
Saúde Mental comunitária - créditos: Marcos de Noronha
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10-06-2025 às 08h38
Por Marcos de Noronha
Este ano, em setembro teremos no momento mais expressivo de encontro internacional. Será em Tóquio o Congresso Mundial de Psiquiatria Cultural. Mas afinal, como surgiu no Brasil, a organização desta corrente de interessados nos aspectos socioculturais das doenças mentais?

Quando retornei da França, trouxe comigo o propósito de difundir os estudos sobre Etnopsiquiatria no Brasil. Como estratégia, apresentei artigos em periódicos científicos relevantes, como a Revista da Associação Brasileira de Psiquiatria e o Jornal Brasileiro de Psiquiatria. Também participei ativamente dos Congressos Brasileiros de Psiquiatria, divulgando o tema e compartilhando minhas experiências nos serviços de Etnopsiquiatria em Nice e de Psiquiatria Democrática na Itália. Meus estudos de revisão e ensaios teóricos foram publicados, permitindo-me conectar com colegas interessados no assunto. Nos congressos, trocávamos experiências e planejávamos espaços mais adequados para discutir a Etnopsiquiatria.
Meu primeiro artigo recebeu o nome de Hospitalismo – Sintoma da Doença Institucional: Contribuições Etnopsiquiátricas, foi publicado em 1986 na Revista da Associação Brasileira de Psiquiatria – Associação Psiquiátrica da América Latina. No mesmo ano, apresentei esse tema em uma mesa-redonda no IX Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em Curitiba, onde comecei a identificar diversos profissionais interessados na área. Meu objetivo era não apenas trocar ideias com esses colegas, mas também organizar, por meio de uma associação, a disseminação da Etnopsiquiatria em futuros eventos.
Ainda em 1986, no 11º Congresso Mundial de Psiquiatria Social, no Rio de Janeiro, busquei mais interessados, embora o número de participantes engajados fosse limitado. Em 1987, acompanhei Antonio Slavich, da Psiquiatria Democrática Italiana, a um congresso internacional no Rio, seguido de uma viagem a Fortaleza para o Congresso Brasileiro de Neurologia, Psiquiatria e Higiene Mental, que, na época, alternava com os Congressos Brasileiros de Psiquiatria. Posteriormente, optou-se por manter apenas o nome do segundo para os eventos anuais da classe. Em Fortaleza, conheci figuras como Adalberto Barreto e Antonio Mourão, que já praticavam a Etnopsiquiatria, estabelecendo com eles uma relação duradoura de amizade e colaboração. Em quase todos os congressos brasileiros, participei dissertando sobre temas ligados à Etnopsiquiatria ou abordando a reforma da assistência psiquiátrica no país.
Em Maceió, durante um Congresso Brasileiro, integrei uma mesa-redonda ao lado de um psiquiatra de cerca de 70 anos. Ao final da exposição, fiquei admirado com a experiência do colega, sem saber que estava ao lado de uma figura importante da psiquiatria brasileira: Rubim de Pinho. Nascido em Manaus, mas baiano desde a adolescência, ele publicou obras no Brasil e no exterior sobre Psiquiatria Transcultural, estudando predecessores como Nina Rodrigues. Rubim compartilhou que conheceu o fotógrafo e etnólogo francês Pierre Verger, em Salvador. Eu também tive esse privilégio. Durante um congresso em Nice sobre a festa e comunicação, na época em que fazia pós-graduação no Centro Hospitalar e Universitário de Nice, Verger já era uma figura respeitada. Ele me contou, com entusiasmo, sobre sua adoção da Bahia como lar, sem intenção de partir, e como era fascinado pela cultura brasileira.
Foi apenas durante o 9º Congresso Mundial de Psiquiatria, em junho de 1993, no Rio de Janeiro, que iniciamos a fundação da Associação Brasileira de Etnopsiquiatria. Inspirei-me na Psychiatria Sans Frontières, uma associação francesa, como modelo, onde havia remanescentes da Etnopsiquiatria de Henri Collomb. Nesse congresso, estabeleci os primeiros contatos com a Seção de Psiquiatria Transcultural da Associação Mundial de Psiquiatria, então liderada pelo psiquiatra Wen-Shing Tseng, do Havaí, que me apresentou ao austríaco Wolfgang Jilek, cotado para ser o futuro chairman. Na mesma ocasião, a Associação Mundial de Psiquiatria passou a ser presidida pelo brasileiro Jorge Alberto Costa e Silva, uma oportunidade de apoio que não podia ser desperdiçada. Estavam presentes colegas da Seção residentes na América do Sul, como Alberto Perales, do Peru, e Mario Hollweg, da Bolívia, que mais tarde se tornaram grandes amigos e incentivadores. Em reunião, decidimos que Adalberto Barreto seria o presidente da nossa associação, contudo, após algum tempo sem progresso, retomei os trabalhos. Embora o professor Adalberto fosse um grande influenciador com suas ideias, eu detinha, na época, a dinamicidade para organizar e dar o ponta pé inicial da nossa proposta. O objetivo da nova entidade seria congregar profissionais de diversas disciplinas com interesses comuns em Etnologia, Psiquiatria e Sociologia, desenvolvendo estudos e pesquisas que trouxessem benefícios as práticas psicoterápicas e à sociedade. A sede e a coordenação provisória da associação ficaram comigo em Florianópolis, enquanto Adalberto iniciou a criação de outra associação para divulgar seu trabalho em Terapia Comunitária. Com a ajuda de poucos colegas, busquei recursos e ofereci as instalações do meu consultório para organizar e manter a Associação Brasileira de Etnopsiquiatria (ABE). Mais tarde, comecei a editar um informativo que, além de trazer notícias sobre o tema no Brasil, reproduzia comunicações importantes da Seção de Psiquiatria Transcultural e de eventos que abordavam a interseção entre psicologia e etnologia.
