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O livro é “Gaveta de Doido”

O livro é “Gaveta de Doido”

O detalhe é que o escritor Henrique German consegue escrever usando o computador com a tela escura e os caracteres brilhantes, porque ele só dispõe de 4% de sua visão comprometida

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29-09-2024 às 07h:10

Alberto Sena*

Nunca li algo parecido com o livro “Gaveta de Doido”, do escritor Henrique German, belo-horizontino, autor de mais de 20 outros de todas as áreas da literatura. Se ele já não tivesse titulado o livro, eu teria dado justamente esse título porque faz jus ao conteúdo, que, inclusive possui textos com passagens em hospício, com o caso de um doido que via borboletas sobrevoando a cabeça das pessoas. O que não deixava de ser uma doideira interessante, ver borboletas. Mas ele, Leo chamado, podia ir de um extremo ao outro em suas ações destemperadas.

Se se pudesse torcer o livro com as duas mãos, o que escorreria seria o resultado de todos os sentimentos e emoções primárias do ser humano, condensadas em um volume de 414 páginas, tudo contado da melhor maneira, naturalmente, como se estivesse penetrando a alma humana despudoradamente.

É de admirar a facilidade como o Henrique escreve. Ele possui enorme capacidade de penetrar os temas neste primoroso livro e de transmitir as chamadas emoções primárias do ser humano. O livro possui cenas fortes, comparáveis aos casos de polícia vividos por mim durante o tempo em que fiz a cobertura do setor de polícia para o jornal.

Há nesse livro contos que levam o leitor a indagar a si mesmo onde é que ele buscou esses textos senão na experiência dele como promotor de Justiça. Hoje, ele é aposentado por invalidez devido ao fato de ter, se muito, só 4% da visão. Foi então que o canal da literatura “destampou”, como gosta de dizer, e ele passou a escrever primorosamente.

O detalhe é que o Henrique consegue escrever usando o computador com a tela escura e os caracteres brilhantes. Assim, ele enxerga dentro do seu limite de 4%. A produção literária dele é grande e de clareza incompatível com a cegueira que toma conta dos seus olhos devido a uma doença ocular.

Evidentemente, poderia destacar, aqui, vários contos, mas prefiro um deles intitulado “A Vingança”, que conta a história de duas famílias inimigas politicamente e uma teria sacaneado a outra. Vai daí que o filho mais velho que explorou a outra foi assinado com um tiro e essa família achou que fosse uma vingança.

Então, o irmão do morto saiu logo com a ideia de que a tal família estava partindo para exterminar a sua e antes que isso acontecesse, melhor seria acabar com eles duma vez. Ele então arquitetou a morte de todos e conseguiu.

Só que, diante, um camarada que já estava no leito de morte pediu para chamar um padre porque ele precisava confessar algo. E então o moribundo contou ao padre que estava no mato caçando e ao deparar com uma caça, ele deu um tiro, mas errou e acertou numa pessoa que ele nem sabia quem era e que ia passando na hora.

Era o filho da família que explorou a outra.

*Henrique German além de grande escritor, ex-promotor de justiça, é uma pessoa que parece estar zen o tempo todo. É cordial e está o tempo todo alegre. Conversar com ele é um prazer porque as conversas são inteligentes e bem embasadas. Ele demonstra ter grande experiência de vida, certamente adquirida em sua vivência de promotor de justiça. É autor dos romances “Os Lindeiros” e “A Casa Wojek”; “Antônia”, uma novela; de poemas “Livre” e “Avulsos”; da obra dramatúrgica “Opusculo”, teatral; das coletâneas de contos “Maravento”, “O último inverno de Arami Abdoush” e “Questão de fé”; “Arquipélago” e mais: “Pipa, um cara especial”; Lucrécia”; “Rebeca”; “Zequinha”; “Draguinha”; “Ratazan e o sorriso escondido”; “Pio, uma minibiografia católica”; “O girassol triste”; “O tubarão do Tietê”; e “Marta e a rainha”. Essas obras foram editadas entre 2020 e 2024, pela editora Literatíssima, de BH. Ele tem também um livro de memória pela Editora Ideia. German é colaborador do Diário de Minas.

*Editor Geral do DM

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