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O olhar de uma mineira na Lituânia

O olhar de uma mineira na Lituânia

Em comparação, infelizmente, Belo Horizonte, a capital de Minas Gerais, não oferece a mesma qualidade nos sistemas de educação, transporte público ou segurança.

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25-09-2024 às 07h:33

Francesca Ferraz*

Os países que integraram a União Soviética tiveram sua soberania frequentemente ameaçada pela Rússia, e com a Lituânia não foi diferente. Em 1991, o governo brasileiro reconheceu oficialmente a independência da Lituânia, restabelecendo as relações diplomáticas que datam de 1921. Essa conexão se estende a diversas áreas, e tive a sorte de vivenciar essa parceria no âmbito acadêmico, por meio da colaboração entre a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Mykolas Romeris University, onde estudei temas de “cybersegurança”, direito digital, investigação e a língua lituana durante 10 meses.

Ao longo dessa jornada, observei de perto que, apesar do passado autoritário e da independência relativamente recente, os lituanos se destacam pela sua resistência, organização e eficiência. Isso é particularmente evidente no campo da educação, onde a maioria da população domina não só o lituano, mas também o inglês, além de demonstrar alto nível de qualificação. No que diz respeito ao transporte, embora Vilnius, a capital, não tenha metrô, o sistema de ônibus é eficiente e acessível. Como estudante, paguei a surpreendente quantia de apenas 0,16 centavos de euro por dia. Além disso, a limpeza das ruas e organização com a coleta seletiva de lixo são surpreendentes. Contudo, o mais impressionante para mim foi a segurança: é comum ver crianças andando sozinhas pelas ruas ou pegando ônibus sem a supervisão de adultos, e o índice de violência é tão baixo que é possível caminhar à noite com o celular nas mãos sem preocupações.

Em comparação, infelizmente, Belo Horizonte, a capital de Minas Gerais, não oferece a mesma qualidade nos sistemas de educação, transporte público ou segurança. Embora seja injusto comparar diretamente, dado que Belo Horizonte tem uma população equivalente à de toda a Lituânia. Essa experiência me fez enxergar com mais clareza as melhorias que poderíamos alcançar por meio de uma administração verdadeiramente comprometida em priorizar serviços básicos que atendam a toda a população, e não apenas a alguns poucos, o evento da “Stock Car” que o diga.

Durante os 11 meses em que estive em intercâmbio, tive a oportunidade de observar e comparar as culturas. Enquanto os mineiros são falantes, sorridentes e acolhedores, os lituanos tendem a ser mais reservados e menos expressivos à primeira vista, podendo parecer individualistas. No entanto, considerando o rigoroso inverno e as décadas de repressão sob o regime autoritário russo, é compreensível que tenham desenvolvido uma postura mais introspectiva. Ainda assim, essa impressão inicial logo se desfaz quando se forma uma amizade: os lituanos são genuínos, prestativos e fiéis em seus relacionamentos.

No esporte, enquanto em Minas Gerais o futebol domina, com a acirrada rivalidade entre Cruzeiro e Atlético, na Lituânia, o basquete é o grande protagonista, com a feroz disputa entre Žalgiris Kaunas e Rytas Vilnius. Já na culinária, os lituanos apreciam pratos à base de batata, creme de leite (sour cream), carne de porco e pepinos. Diria que é uma comida equilibrada, com uma boa combinação de saladas e proteínas. As sobremesas, por outro lado, são menos doces em comparação com as brasileiras.

Toda essa experiência foi única e repleta de descobertas. Entre as memórias mais especiais, destacam-se três: primeiro, a oportunidade profissional de fazer um “traineeship” na área de Proteção de Dados no escritório Ellex, considerado o melhor escritório dos Bálticos, graças ao apoio do cônsul honorário do Brasil na Lituânia, Jaunius Gumbis. Segundo, a convivência com uma família lituana extremamente acolhedora, que me ajudou e me ensinou muito sobre a cultura local. E, por fim, ser contemplada com uma bolsa de estudos para aprender a língua lituana, oferecida pela Mykolas Romeris University. São experiências que guardarei com carinho e que sempre lembrarão o quanto a Lituânia transformou essa mineira.

*Acadêmica de Direito na FDUFMG e integrante do Grupo de Estudos Estratégicos Raul Soares.

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