fogo, a trempe de sabão, tudo queimando lenha, entra ano sai ano. O telhado, de uma grossa camada de negro picumã, de que não escapa o longo varal de bambu, sempre repleto de deliciosas linguiças e apetitosos lanhos de toucinho.
(Alberto Furtado Portugal, em “Contos da Mata Mineira”)
60. Leitinho à toa, dava ao dono ares de sitiante. Uma pequena roça de milho, duas quartas de feijão, um porco engordando no fundo da horta. Pra que mais?
(Olavo Romano, em “Casos de Minas”)
61. Com milho cria galinha, com milho engorda cevado/, com milho alegra a cozinha e faz um prato adequado.
(Wilson de Lima Bastos, em “Na Sombra da Aroeira”)
62. Lobrobô com costela de porco e ora-pro-nobis. Angu sem sal para ensopados temperados com alho.
(Maria do Perpétuo Socorro Neves, em “Manifestações folclóricas na Zona da Mata”)
63. Dispensava-se, tanto quanto possível, o sal, produto chiquíssimo e raríssimo em todo o período colonial. O problema de abastecimento de sal foi dos mais graves do Brasil.
(Mafalda Zemella, em “O abastecimento da Capitania de Minas Gerais no século 18”)
64. A farinha come-se com qualquer fritura, ou assado, ou com qualquer caldo. No café, como agrossante, com ovo mexido em forma de farofa.
(Edilberto Trigueiros, em “Nas carrancas do Rio São Francisco”)
65. O mineiro não é homem de bons pratos ou de bons vinhos. A mesa é sempre um acessório em Minas. Só para os hóspedes é que a enchem de iguarias.
(Alceu de Amoroso Lima, em “Voz de Minas”)
66. Ao chegar ao morro, à várzea e à fazenda do juiz de fora (velhos conhecidos e pouso habitual de tropeiros) obteve um pouco de milho e arroz, o que, juntamente com papagaios e tucanos, caçados à beira da estrada, melhoraram o seu cardápio habitual.
(Em Eduardo Frieiro, obra citada, sobre a passagem do mineralogista Alexandre Caldeleugh, 1821, pela região de Juiz de Fora)
67. A chave mestra da cozinha de Antônio Dornas Vieira: a rude munheca de samambaia. Quando chove, no verão, as samambaias do mato soltam os brotos. Ou carne moída com ora-pro-nobis.
(Richard Burton, em “Viagens ao Planalto do Brasil!”, 1868, em Diamantina)
68. Os habitantes de Minas comem enormemente.
(Saint Hilaire, em “Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais”)
69. Aquele feijão de tropeiro, aquela farofa de ovo, o torresmo, a cebola frita com alho, a salsa e a pimenta tinham emprestado um sabor olímpico; aquele arroz cozido na panela de pedra; aquela couve tronchuda; aquele angu temperado com pouco sal; aquele lombo de porco conservado na banha que enchia antigas latas de querosene; aquela linguiça de tripa fina; aquele frango ‘caipira’ de carne tenra, alimentado a angu e couve e ciscando solto na horta. E tudo isso feito em fogão de lenha.
(Paulo Pinheiro Chagas, em “Esse Velho Vento da Aventura!”, jantar em sua homenagem, eleito deputado em 1951, em Mandacaia.)
*Wilson Cid é jornalista e escritor