
Anúncio da boa nova - créditos: divulgação
04-08-2025 às 08h48
Raphael Rodrigues (*)
Há quem diga que ainda virá ao mundo o Salvador para pôr ordem no caos, corrigir as injustiças, silenciar os corruptos, iluminar os ignorantes. O verdadeiro Messias, e então, finalmente, todos entenderiam a mensagem.
Há também quem afirme que Jesus já morreu por nossos pecados e que, por isso, estamos perdoados, salvos e redimidos. Enquanto isso, seguimos nos tornando, dia após dia, mais egoístas, gananciosos e indiferentes ao sofrimento alheio. Essa ideia de uma salvação automática, cômoda, parece ter se tornado uma desculpa para a inércia moral.
A história está marcada por figuras que transformaram os rumos do pensamento e da espiritualidade: Jesus, Buda, Maomé, Moisés, Gandhi, Sócrates, entre tantos outros. Alguns com dimensões divinas, outros com a coragem de desafiar os poderes de seu tempo. Todos, à sua maneira, provocaram profundas reflexões na humanidade. Mas, passado o impacto inicial, a história segue seu velho curso: guerras, ganância, intolerância, miséria — e a velha esperança de que alguém venha punir os injustos, diga-se de passagem, os injustos quase nunca somos nós.
Nietzsche, com seu sarcasmo profético, nos apresenta o louco com a lanterna, que entra em plena feira ao meio-dia gritando: “Procuro Deus!”. As pessoas riem e zombam, e ele responde: “Deus está morto! E fomos nós que o matamos!”. Não era um anúncio de ateísmo, mas uma denúncia: matamos a referência que nos obrigava a viver com propósito, com justiça e compaixão. E agora, vagamos no vazio — esperando por um novo herói que venha nos salvar de nós mesmos.
Mas… e se ninguém mais vier? E se o próximo escolhido a resolver os problemas do mundo tiver de ser você? Se não houver outro Cristo a ser enviado, outro profeta a surgir, outro Buda a despertar, o que nos resta é encarar aquilo que sempre evitamos: a responsabilidade por nossas escolhas, nossos erros e nossos silêncios.
Talvez o mundo não precise de mais um Messias, mas de pessoas comuns que ajam como se tivessem realmente compreendido a mensagem do primeiro. Gente que seja paciente com os que ainda propagam a calúnia e a injustiça, enquanto promovem a própria mudança, mesmo diante de tanta adversidade. Que tenha coragem para dizer, de forma firme e respeitosa, que a intolerância e a arrogância individual são as grandes causas dos males do mundo. Gente que ame, mesmo sem reciprocidade. Que olhe para si mesma e diga: a salvação do mundo começa em mim.
Porque as grandes tribulações pelas quais a humanidade passa não são obras de um monstro apocalíptico, mas sim o resultado de inúmeras pequenas ações egoístas, praticadas — dia após dia — por cada um de nós.
*Raphael Rodrigues é filósofo, terapeuta e graduando em Psicologia.