E não corro não é devido a nenhum impedimento espiritual, mental ou físico. Não corro porque já faz algum tempo cheguei à conclusão de que viver é andar.
25-12-2024 às 10h15
Bento Batista*
Já corri demais durante as sete décadas e meia vividas.
Quando criança, era espoleta; corria o tempo todo para gastar energia, em vez de caminhar.
Subia em muro. Não tinha medo do escuro. Corria. Jogava futebol, do nascer ao pôr do sol.
Vivendo em Belo Horizonte, corria. Como corria! No jornal onde trabalhava tudo tinha hora. Era eu escravo do fluxo. Corria.
Corria para pegar o ônibus. Corria para se safar do ônibus. Corria para pegar o trem.
Era uma correria. Vivia correndo. E corria para viver.
Agora, não corro mais – embora ainda corra porque necessário é, às vezes. Mas, a rigor, ando. Simplesmente, ando.
Subo e desço escadas para exercitar os músculos das pernas. Mas, correr, não corro mais.
E não corro não é devido a nenhum impedimento espiritual, mental ou físico. Não corro porque já faz algum tempo cheguei à conclusão de que viver é andar.
Enquanto a gente anda, em silêncio, a gente pensa, reflete, medita, porque o ato de caminhar mexe com o espírito, remexe a mente, a memória e põe todos os órgãos do corpo para funcionar.
Por isso não corro mais. Ando. Ando porque assim concluo, os seres chamados humanos não foram feitos para correr. Foram feitos para viver.
E andar, como disse, é viver. Por isso ando. E quando ando reparo nas coisas ao redor. É a arquitetura da casa antiga. A beleza da árvore amiga, que me dá sombra, flores e frutos.
Quando ando – e como eu ando! – observo tudo que se passa. A cabeça parece forno de assar ideias. Depois, é só passar tudo para o computador. Está pronto e acabado.
Dá-se, então, um parto natural, normal. Sem dor. Sem sequer a necessidade de uma cesariana. Ou o terrível fórceps!