Com orientação de Rogério Aguiar, então presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), optamos por criar uma associação independente, capaz de reunir profissionais de diversas áreas, não necessariamente médicos psiquiatras, em vez de ser um departamento da ABP, cujo regulamento na época não permitia ampliar para não médicos, a participação. Em agosto de 1996, o informativo nº 4 da Associação Brasileira de Etnopsiquiatria divulgou sua primeira proposta de regulamento, registrada em cartório na Comarca de Florianópolis, em julho de 1997. Decidiu-se pela elaboração de um Estatuto Social mais completo e pela nomeação de uma diretoria para colaborar com a Presidência provisória até a realização do “I Congresso Brasileiro de Etnopsiquiatria”, previsto para outubro de 1998, em Florianópolis.
Em março de 1998, as diretorias da Associação Brasileira de Etnopsiquiatria e da Associação Brasileira de Psiquiatria Social reuniram-se para concretizar um processo de fusão. Foram eleitos como membros honorários da nova entidade o professor Maurício Knobel, então presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria Social, e o professor Jorge Alberto Costa e Silva, homenageado com esse título desde nossa ata de fundação, devido ao eminente cargo de presidente da Associação Mundial de Psiquiatria.
Nos congressos mundiais de psiquiatria em que participei, defendi a realização conjunta do nosso primeiro congresso brasileiro com o congresso mundial de psiquiatria cultural. Durante um Congresso Mundial de Psiquiatria em Madri, decidiu-se pela possibilidade de realizar um evento na América do Sul, com propostas a serem defendidas em uma nova reunião na Itália. Os representantes do Peru, da Bolívia e do Brasil uniram-se para apresentar uma proposta única, e Florianópolis foi escolhida como sede. A Associação Brasileira de Etnopsiquiatria (ABE) deveria contar com o apoio da Universidade Federal local, por meio do Departamento de Antropologia, para sede do evento, requisição de recursos ao CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa) e divulgação junto a outras universidades. Contudo, dos três itens, pudemos contar apenas com a sede da Universidade, mas nenhum recurso foi direcionada a esta tarefa. Sem a verba esperada, eu e a equipe contratada fizemos um grande esforço para honrar o compromisso. O chairman Wolfgang Jilek, que antecipou sua vinda ao Brasil para colaborar conosco, escreveu posteriormente que, diante das dificuldades, realizamos o congresso “na raça”. Foi gratificante contar com a colaboração de cerca de 26 professores estrangeiros e diversos nacionais, além de um vasto programa e da inauguração da nossa primeira assembleia no “Congresso Brasileiro de Etnopsiquiatria e Psiquiatria Social e Simpósio Internacional de Psiquiatria Cultural”, em novembro de 1998.
Após esse evento, ocorreram vários simpósios regionais, como os organizados por Gilberto Franco em São Paulo, Geraldo Sales de Tucuruí, que com a ajuda de Rosano Barata fizeram o primeiro congresso internacional do Amapá em Macapá, na Amazônia. Augusto César de Farias em Brasília realizou alguns encontros em sua cidade, e, Augusto Costa Conceição, na Bahia em Salvador. O professor Paulo Dalgalarrondo em Campinas, foi entusiasta da união das suas associações, a etnopsiquiátrica e social, mas preferiu investir no tema Religião e Saúde. Em Fortaleza, o psiquiatra italiano, Rino Bonvini, um grande realizador das Terapias Comunitárias, realizou também um simpósio, congregando-nos na aldeia dos Pitaguary, próximo de Fortaleza. A presidência da associação passou pelo Nordeste, com nosso mentor Adalberto Barreto, pelo Norte com Geraldo Sales, pelo Centro-Oeste com Augusto César e voltou ao Sul comigo, onde permanece até hoje. Os grandes simpósios foram realizados em Florianópolis, Fortaleza e Macapá. Seguindo uma tendência mundial, com a fundação da Associação Mundial de Psiquiatria Cultural, alteramos nosso nome fantasia para Associação Brasileira de Psiquiatria Cultural, mantendo, porém, a sigla histórica ABE.
Estão abertas as inscrições para o seminário em comemoração aos 30 anos de Experiência da Saúde Mental Comunitária

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Vamos reunir os maiores nomes do Brasil em práticas integrativas:
• Adalberto Barreto (criador da Terapia Comunitária Integrativa)
• Pe. Rino Bonvini (criador da Abordagem Sistêmica Comunitária)
• Marcos de Noronha (criador da Terapia Social)
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