Tão esperado acordo vira realidade - créditos: divulgação
16-12-2025 11h40
Direto da Redação
Bruxelas — A aguardada ratificação do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, bloco formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, domina os debates políticos em Bruxelas nesta semana. Negociado ao longo de cerca de 25 anos, o tratado foi concluído em dezembro de 2024 e é considerado o maior pacto comercial já firmado pela UE, com potencial para criar uma ampla zona de livre comércio entre dois grandes polos econômicos que, juntos, somam mais de 780 milhões de pessoas e trilhões de dólares em Produto Interno Bruto.
Apesar do avanço nas negociações e da expectativa da Dinamarca — que ocupa atualmente a presidência rotativa do Conselho da União Europeia — de que a votação para aprovação ocorra ainda nesta semana, o processo enfrenta forte resistência interna. A França solicitou oficialmente o adiamento do voto, alegando que as salvaguardas previstas no texto não oferecem proteção suficiente a setores sensíveis da economia europeia. O governo francês, chefiado pelo primeiro-ministro Sébastien Lecornu, sustenta que agricultores do país seriam expostos a uma concorrência considerada desleal, especialmente de produtos sul-americanos como carne bovina e frango a preços mais baixos, o que poderia provocar impactos significativos sobre o setor agrícola nacional.
Fontes diplomáticas indicam que a Itália pode se somar à posição francesa, formando uma aliança capaz de reunir maioria suficiente para forçar o adiamento da votação no Conselho da UE. Diante desse cenário, a Comissão Europeia tenta evitar um retrocesso. O principal negociador do bloco, Maroš Šefčovič, advertiu que um fracasso neste momento poderia comprometer a credibilidade da política comercial europeia no cenário internacional, inclusive em negociações em andamento com parceiros como a Índia. Autoridades dinamarquesas reforçam que a intenção da presidência do Conselho é concluir o processo decisório ainda esta semana, abrindo caminho para a assinatura formal do acordo, possivelmente em 20 de dezembro, durante uma reunião de líderes em Foz do Iguaçu, no Brasil.
O acordo é visto como estratégico para ambos os lados. Para os países do Mercosul, ele prevê a ampliação do acesso ao mercado europeu, com redução de tarifas sobre produtos como carnes, soja, etanol e minerais, além de estímulos às exportações e à atração de investimentos, fatores que podem aumentar a competitividade da região no comércio global. A diminuição de barreiras comerciais também favorece setores agrícolas e industriais, especialmente em economias como a brasileira e a argentina.
Do lado europeu, o tratado oferece acesso privilegiado a um mercado de centenas de milhões de consumidores e a recursos naturais considerados estratégicos para cadeias produtivas do continente. Exportadores europeus de automóveis, máquinas, produtos químicos e vinhos tendem a se beneficiar com a expansão de sua presença na América do Sul. Além disso, o acordo é visto como uma forma de diversificar parceiros comerciais e reduzir a dependência de mercados como China e Estados Unidos, em um contexto de crescentes tensões comerciais globais.
Para responder às preocupações, sobretudo no setor agrícola europeu, o Parlamento Europeu aprovou mecanismos de salvaguarda que permitem a suspensão temporária de benefícios tarifários caso determinadas importações representem ameaça aos produtores da UE. Ainda assim, antes de entrar em vigor, o acordo precisa ser aprovado pelo Conselho da União Europeia, com o apoio de pelo menos 15 países que representem 65% da população do bloco, além de receber o aval do Parlamento Europeu. Nos países do Mercosul, o texto também deverá passar por processos de ratificação interna.
A expectativa de muitos governos europeus e sul-americanos é que o acordo comece a produzir efeitos já no próximo ano. No entanto, a resistência manifestada nos últimos dias pode atrasar a assinatura formal e empurrar sua implementação para o início de 2026, caso a votação seja novamente adiada.
*Samuel Arruda é jornalista e articulista

